Descrição de chapéu Causas do Ano

'Tem gente que nem lembra mais o que é um brócolis', diz empreendedor social sobre fome nas periferias

Em live, Aline Oliveira, Aziz Camali e Sergio Suchodolski discutiram insegurança alimentar nas cidades e soluções que conciliem ONGs e setores público e privado

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São Paulo

Visível nas ruas das metrópoles brasileiras, a fome atinge cerca de 27 milhões de pessoas que habitam áreas urbanas do país e é mais recorrente nas periferias, entre pessoas negras, entre mulheres e em residências com crianças de até 10 anos.

A insegurança alimentar nas cidades e alguns dos caminhos para sua superação foram tema de um bate-papo ao vivo na TV Folha nesta quarta-feira (29), transmitido pelo YouTube.

O Papo de Responsa discutiu o desperdício de alimentos, a inflação e seu efeito nas mudanças de hábitos dos brasileiros, além de ações do terceiro setor e parcerias público-privadas. O debate foi promovido pelo projeto "Fome de quê? Soluções que inspiram", a atual Causa do Ano da Folha Social+.

A iniciativa, que traz a temática da insegurança alimentar para todas as plataformas do jornal, conta com o apoio da VR e da Rede Folha de Empreendedores Socioambientais.

"O tema da fome é chave para quem trabalha com desenvolvimento", afirmou Sergio Gusmão Suchodolski, sócio e vice-presidente da VR Investimentos e ex-presidente da Associação Brasileira de Desenvolvimento.

"A gente precisa entender o contexto global de retorno da insegurança alimentar, sobretudo nos países de renda média, que é o caso do Brasil, onde a inflação de alimentos ultrapassa a casa dos 10% e gera esse paradoxo: um país que produz muito alimento, mas no qual o alimento nutritivo não chega na ponta."

Suchodolski apresentou dados que apontam para mudanças nos hábitos alimentares dos brasileiros a partir da análise de como usam seus cartões de alimentação e de refeição. Entre 2019 e 2022, o consumo de salgados ultraprocessados subiu de 11% para 15% do total gasto, enquanto a participação de refeições encolheu de 7% para 4%.

Ao mesmo tempo, o preço de uma refeição completa aumentou 21% neste período enquanto o valor do salgado teve alta de apenas 10%.

Vestido com uma camiseta que trazia a frase que virou símbolo da campanha criada pelo sociólogo Betinho e sua Ação Cidadania —"Quem tem fome, tem pressa"—, o empreendedor social Aziz Camali Constantino, criador da ONG Orgânico Solidário, falou sobre seu projeto de entregar alimentos saudáveis em periferias e outros territórios de vulnerabilidade que chamou de "desertos alimentares".

"O Orgânico Solidário enxerga comida de qualidade como um direito. E trabalhamos para dar vazão de alimentos frescos, orgânicos, de qualidade, para comunidades periféricas que não têm acesso a eles", explica. "Ali, tem gente que nem lembra mais o que é um brócolis", ilustrou ele, que foi um dos vencedores do prêmio Pacto Contra a Fome 2023.

Para Cameli, existe uma lacuna de políticas públicas de combate à fome no país hoje. "Municípios e secretarias deveriam olhar para a abundância de startups do terceiro setor e plugar essas soluções, em vez de começar algo do zero. Esse não é um campo para competir, mas para coexistir", afirmou.

A nutricionista Aline Oliveira, coordenadora do programa Mesa Brasil no Sesc Itaquera, na zona leste de São Paulo, concordou que as soluções estão postas e que políticas públicas são fundamentais na luta contra a insegurança alimentar. "A gente sabe que essa fome tem endereço, tem cor e tem gênero. E as soluções estão nas comunidades."

Criado há quase 30 anos, o programa coleta alimentos fora de padrão comercial, mas próprios para o consumo, e os distribui para entidades que atendem pessoas em situação de vulnerabilidade social. Sua experiência lhe trouxe uma visão particular sobre a questão do desperdício.

"A gente trata hortifruti como se fosse um produto da indústria, que tem de ter a mesma cara e tamanho sempre. Se esse alimento está fora do padrão, vira resíduo", disse.

Até outubro de 2023, o programa havia arrecadado 5.083 toneladas de alimentos que seriam destinados ao lixo, mas que estavam próprios para consumo, e que foram distribuídos a cerca de 1.200 instituições sociais para complementar a alimentação de 480 mil pessoas por mês.

"A gente faz um trabalho lindo, mas que não chega a todo mundo. E os gestores públicos podem buscar nosso apoio e do setor privado para dar escala porque a política pública precisa chegar a todos", disse ela.

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