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'Bárbara', com Marisa Orth, retrata o vício em álcool sem moralismos

Atriz estrela espetáculo inspirado no relato autobiográfico da jornalista Barbara Gancia sobre sua relação com a bebida

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Bárbara

  • Quando 22 de outubro a 12 de dezembro de 2021. Sex. e sáb., às 21h; domingos, às 18h.
  • Onde Teatro FAAP: R. Alagoas, 903 - Higienópolis.
  • Classificação 14 anos
  • Direção Bruno Guida
  • Link: https://www.faap.br/teatro/em-cartaz.asp

O espetáculo "Bárbara" é inspirado no relato autobiográfico de Barbara Gancia, "A Saideira", no qual ela conta como enfrentou décadas de alcoolismo. Logo que começa o monólogo, Marisa Orth entra em cena sublinhando uma velha dialética do teatro. Ao mesmo tempo em que ela representa a jornalista, também evidencia que quem está ali é ela mesma, a atriz acostumada a papéis cômicos, com 40 anos de carreira e vivamente interessada na história de Barbara Gancia.

Em um fundo cinza mulher branca segura faixa branca
A atriz Marisa Orth em imagem de divulgação do monólogo 'Bárbara', que ela protagoniza - Bob Wolfenson / Divulgação

Há momentos, por exemplo, em que a cena se parece com um espetáculo de comédia stand-up. A atriz ocupa o centro do palco, interpreta voltada para frente, as luzes da plateia são acesas. Ela cria pausas para o riso, propõe interações, se mostra atenta ao público e intercalas histórias pessoais suas com a da jornalista. É a atriz que se faz presente.

Ao mesmo tempo, ela também realiza em cena uma mimetização pormenorizada da jornalista e autora do livro. Em várias passagens da peça, Marisa Orth se faz outra, ressalta em sua fala e em seu corpo os gestos e trejeitos, o modo de rir e de falar de Gancia.

A atriz transita rapidamente entre esses polos, criando uma sensação de simbiose com muito bom rendimento teatral. Tal duplicidade da atuação também aparece na forma com que o assunto aparece no espetáculo dirigido por Bruno Guida. A peça combina passagens divertidas e patéticas com momentos que revelam o impacto social arrasador do alcoolismo.

Não é um amálgama qualquer, o mecanismo funciona como um tipo de antídoto contra a condenação moralista da bebida e não subestima a dificuldade do assunto. Assim como Barbara Gancia faz em seu livro, o espetáculo deixa conviver a sensação de liberdade e transcendência que a embriaguez proporciona com a violência que ela também pode despertar. Vemos o triz que separa a alegria da desmedida. Como a potencialidade expansiva do álcool pode, num instante, se tornar destrutiva.

Em paralelo, contudo, o espetáculo tende a enfatizar de modo excessivo a magnética personalidade de Barbara Gancia. Algo que já é visível no título, "Bárbara", cujo acento, inexistente no nome da jornalista, e a associa ainda ao superlativo adjetivo. O destaque dado à "personagem" faz com que o tema propriamente perca um pouco de sua tração. Nesses momentos, é como se o debate sobre o alcoolismo ficasse um pouco refém da figura fascinante que o narra.

Em outras palavras, as curiosas e folclóricas particularidades da vida de Barbara Gancia passam a se sobrepor à discussão sobre as formas apocalípticas que o alcoolismo pode ganhar na vida de uma pessoa, sobretudo daquelas mais pobres e vulneráveis.

O tema importante, tratado com viva dialética no espetáculo, em vários momentos deixa de ser enfrentado como um problema social, para se tornar um tipo de idiossincrasia marcante, uma característica dessa bárbara figura que desperta tanto interesse. Não é que o assunto desapareça totalmente, mas fica como que enfeitiçado pela "personagem" e pelas luzes da criação artística.

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