Descrição de chapéu Financial Times

Em disputa entre cinemas e streaming, presidente de cadeia de salas culpa Netflix

Executivo da Cineworld, segunda maior rede de cinemas do mundo, acusou plataforma de levar novo Scorsese a parca bilheteria

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Alice Hancock
Financial Times

O presidente-executivo da Cineworld —segunda maior rede de cinemas do mundo— acusou a Netflix de levar “O Irlandês”, de Martin Scorsese, a arrecadar bilheterias “insignificantes”, por a companhia ter lançado o filme em seu serviço de streaming depois de um período curto de exibição nas salas de cinema.

Mooky Greidinger disse que o serviço de streaming americano, que financiou o filme do cineasta premiado com o Oscar, colocou “O Irlandês” nas salas de cinema em 1º de novembro nos Estados Unidos e em 8 de novembro no Reino Unido, e lançou o filme online em 27 de novembro.

“’O Irlandês’ perdeu muita bilheteria. Um trabalho de Scorsese teria gerado boa renda nas salas de cinema”, ele declarou. As acusações de Greidinger expõem um impasse duradouro entre os proprietários de cinemas e a Netflix.

De setembro para cá, a companhia lançou dez filmes nos cinemas, mas a maioria por menos de uma semana antes de começar a veiculá-los em sua plataforma. Em novembro, a Netflix anunciou que havia adquirido o cinema Paris, em Nova York, e que estava negociando para adquirir o Egyptian, em Los Angeles, onde planeja exibir suas produções e realizar eventos especiais.

A Netflix disse que ofereceu seus filmes a todas as grandes cadeias de cinemas. Muitas delas, entre as quais a Vue, Odeon e Cineworld, se recusaram a exibir os trabalhos, considerando que a janela de exclusividade era curta demais.

Este mês, a Cineworld, sediada no Reino Unido, anunciou a aquisição da cadeia canadense de salas de exibição Cineplex, que opera 165 cinemas, por US$ 2,1 bilhões, apenas 18 meses depois de concluir uma aquisição reversa do grupo de cinemas americano Regal, por US$ 3,6 bilhões.

As transações são parte de uma consolidação mais ampla no setor de salas de cinema, à medida que grupos de streaming como a Netflix ampliam sua produção de filmes.

Jeff Bock, analista sênior de bilheteria da Exhibitor Relations, uma companhia de pesquisa de mercado, disse que os cinemas e as plataformas de streaming estavam se preparando para “uma batalha por espectadores”.

“Estamos falando de cinema versus streaming, e isso já está acontecendo neste momento. Que os serviços de streaming tenham atraído tantos talentos é uma questão importante para os cinemas”, disse Bock.

Ele acrescentou que as audiências estavam cansadas de “continuações preguiçosas”, e que, se o cinema deseja prosperar, os estúdios precisam melhorar seu jogo.

De acordo com a Motion Picture Association of America, a organização setorial dos grandes estúdios de Hollywood, a bilheteria mundial do cinema em 2018 foi de US$ 41,1 bilhões, 1% acima do resultado de 2017.

Os gastos dos consumidores com programas de TV e filmes em casa subiram em 16%, para US$ 55,7 bilhões.

Greidinger disse que “[‘ O Irlandês’] foi lançado em um número muito pequeno de salas de exibição, em todo o mundo, cinemas que não se preocupavam muito com manter a janela aberta entre o lançamento nas salas de exibição e o lançamento no mercado auxiliar, e o filme faturou nada, no final das contas. As pessoas podem vê-lo na Netflix, e é isso”.

A Netflix informa que o filme de Scorsese foi exibido em salas de cinema de 35 países, e que algumas salas haviam reservado o filme para exibição em fevereiro do ano que vem. Mais de 26 milhões de pessoas assistiram a “ O Irlandês” em sua primeira semana na plataforma da Netflix.

Executivos do setor de cinema atribuem a culpa pelas bilheterias fracas em 2019 a uma programação desigual. Enquanto filmes como “Vingadores: Ultimato” quebraram recordes de bilheteria, outros filmes sobre os quais as expectativas de bilheteria eram positivas, como “Homens de Preto: Internacional”, e “X-Men: Fênix Negra”, fracassaram.

Em seu mais recente relatório de operações, a Cineworld anunciou que as receitas para o ano de 2019 ficariam abaixo das expectativas por conta das bilheterias fracas.
 

Greidinger disse que embora as salas de cinema não tivessem controle sobre os filmes em cartaz, a Cineworld havia conduzido um programa de reformas a fim de manter o interesse dos espectadores. No primeiro semestre de 2019, a companhia investiu US$ 90 milhões em melhoras em sua tecnologia de telas, entre as quais 13 telas 4DX, que simulam aromas e efeitos do clima, e também instalou assentos vibratórios em algumas salas.

Analistas do banco Morgan Stanley disseram que a nova aquisição da Cineworld, financiada por meio de US$ 2,3 bilhões em créditos bancários, era uma “ação defensiva” que deixaria a companhia com uma dívida líquida equivalente a 3,7 vezes sua receita antes dos juros, impostos, depreciação e amortização, no final de 2021. A Cineworld planeja atingir um nível de dívida líquida inferior a três vezes suas receitas ajudadas, no mesmo prazo.

Em artigo de opinião para o jornal The New York Times, Scorsese escreveu que preferiria que seu filme tivesse mais tempo nos cinemas, mas que estes estavam ocupados demais exibindo franquias cinematográficas.

“Você talvez argumente que basta ir para casa e assistir a qualquer coisa que você deseje na Netflix, iTunes ou Hulu. Claro que sim —em toda parte menos a tela grande, que é a mídia para a qual o cineasta concebeu o seu filme”, ele escreveu. 
Tradução de Paulo Migliacci

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