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Cinemateca precisa contratar novo gestor com urgência, afirma criador da Spcine

'Edital é para tempos de normalidade', diz Alfredo Manevy, que lança livro sobre indústria do cinema

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São Paulo

Mente por trás da criação da Spcine, empresa ligada à Prefeitura de São Paulo que atua para a promoção do audiovisual, e ex-secretário-adjunto de Cultura da cidade, Alfredo Manevy viu as chamas que tomaram um depósito da Cinemateca Brasileira, na semana passada, com espanto e tristeza.

“Eu estou desolado até agora. Na verdade, é desolador para qualquer pessoa que tenha alguma relação com o cinema brasileiro”, diz ele, uma figura muito mais ligada à academia e à pesquisa audiovisual do que propriamente à política.

“Esse incêndio foi uma coisa muito grave, muito trágica, porque não tem reparo para o que foi perdido. Vivemos agora uma situação de excepcionalidade, estamos diante de um incêndio, precisa ser feita uma contratação imediata para que alguém administre a Cinemateca. Edital é para tempos de normalidade, nós hoje vivemos em tempos de risco de que um novo incêndio ocorra.”

Retrato de Alfredo Manevy, um dos criadores da Spcine
Retrato de Alfredo Manevy, um dos criadores da Spcine - Letícia Moreira/Folhapress

Há um ano, os funcionários da instituição foram demitidos, deixando a Cinemateca sem administradores e sem receber recursos por parte do governo federal. Depois do incêndio, o secretário especial da Cultura de Bolsonaro, Mario Frias, anunciou um edital para contratar uma entidade para gerir a Cinemateca.

Segundo Manevy, no entanto, isso leva tempo e, diante da destruição causada e da possibilidade de outras tragédias no acervo da instituição, uma medida em caráter de urgência precisaria ser tomada. Ele lembra ainda a inação de órgãos de controle que “devem assumir sua cota de responsabilidade pelo incêndio”, como o Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público Federal, e determinar que o governo libere, enfim, recursos para a manutenção da Cinemateca.

“E, olha que ironia, arquivos sobre as expedições do Marechal Rondon foram atingidos. Até a memória militar brasileira foi atingida e está sendo ameaçada”, diz ele, lembrando o passado como capitão do Exército e as alianças dentro das Forças Armadas de Jair Bolsonaro.

As reflexões sobre os rumos da Cinemateca vêm na esteira de um agregado de pensatas e entrevistas sobre passado, presente e futuro do cinema no Brasil, que Manevy lança em forma de livro nesta semana. “Depois da Última Sessão de Cinema”, que ele organizou ao lado de Fabio Maleronka Ferron, reúne 40 conversas com figuras centrais do audiovisual, de diversas áreas, idades e espectros políticos.

As chamas que consumiram o galpão da Cinemateca integram um capítulo jovem demais da história do audiovisual para já estar presente no livro. Em "Depois da Última Sessão de Cinema”, no entanto, espere ver outras discussões bastante pertinentes para os tempos atuais de pandemia e guerra entre o parque exibidor e as plataformas de streaming.

Segundo Manevy, conforme a crise do coronavírus se encaminha para um abrandamento, é preciso repensar o papel do cinema na vida das pessoas. Ele aposta que as salas precisarão ser reconhecidas não apenas como um lugar para a exibição de filmes, mas como um espaço de convivência comunitária, de troca e de socialização, coisas pelas quais as pessoas estão desesperadas em tempos de isolamento.

“As salas vão ser completamente repensadas, isso vai ser fundamental para São Paulo não deixar de ser o que ela é. Com a pandemia veio um aprendizado, de que os espaços culturais de uma cidade determinam o seu ethos, fazem com que as pessoas queiram viver nela. Precisaremos de um esforço de programadores e curadores para repensar a atratividade delas.”

E isso, ele diz, passa por diversas discussões paralelas e igualmente complexas, como a descentralização e a democratização da cultura. Para ajudar a refletir sobre essas e outras questões, surgem em “Depois da Última Sessão de Cinema” as vozes de gente como os cineastas Anna Muylaert, Laís Bodanzky, Fernando Meirelles e Kleber Mendonça Filho, dos programadores Adhemar Oliveira e André Sturm, dos políticos Fernando Haddad e Andrea Matarazzo e de pensadores como Ailton Krenak.

Seis anos distante da fundação da Spcine, eles e Manevy comemoram o que o autor vê como sucesso da empresa, que ele avalia estar hoje consolidada —prova disso é ter sobrevivido a trocas de gestões na prefeitura, inclusive entre o PT, que ocupava o poder municipal com Haddad quando o projeto nasceu, e o PSDB, hoje na figura de Ricardo Nunes.

Capa do livro "Depois da Última Sessão de Cinema", de Alfredo Manevy e Fabio Maleronka Ferron
Capa do livro "Depois da Última Sessão de Cinema", de Alfredo Manevy e Fabio Maleronka Ferron - Reprodução

“Eu me orgulho muito de haver hoje essa percepção, no campo democrático, de que a Spcine é uma entidade importante, principalmente diante do que a gente tem visto em Brasília”, diz.

“A Spcine tem o mérito de estar nesse lugar super-importante do país, que é São Paulo, mas ela propõe debates e está inserida no setor como um todo. Então existe um orgulho por ela existir, mas ela não está blindada dos problemas que vemos hoje no audiovisual. Sabemos que o simples fato de existir já é um avanço”, completa o coautor Fabio Maleronka Ferron.

Depois da Última Sessão de Cinema

  • Quando Lançamento nesta terça (3), às 19h30, em livre transmitida pelo canal da Spcine no YouTube
  • Preço R$ 60 (424 págs.)
  • Editora Autonomia Literária
  • Organização Alfredo Manevy e Fabio Maleronka
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