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No 2019 de 'Blade Runner', faltam smartphones e sobram orelhões

Dirigida por Ridley Scott em 1982, ficção científica marcou o cinema com sua visão soturna

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São Carlos (SP)

Obras de ficção científica como “Blade Runner: O Caçador de Androides”, de 1982, são uma ferramenta excelente para entender a falta quase completa de linearidade no desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Trocando em miúdos —quem acha que é possível prever com precisão o conhecimento e os aparelhos que teremos no futuro quase sempre quebra a cara.

O exemplo mais óbvio disso, aliás, fica escancarado logo nas primeiras cenas do clássico de Ridley Scott. No mundo real, ainda não temos —e provavelmente não teremos tão cedo— carros voadores, já que os perigos, o custo e a dor de cabeça logística são grandes demais. Por outro lado, não há sombra de smartphones na Los Angeles dos replicantes.

O caçador de androides vivido por Harrison Ford até consegue fazer chamadas de vídeo —só que de um orelhão. Pense em como isso soa absurdo neste novembro de 2019, mês em que o filme se passa. 

Quando a narrativa nos apresenta ao teste de Voight-Kampff, usado para separar replicantes de seres humanos, analisando as reações emocionais do sujeito a determinadas perguntas, o mais curioso, do ponto de vista do conhecimento atual, é que algo supostamente tão sofisticado precise se valer de medidas indiretas, como a dilatação dos vasos sanguíneos ou das pupilas.

Enfiar os suspeitos num aparelho de ressonância magnética e observar o funcionamento de seus cérebros conforme respondessem provavelmente seria um jeito mais fácil e preciso de revelar sua natureza. O problema é que essa tecnologia não tinha amadurecido quando o filme foi produzido, embora pesquisas a respeito já fossem feitas nos anos 1970.

Por outro lado, um elemento da narrativa bastante alinhado com as tendências atuais de várias áreas da ciência é a estranha mistura de engenharia genética e cibernética que permitiu a criação de animais androides e dos próprios replicantes. Mesmo nesse caso, porém, convém ir devagar, muito devagar, com o andor.

Sim, é verdade que as técnicas de edição do DNA estão ficando cada vez mais sofisticadas e versáteis. Mas ainda estamos longe de selecionar com precisão características complexas de um embrião humano, e produzir pessoas superfortes ou imunes à água fervente —características dos replicantes— deve continuar sendo só ficção científica por muito tempo, ou para sempre.

O motivo não é muito difícil de entender. Primeiro, ninguém sabe em quantos e quais genes é preciso mexer ao mesmo tempo para alterar traços fundamentais da biologia humana. A chance de algo dar errado é alta e, mesmo se a modificação for feita conforme o esperado, características aparentemente vantajosas muitas vezes têm efeitos inesperados.

Quanto ao desenvolvimento acelerado dos bioandroides, é difícil conceber um cérebro e um corpo humanos que sejam competentes “de fábrica”. 

A infância humana existe por um motivo: é esse processo lento de aprendizado e desenvolvimento que torna a cognição da espécie flexível o suficiente para lidar com desafios complexos. Para a sorte do Homo sapiens “versão 1.0”, sair desse script na vida real é algo que tem bases tão frágeis quanto as proverbiais lágrimas na chuva do filme.

Homem ou replicante?

Afinal, Deckard é replicante ou humano? Eis o maior mistério a rondar ‘Blade Runner’. Muitos acreditam que Ridley Scott teria colocado pistas de que Deckard não é humano.

A teoria de que o caçador de androides seria, também ele, androide ganhou força em 1992, com a ‘Versão do Diretor’, que inclui uma cena antes cortada em que Deckard imagina, ou sonha, um unicórnio correndo.

Logo depois, ele encontra o origami de um unicórnio. Isso indicaria que seus sonhos e pensamentos podem ser conhecidos

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