No ano de Beethoven, Municipal abre temporada com obra gigante de Mahler

Compositor é um dos herdeiros do legado do autor da 'Nona Sinfonia', na passagem do alto romantismo para a era moderna

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São Paulo

Enquanto as óperas não chegam —a estreia de “Aida”, de Verdi, está agendada para o próximo dia 28— o Theatro Municipal de São Paulo abre sua temporada 2020 com um concerto sinfônico. A obra escolhida, a “Sinfonia n.3” de Mahler, dura mais de uma hora e meia e ocupa a totalidade do programa.

Gustav Mahler (1860-1911) é um dos herdeiros-transfiguradores do legado de Beethoven na passagem do alto romantismo para os tempos modernos. Sua obra tem a perplexidade filosófica evocada pelo antecessor na “Nona Sinfonia”, na qual texto poético e música pura passaram a se estimular mutuamente a partir de um registro que elevou, para sempre, o status da música instrumental.

Na “Terceira”, terminada em 1896 (a estreia se deu só em 1902), as dimensões da forma clássica se excedem, são intercaladas por textos cantados (há um extrato do “Zaratustra”, de Nietzsche), danças estilizadas e inversões no posicionamento convencional dos movimentos.

Mahler chegou a dar títulos sugestivos para as seções, mas ao publicar a partitura retirou quaisquer apelos a programas narrativos. De fato, frases genéricas como “o que me dizem as flores do campo” antes escondem do que desvelam os segredos da tramam intrincada que compôs.

Com mais de 30 minutos de duração, o primeiro movimento é uma extraordinária ampliação da forma sonata clássica usada por Mozart e Beethoven , já que as seções em que dois grupos de temas —ou “personagens sonoros”— são expostos, seguida pelo desenvolvimento ao mesmo tempo livre e rigoroso desses grupos e, enfim, sua recapitulação repleta de novas nuances são um guia para a escuta.

No meio de tanta informação, uma figura aterrorizante no trompete volta obsessivamente, um memorável solo de trombone tenta dizer o que não cabe em palavras e uma colcha de fragmentos marciais invade o território —como se proviesse diretamente de um sonho.

Dois movimentos de dança (um minueto e um scherzo) antecedem a entrada da voz feminina grave (que estará a cargo da mezzo-soprano Ana Lucia Benedetti), sobre o texto de Nietzsche, e no momento seguinte a voz se une ao coro feminino (Coral Paulistano) e Coro Infanto-Juvenil Heliópolis.

Na última seção as vozes se calam para dar espaço a um longo movimento lento. A regência estará a cargo do titular da casa, Roberto Minczuk.

A década que se encerra teve como uma de suas marcas, aqui no Brasil, justamente um aumento do interesse pelas sinfonias de Mahler, todas elas executadas pelas boas orquestras e muitas vezes escolhidas —tal como, mais uma vez, agora— para aberturas e encerramentos de temporadas.

A celebração, em 2020, dos 250 anos de nascimento de Beethoven (1770-1827) será o assunto central das séries de concertos importantes (não só no Brasil), e as duas principais orquestras paulistas programaram fazer a integral das nove sinfonias de Beethoven ao longo do ano.

Não há mal nenhum nisso, apenas a constatação de que tanto Osesp (em 2018) como Sinfônica Municipal (em 2019) praticamente acabaram de fazer (e com amplo destaque) o ciclo completo do compositor.

Posta nesse contexto, a música de Mahler pode, de fato, ajudar a revelar sentidos profundos da arte de Beethoven: ela é uma forma privilegiada de indagação sobre os seus fundamentos e limites.

Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo

  • Quando Sex. (6) e sáb. (7), às 20h
  • Onde Theatro Municipal de São Paulo, pça. Ramos de Azevedo, s/nº
  • Preço R$ 12 a R$ 40
  • Classificação Livre
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