Descrição de chapéu Todo mundo lê junto

Poema de 1943 fala de amor que come tudo, das frutas até o futuro

Professor explica 'Os Três Mal-Amados', de João Cabral de Melo Neto

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São Paulo

Quando era jovem, um rapaz pernambucano chamado João Cabral de Melo Neto tinha um ídolo: o escritor mineiro Carlos Drummond de Andrade. Carlos era quase 20 anos mais velho que João, e já era respeitado pelas coisas que produzia.

Mais tarde, os dois acabaram virando amigos de correspondência e trocavam cartas —naquela época, por volta de 1940, não existiam celulares nem internet. João também virou um grande escritor, e, para mostrar o quanto gostava de Carlos, ele escreveu um poema que era como uma homenagem a “Quadrilha”, uma poesia que o amigo havia feito um tempo antes.

Para professor, o amor que Joaquim sente é "corrosivo" - Catarina Pignato

Foi assim que surgiu “Os Três Mal-Amados”, que conta a história de três homens que desabafam sobre seus amores. Eles são Raimundo, Joaquim e João (que não tem nada a ver com o João autor do poema), nomes que já apareciam no poema “Quadrilha”.

No texto de João Cabral, estes homens vão falando, um de cada vez, um pouquinho sobre como se sentem. E, na fala de Joaquim, o amor aparece como algo destruidor.

Quem explica isso é o professor, poeta e crítico literário Antonio Carlos Secchin, um dos membros da Academia Brasileira de Letras, a mais respeitada instituição que reúne escritores no Brasil. Para ele, o Joaquim do poema entende que o amor é “corrosivo” —ou seja, tem a capacidade de destruir coisas.

“O amor come tudo na vida do Joaquim”, conta Antonio Carlos. “Come os livros, as palavras que ele pensou um dia juntar para fazer um poema. É um amor triturador.”

Ninguém sabe o nome da pessoa amada por Joaquim, diz Antonio Carlos. “A poesia não é sobre o amor especificamente por alguém, mas sobre este personagem reconhecendo a força do amor em si.”

Um dos trechos mais famosos de “Os Três Mal-Amados”, escrito em 1943, aparece nesta ilustração ao lado. Vale ler o poema todo, e descobrir o que mais de Joaquim o amor acabou comendo.

Ele destrói, por exemplo, um pente, tesouras de unha e um canivete. Come as frutas que estão sobre a mesa e bebe a água dos copos. Até um pão que Joaquim esconde é devorado pelo amor.

O amor come uma cidade, os mangues, os dias do calendário, os minutos do relógio. Ele come os dias, as noites, o inverno e o verão. O amor come até o futuro!

“João Cabral é também o autor do livro de maior sucesso de toda história da poesia brasileira, que se chama ‘Morte e Vida Severina’. Esse livro tem mais de cem edições, foi para o cinema, quadrinho, teatro, TV. É o texto mais amado de toda poesia brasileira”, completa Antonio Carlos, falando sobre a importância do poeta entre os escritores brasileiros.

“‘E ‘Os Três Mal-Amados’ é um dos poemas menos conhecidos dele. Inclusive nem tem forma de poema, é todo feito de monólogos em prosa. Por isso muitos até estranham sua presença na obra do Cabral, é como um corpo estranho.”

Para quem se interessar em conhecer o poema todo, ele aparece analisado por Secchin em alguns de seus livros, entre eles “João Cabral de Ponta a Ponta” (editora CEPE, 568 páginas, R$ 60). E “Os Três Mal-Amados” também está disponível, inteirinho, em sites sobre poesia na internet.

TODO MUNDO LÊ JUNTO

Texto com este selo é indicado para ser lido por responsáveis e educadores com a criança

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