Primeiro teatro do Brasil, Casa da Ópera de Ouro Preto completa 250 anos

Mesmo sem problemas estruturais, teatro sofre com falta de recursos

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Rafael Rocha
Belo Horizonte

Primeiro teatro do Brasil e mais antigo em funcionamento da América Latina, a Casa da Ópera de Ouro Preto atinge neste sábado (6) um feito. Inaugurada em 6 de junho de 1770, chega aos 250 anos de pé e resistindo, apesar de uma história marcada por escassez orçamentária e até ameaças de demolição.

Com capacidade para 350 pessoas, a Casa da Ópera é considerada por arquitetos e historiadores uma joia patrimonial. Foi construída pelo português João de Souza Lisboa na comemoração do aniversário do rei dom José 1º e era destinada a receber espetáculos para a elite local.

Atualmente, é um dos monumentos mais visitados de Ouro Preto, cidade considerada patrimônio cultural da humanidade pela Unesco, o braço da ONU para educação e cultura. O conjunto arquitetônico e urbanístico do município também é tombado pelo Iphan.

Doutora em história pela Universidade Sorbonne, em Paris, a pesquisadora Rosana Marreco Brescia destaca a Casa de Ópera como o teatro mais antigo ainda em funcionamento da América Latina. Teatros que o precederam acabaram sendo demolidos ou desativados.

“É uma sorte infinita ainda termos o teatro”, avalia a pesquisadora. O segundo mais antigo ainda em funcionamento na América Latina, afirma ela, é o Teatro Sollis, de Montevidéu, construído no início do século 19.

A Casa da Ópera tem formato de lira com forros e pisos todos em madeira, que lhe concede uma acústica peculiar. “Esses acabamentos da estrutura dão ao teatro uma característica de caixa que absorve e reverbera o som”, afirma a secretária de Cultura e Patrimônio de Ouro Preto, Deise Lustosa.

A estrutura do imóvel histórico não corre riscos, segundo a prefeitura. Sistemas de combate a incêndio estão atualizados, bem como telhado e sistema de energia elétrica estão com manutenção em dia, em grande parte por reformas feitas nas últimas décadas.

Mas a falta de verba específica dedicada ao teatro, administrado pela prefeitura, faz com que sua gestão seja marcada pelo improviso e por precariedades técnicas. O orçamento só dá para o básico, como bancar despesas de água, energia elétrica e pagamento dos sete funcionários.

O principal desafio é manter a sua estrutura. Os atuais equipamentos de som e iluminação são considerados defasados e devem finalmente ser substituídos nos próximos meses. Uma nova mesa de som será instalada, assim como novos refletores e uma tela de projeção. A verba veio de uma emenda parlamentar.

Também foram liberados recursos do Fundo Municipal de Cultura para a troca da cortina do teatro, de veludo alemão. A Casa da Ópera, contudo, permanece sem ar-condicionado devido à impossibilidade de instalar o equipamento nas dependências do imóvel.

Já obras como a restauração de pinturas artísticas do teatro –as originais se perderam com o tempo– ainda não têm previsão de acontecer. O trabalho é avaliado em R$ 250 mil.

Além da importância arquitetônica, o teatro também tem importância histórica. Ex-presidente do Iphan, o jornalista Angelo Oswaldo relembra da participação de inconfidentes na vida artística do teatro, como o poeta Cláudio Manoel da Costa, então secretário do governador da capitania.

“O português João de Souza Lisboa viu que havia demanda para construir um teatro em Ouro Preto. Ele então resolveu construir a ópera, que tinha assinaturas vendidas e um dos clientes era o poeta Cláudio Manoel da Costa, que também encenava suas peças no local”, diz Angelo Oswaldo.

O imperador dom Pedro 2º e o advogado e poeta Alvarenga Peixoto foram outras figuras ilustres que frequentaram o teatro. Juscelino Kubistchek organizou ali um festival de arte em 1955, ano em que foi eleito presidente da República.

Outro registro histórico importante é a ousada encenação de números teatrais com mulheres no palco, algo proibido à época, algumas delas negras. A rebeldia aparece em documentos históricos, como uma carta escrita pelo proprietário do teatro convidando um amigo para assistir “duas fêmeas que representam com todo o primor, muito melhor do que as do Rio de Janeiro”.

Devido ao distanciamento social em curso, a programação de aniversário da Casa da Ópera será virtual. A prefeitura planejava uma extensa lista de atividades durante o mês de junho, que teve de ser cancelada. Para a data não passar em branco, artistas locais irão contar histórias e ler poesias no palco do teatro com transmissão pelas redes sociais da prefeitura.

Na ocasião também será lançado um livro “A Casa da Ópera de Vila Rica/Ouro Preto”, organizado pela pesquisadora Rosana Marreco Brescia, que conta a história do teatro.

O futuro ainda é incerto na Casa da Ópera, já que a prefeitura aguarda a definição de protocolos nacionais e internacionais sobre o funcionamento de teatros. Algumas apresentações artísticas são pensadas para serem transmitidas pela internet.

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