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Televisão

Tony Soprano foi pioneiro na TV ao unir luzes e trevas

Personagem iniciou dinastia de anti-heróis como Don Draper ('Mad Men') e Walter White ('Breaking Bad')

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James Gandolfini como Tony Soprano em episódio da primeira temporada de 'Família Soprano' - Divulgação

Foi Tony Soprano quem iniciou a dinastia de anti-heróis que enalteceria a dramaturgia televisiva. Era um protagonista dotado de luzes e sombras em vez de um só traço marcante que facilitasse a digestão daquilo até então chamado de "enlatado".

Quando o showrunner David Chase pariu o mafioso disposto a expor dúvidas existenciais em um consultório, ora frio ora frágil, ele inoculou na TV um tipo até então restrito a literatura, teatro e cinema.

Eram esses os palcos para personagens com entranhas e hesitações de caráter. Para a TV, sobravam pais rabugentos, amigos formosos às voltas com a idade adulta, mulheres que levavam a família nas costas, rebeldes de bom coração, malvados. Nada que convidasse a mais reflexão. Ou se era bom, ou se era mau.

"Família Soprano" mostrou que a TV permitia nuances e era possível até fazer uma série toda sobre elas. Tony era odiável e adorável. Fascinava.

A ele se seguiram Don Draper (Jon Hamm em "Mad Men", 2007-2013), Walter White (Bryan Cranston em "Breaking Bad", 2008-2013), Frank Underwood (Kevin Spacey em "House of Cards", 2013-2018). Por causa dele, da atuação comovente de James Gandolfini (1961-2013), vilões passaram a ser heróis de séries, alargando o escopo e o público para além do entretenimento ligeiro.

A novidade nesses personagens é sua capacidade verossímil de transmutação. A redenção, para eles, sempre parece possível ao longo da série; no entanto, dificilmente é alcançada —não raro, culmina na morte do protagonista, porque este é incorrigível.

Após Gandolfini, Cranston avançou ao mostrar o processo de corrupção do sujeito comum. Seu professor-traficante não era um crápula em essência, ele se tornava um no processo inverso ao do mafioso de Nova Jersey, o bandido que revelava ter coração.

Já os anti-heróis de Hamm e Spacey têm nuances complexas e luz quase ofuscante, sem parecerem dotados de emoções positivas —apenas de traumas, rancor e ambição. Nem por isso foram menos queridos do público.

A tendência não chegou às personagens femininas. Há anti-heroínas como a Wendy de "Ozark" (Laura Linney), mas ainda carecem da dimensão pop dos pares masculinos.

Embora as protagonistas mulheres que dominaram as séries nos últimos anos possam matar, fazer sexo, mentir, se drogar, elas continuam tendo apenas motivações nobres. 

June ("Handmaid's Tale"), Arya e Sansa ("Game of Thrones"), Dolores ("Westworld"), Mary ("Downton Abbey") são mais mulheres-maravilha do que humanos mesquinhos e afáveis como Tony Soprano. 

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