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Estrelas se unem para tentar salvar cinemas históricos de Hollywood na pandemia

Às vésperas do Oscar, o tradicional Cinerama teve seu fechamento anunciado na Califórnia

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Los Angeles

Veículos da imprensa congestionavam na semana passada a rua em frente a um dos cinemas mais simbólicos de Los Angeles, o Cinerama Dome, reconhecido de longe pela arquitetura esférica branca de 22 metros de altura.

Mas a confusão não era para suas costumeiras estreias de tapete vermelho ou pela aguardada reabertura após um ano de fechamento devido à pandemia. Era para gravar seu obituário.

Os proprietários das redes ArcLight e Pacific Theaters anunciaram na última segunda que a sala de 800 lugares não voltará a funcionar, assim como outras 300 telas espalhadas pela Califórnia. A notícia causou comoção na comunidade de cinéfilos, que havia tomado outro susto, ano passado, quando viu o centenário Egyptian Theater mudar de mãos.

O cinema Cinerama Dome, em Los Angeles, que fechará permanentemente por causa da pandemia - Mario Tama - 13.abr.2021/AFP

A nova notícia caiu como um pisão de Godzilla na ensolarada Los Angeles, que vive momentos de relativo otimismo. Os índices de vacinação estão altos —40% das pessoas já receberam a primeira dose—, contra baixos números de infecção, cerca de 500 por dia. Chegou, ainda, às vésperas da principal festa do ano de Hollywood –o Oscar é no próximo domingo.

“Tenho tantas lembranças ótimas e orgulhosas dos cinemas ArcLight e Pacific. Mas não quero postar meus pensamentos no passado, não quero escrever um obituário. Meu primeiro pensamento é o que pode ser feito para ajudar”, escreveu o diretor e roteirista Edgar Wright, que imediatamente foi respondido por colegas.

“Precisamos fazer algo”, retrucou a atriz e diretora Olivia Wilde. “Nós devemos”, aderiu a cineasta Lulu Wang, de "A Despedida".

Há quem acredite que os donos já tenham uma cartada na mão. Tamanha é a descrença com o fechamento de uma rede tão popular que a atriz Mindy Kaling escreveu, meio brincando, que deve ser tudo mentira. “Deve ser uma estratégia para causar pesar e então eles voltam, salvam o dia e nós os amamos, esquecendo que são uma corporação."

A empresa anunciou a decisão em comunicado. “Apesar de um grande esforço que esgotou todas as possíveis opções, a empresa não tem um caminho viável a seguir.”

Fundado em 1963, o Cinerama tem uma tela curvada de 26 metros, com sistemas de exibição digital, de 35 milímetros e 70 milímetros. Foi comprado em 2002 pela rede ArcLight, que construiu um multiplex de 14 salas no mesmo quarteirão e trouxe novidades que muitos imitaram depois, como consumo de álcool e cadeira numerada. O lobby do multiplex ficava cheio nos finais de semana pré-pandemia e era comum esbarrar em celebridades.

Com uma arquitetura marcante e sala de última geração, o Cinerama, que fica no famoso Sunset Boulevard, foi palco de estreias importantes e muitas vezes usou sua cúpula externa para publicidade criativa, instalando um Homem-Aranha no topo ou orelhas verdes de Shrek. Fez também aparições em filmes, o mais recente “Era uma Vez em… Hollywood”, de Quentin Tarantino.

Tarantino, que é dono do cinema New Beverly, teve seu nome lembrado entre os que poderiam salvar o Cinerama, mas nem sua própria sala conseguiu reabrir ainda, ao contrário de outras.

O Laemmle Theatres, com oito cinemas dedicados a filmes independentes e eventuais blockbusters, reabriu no início de abril. A cidade liberou 50% de capacidade para as salas, mas as regras de distancimento reduzem o número para cerca de 25%.

“Assim fica difícil operar com lucro. Mas queremos cortar as perdas por ora, trabalhar para atrair o público de volta e mostrar aos distribuidores que há apoio para lançamentos nas salas, é viável”, diz, por telefone, o dono Greg Laemmle, que ficou chocado com o fechamento do ArcLight. “Eles eram um modelo de empresa. E as locações são incríveis, duvido que fiquem fechadas por muito tempo.”

Los Angeles vai ficar sem outro cinema lendário por mais de um ano, o Egyptian Theater, palco da primeira estreia de Hollywood, “Robin Hood”, filme de 1922 com Douglas Fairbanks.

O Egyptian foi comprado pela Netflix no ano passado por uma quantia não revelada, estimada na casa das dezenas de milhões de dólares, após passar por perrengues financeiros no comando da American Cinematheque. O serviço de streaming está reformando o espaço e espera reabrir para seu aniversário de cem anos no final de 2022.

A cinemateca é outra joia dos cinéfilos da cidade, responsável por seus melhores festivais e pela promoção de filmes internacionais e eventos com celebridades. Neste ano, entrevistou os principais indicados ao Oscar, num conteúdo gratuito que está online.

Com o novo acordo, a Cinematheque vai seguir operando a sala nos finais de semana, enquanto a Netflix a usará nos dias restantes para estreias de seus filmes e seriados.

“A manutenção é uma loucura semanal. Para um cinema histórico do tamanho do Egyptian, vem uma conta de luz altíssima. É preciso cuidar dos projetores, ligar as luzes, o ar-condicionado, mas a Netflix cuida disso agora”, diz Gwen Deglise, vice-diretora da cinemateca, uma francesa que entrou para a organização como voluntária nos anos 1990.

A Cinematheque comprou o Egyptian em 1996 por US$ 1 com a responsabilidade de reformar o lugar que ficou fechado por seis anos, o que a levou a um megaendividamento.

Funcionários disseram que, se não fosse a Netflix, a cinemateca teria falido na pandemia. Por outro lado, historiadores temem que o espaço centenário fique nas mãos de uma megacorporação e perca sua independência.

O Egyptian tem decoração externa egípcia, moda dos cinemas temáticos dos anos 1920, a exemplo do Chinese Theater, de 1927, localizado na mesma Hollywood Boulevard, a cinco minutos a pé pelas estrelas da Calçada da Fama. O Chinese reabriu há duas semanas.

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