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SPFW termina com promessas da prefeitura e disposição de marcas para a mudança

Para garantir sua relevância, semana de moda paulistana teve de incorporar show e novos discursos

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São Paulo

Se há uma vertente da cultura que sofre primeiro os efeitos da estagnação econômica, dos humores acirrados e da desesperança estampada no noticiário, é a moda. Ela não depende do poder público para acontecer, mas é uma das primeiras a sair da lista de prioridades do consumidor preocupado com o dia seguinte. Ao mesmo tempo, seus estilistas precisam vender sonhos, mas sem ignorar o pesadelo do dia dia.

A 48ª São Paulo Fashion Week terminou na última sexta-feira (18) como esponja de todas essas questões de uma indústria que, no jargão econômico, recebe o adjetivo de híbrida. Ou seja, que precisa de criatividade e dinheiro na mesma medida para não apenas emocionar, mas também criar demanda, porque a base de sua existência não é a da arte, feita para ser apreciada e, quem sabe, vendida, mas a do produto consumido com alguma constância e escala para se manter na arara.

Essas duas funções, a de ser cultura e produto perecível, dividiu a moda nas caixas conceituais de grife autoral e grife comercial, encaixando, erroneamente, quem vende muito na categoria de "moda acéfala", e, quem não vende, no espectro de "moda artística". Todos vendem algo, mas a régua da audiência e do valor agregado de uma marca, hoje, se apoia menos nessas variantes e mais nos métodos empregados para essa venda acontecer.

Ser autêntico, abraçar a sustentabilidade, respeitar as diversidades racial e antropométrica, praticar o comércio justo e incluir discussões de gênero no repertório não são mais bandeiras, porque quem paga por uma grife, hoje, está comprando sua mística e fatos sobre ela reproduzidos nos jornais e na internet.

Na passarela, o discurso anti-violência da Cavalera, o sustentável da Ellus e o inclusivo de Isaac Silva foram exemplos dessa construção, com a diferença de que para algumas são produzidos para a foto, como sugeriu o protesto da Ellus, e outros são a espinha do trabalho da marca, como foi, e sempre foi, o de Silva.

Há exemplos mensuráveis do impacto das marcas no país. A entrada recente da joalheria Vivara na bolsa, por exemplo, superou as expectativas de um mercado que a valorou em três vezes a oferta inicial projetada por seus donos. Isso ocorreu sem base comparativa, porque não há empresas do ramo listadas na B3. Comprou-se ideias, não fatos, e ainda que o prospecto da grife apontasse lucros e margem para crescimento, os brasileiros, mais de 90% dos compradores das ações, deram um tiro no escuro apoiados na história dela.

Nesse contexto, não causa surpresa que o grupo Guararapes, da Riachuelo, tenha se apoiado na SPFW para contar ganhos de imagem. A marca principal do grupo é uma das patrocinadoras do projeto Free Free, da stylist Yasmine Sterea, que promove comunidades de artesãs pelo país e incentiva em suas roupas o uso de peças descartadas —o desfile foi feito com doações de etiquetas como Osklen, Reinaldo Lourenço e a própria Riachuelo, refeitas pelas associações integradas ao projeto social.

Percebe-se que a semana de moda ainda é um território onde marcas buscam se renovar ou comunicar mudanças. Mesmo as que não vendem roupas, como a petroquímica Braskem, que se associou a PatBo para a criação de looks feitos de resíduos de plástico, ou o banco Santander, que patrocina há três temporadas o Projeto Estufa do evento, uma série de palestras e desfiles de marcas emergentes.

A questão que se impõe, mais uma vez, é a continuidade dessas iniciativas, às vezes pontuais. Nesta edição, o prefeito Bruno Covas (PSDB), assim como já fez no passado Gilberto Kassab, Fernando Haddad e outros nomes da política, foi ao evento prometer vínculos. Lançou a marca Sampa Fashion, com o propósito de que nos próximos anos a Luminosidade, dona da SPFW, aproxime marcas de comunidades com o intuito de gerar empregos na confecção e estimular projetos profissionalizantes.

Esse tipo de encontro geralmente ocorre em períodos pré eleitorais. Alguns andam, outros não. Marta Suplicy, quando ministra da Cultura de Dilma Roussef (PT), chegou a cogitar um fundo para a moda que nunca saiu do papel.

O que sempre está ali, evidente, é a locomotiva de ideias da passarela, que nesta temporada privilegiou plissados, como os da Apartamento 03, florais (Reinaldo Lourenço), alfaiataria (João Pimenta e Gloria Coelho) e jeans como base principal dos looks urbanos (Ellus e Cavalera).

São novidades os formatos integrados, como o desfile-show-filme da Another Place ou o espetáculo visual e sonoro da Handred, que encerrou o evento com um show de Moreno Veloso expandindo, por meio da música, uma coleção de peças em linho e outros materiais naturais construídas com a cara do país.

E foi assim, conjurando imagens otimistas, marqueteiras ou não, novos formatos e discursos, que a São Paulo Fashion Week quis provar ser relevante em meio às mudanças estruturais no comportamento e no consumo. 

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