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Cinema

'De Volta para Casa' pensa imigração do ponto de vista asiático

Filme é mais forte quando seu foco está no desencontro entre a mãe coreana e seu filho americano

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Filipe Furtado

DE VOLTA PARA CASA

  • Classificação 12 anos
  • Elenco Justin Chon, Jackie Chung, Christina July Kim, John Lie
  • Produção EUA/Coreia do Sul, 2019
  • Direção Wayne Wang

A assimilação do imigrante é um dos temas mais recorrentes da ficção americana. No cinema, ela está no pano de fundo dos mais diversos filmes, de faroestes a dramas familiares. É, por exemplo, um dos motes centrais de “O Cantor de Jazz”, o primeiro filme sonoro.

“De Volta para Casa” pode ser visto como parte de um forte esforço recente do cinema americano para pensar a questão do ponto de vista da população asiática do país historicamente pouco servida pelo seu cinema, como visto em filmes como “Minari”, indicado ao Oscar neste ano, e “A Despedida”.

Dentro desse cenário é relevante destacar que se trata de um filme de Wayne Wang, diretor nascido em Hong Kong, mas formado nos Estados Unidos, que foi o primeiro cineasta asiático-americano a conseguir projeção no cinema local.

Seu segundo longa “Chan Is Missing” tem um lugar pioneiro essencial, é parte importante do cenário independente americano dos anos 1980 e serviu como ponto de partida para uma carreira bastante eclética, provavelmente mais lembrada por dois sucessos dos anos 1990, “O Clube da Felicidade e da Sorte” e “Cortina de Fumaça”.

Wang sempre manteve um interesse constante em ideias sobre deslocamento e pertencimento que encontram eco aqui.

O filme encontra um bom ponto de partida para tratar do tema. Temos um filho, papel de Justin Chon, escritor de algum sucesso, que retorna à casa para cuidar da mãe, vivida por Jackie Chung, que está nos últimos estágios de um câncer de estômago. A experiência de assimilação se torna esse desencontro entre o filho americano e a mãe coreana que dividem o mesmo espaço.

É um misto de intimidade do seio familiar e a distância entre o filho educado nas melhores escolas perfeitamente inserido na sociedade americana —em determinado momento, pressionado, ele admite nunca apresentar suas namoradas porque nenhuma delas é coreana— e a mãe simples e tradicional.

O filme é hábil em navegar essas tensões com a pouca paciência do filho para com a família, encontrando contraponto na dificuldade da mãe de reconhecer como ela mesma segue central para ele.

Wang adapta aqui um ensaio bastante pessoal que o escritor coreano-americano Lee Chang-Rae escreveu para a revista The New Yorker nos anos 1990, sobre a sua mãe. Lee coescreveu o filme com Wang, e algo que se destaca em “De Volta para Casa” é justamente a especificidade com que a relação é construída.

Em seus melhores momentos, o filme se beneficia dessa proximidade, sobretudo quando observa tanto os pequenos rancores como os reconhecimentos mútuos de duas pessoas que partilharam toda uma vida a despeito do seu distanciamento.

O cineasta e seu corroteirista são menos felizes quando tentam expandir a ação do filme. “De Volta para a Casa” é sempre mais forte quando reduz seu foco nas suas duas personagens principais. O filme é marcado por flashbacks, alguns recentes, já com a mãe doente, e outros da juventude do protagonista. Aqueles que buscam situar a relação na família como um todo patinam.

A subtrama sobre as possíveis traições do pai ou uma discussão com a irmã sobre o desejo da mãe de encerrar o tratamento se revelam frágeis. A ideia de organizar o filme a partir do preparo dos alimentos para reforçar a presença da tradição também permanece subdesenvolvida.

Wang opta por um estilo despojado. Poucas palavras são trocadas entre personagens que se conhecem profundamente. Muito é comunicado por silêncios e linguagem corporal. Existe uma grande atenção para o apartamento da família, com um retorno constante a imagens que procuram reforçar a ressonância daquele lugar para as personagens centrais. A secura de estilo reforça o desejo de Wang por uma abordagem menos sentimental.

“De Volta para a Casa” se revela uma obra dividida entre a narrativa do filme de imigrante americano, que procura respeitar, e o desejo de Wang de retomar a tradição do drama familiar asiático. O filme está no seu melhor quando permite que as preocupações do primeiro encontrem ressonância na força dramática do segundo.

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