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Não parece, mas estamos mais felizes do que nunca, afirma Steven Pinker

Linguista acredita que problemas como a Covid-19 e a crise do clima são lembretes de como a humanidade está conectada

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São Paulo

Se a percepção comum da sociedade em relação à melhora ou piora pode surgir de impressões isoladas, como bom herdeiro e adepto do iluminismo, a realidade para o professor canadense Steven Pinker só pode ser apreendida de dados e tendências.

Não por acaso, a abertura de sua conferência para o projeto Fronteiras do Pensamento —denominada "E o Amanhã? Pandemia, Poluição, Política e Progresso"— foi dedicada a uma abundante exposição de números que indicam, sim, o progresso da humanidade.

O professor canadense Steven Pinker - Chona Kasinger/The New York Times

Segundo o psicólogo e linguista que leciona na escola de filosofia da Universidade Harvard, basta comparar estatísticas sobre expectativa de vida, mortalidade infantil, probreza extrema, analfabetismo, entre outros problemas fundamentais e comuns para todas as sociedades, para verificar melhoras hiperbólicas, sobretudo a partir do fim do século 19.

A conclusão, a princípio, é de que há uma relação entre essas melhorias e o aumento da felicidade ao longo do tempo. Quando questionado pelo psicanalista Christian Dunker, que mediou a palestra, sobre desigualdade e o porquê de estarmos progredindo, mas não nos sentido mais felizes, Pinker, devoto do empirismo, cravou que "as pessoas poderiam falar isso, mas elas estariam erradas".

Nesse caso, o remédio para o canadense seria prestar mais atenção em sites como o Our World in Data —que reúne dezenas de gráficos sobre demografia, saúde, economia e outros— do que em redes sociais, observando uma amostra aleatória de eventos repentinos. "São os dados que nos lembram do progresso", reforça ele.

"Algoritmos não se importam com a verdade, mas com a capacidade de compartilhamento. A não ser que tenhamos regras explícitas que favoreçam a precisão, a verdade e a objetividade, nós naturalmente nos desviaremos para o irracional", afirma Pinker, lembrando a popularidade de publicações que atendem diretamente a anseios pessoais e políticos, ainda que sejam fake news.

Nem os movimentos políticos escapam de seus gráficos. Pinker destaca o fato de o mundo nunca ter sido "tão democrático quanto hoje", considerando a guinada pós-1990, com o fim de regimes autoritários na América Latina, na Ásia e no Leste Europeu.

Ao mesmo tempo, ele não ignora a tendência de novos regimes de matizes autoritários, como os enfrentados nos Estados Unidos com Donald Trump, e Jair Bolsonaro no Brasil. E ainda que Pinker evite trazer previsões para o futuro, os números apontam para uma perda de popularidade desse tipo de líder.

"Quanto mais jovem for a geração, menos popular é o movimento populista", aponta Pinker. "E temos razões para crer que as pessoas tendem a manter sua visão política conforme envelhecem."

Mesmo que o populismo continue atraente por atender a expectativas da natureza humana, o caminho é a globalização, motivada, como o linguista aponta, pela necessidade de nações cooperarem para lidar com desafios globais como a crise do clima ou a própria pandemia.

"Fechar fronteiras e olhar somente para dentro da nação são medidas que provavelmente não resistirão às forças do século 21", arrisca Pinker.

Segundo ele, é possível tirarmos algumas lições valiosas da pandemia. Além de ser um lembrete de que o que acontece em outros países afeta a realidade mundial, a crise da Covid-19 alerta para a necessidade de uma infraestrutura capaz de "responder a pandemias emergentes pelo mesmo motivo que temos corpos de bombeiros".

"Normalmente, os bombeiros não fazem nada. Eles esperam por um incêndio. Ainda assim, pagamos por eles para estarem disponíveis quando precisarmos", compara o professor. Afinal, doenças infecciosas são a regra, não uma exceção ao longo da história da humanidade.

O fato é que a humanidade é ruim em associar diversas causas a seus possíveis efeitos no futuro, trazendo problemas para investimentos a longo prazo, por exemplo. Biologicamente, destaca Pinker, vale notar que nossa capacidade de imaginar o futuro ocorre na mesma região do cérebro que trabalha com a memória.

"Tendemos a imaginar os eventos do passado e assumir que o futuro será da mesma forma. Mas a realidade é muito mais complicada, há centenas de forças que nos puxam em diferentes direções."

Nesse sentido, até mesmo o autor de "O Novo Iluminismo" concorda que há temas —como o que teria acontecido antes do Big Bang ou a própria existência da subjetividade— que dificilmente estudos objetivos poderão decifrar.

"Esses são mistérios no sentido de que ainda não temos uma boa hipótese que pode ser testada que iria satisfazer nossa própria curiosidade", afirma. "Mas alguns mistérios se tornam problemas que podemos estudar. Outros, até onde sabemos, podem permanecer mistérios."

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