Descrição de chapéu
Filmes

'45 do Segundo Tempo', com Tony Ramos, fala de crises para o gosto médio

Estrela da Globo pode atrair público para filme simplório, mas que sabe consolar sem alienar o espectador

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

45 do Segundo Tempo

  • Quando Estreia na quinta (18) nos cinemas
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Ary França, Cássio Gabus Mendes e Tony Ramos
  • Produção Brasil, 2021
  • Direção Luiz Villaça

O filme "45 do Segundo Tempo" gira em torno do reencontro de três amigos de adolescência que não se veem há muitos anos. O primeiro, Pedro, vivido por Tony Ramos, é um dono de cantina em estado falimentar. O segundo, Ivan, papel de Cássio Gabus Mendes, é um advogado em crise familiar. O terceiro, Mariano, vivido por Ary França, é um padre em crise de fé.

O que mais chama a atenção, desde a abertura, quando a crítica situação econômica de Pedro é trazida a nós, é que, paradoxalmente, ele habita um mundo acolhedor. Não só pela luz acolhedora do filme, ou por ele ser um torcedor fanático de futebol —razoavelmente simplório, mas irresistivelmente simpático—, mas também pelo sentimento que tudo isso nos sugere estarmos participando de uma fábula.

Cássio Gabus Mendes, Tony Ramos e Ary França em cena do filme '45 do Segundo Tempo' - Divulgação/Paris Filmes

Ivan não tem uma situação tão melhor assim. Embora a ele não faltem o dinheiro nem a família que faltam a Pedro, é justamente o bolso cheio que o angustia, assim como é o trabalho que o afasta da mulher e do filho.

Para completar o trio, o padre Mariano deixou de pensar em Deus, em Cristo e tudo mais, e vê a vida escorrer sem ter tido nenhum amor terreno e nem mesmo conhecido a sexualidade —mas está apaixonado secretamente por uma fiel.

Com esse tripé, Luiz Villaça parte para o desafio de realizar o chamado "filme médio". É o que se costuma denominar um filme cujo orçamento seja contido. No caso, o filme explora o reencontro e algumas aventuras decorrentes dele, que envolvem a ligação entre o presente de cada um e seu passado comum. Mas os atores são essencialmente três, sendo uma estrela (Ramos), numa produção sem maiores complicações.

O filme médio busca ser popular sem recorrer a vulgaridades que podem chamar a atenção de um público realmente popular. No caso brasileiro, ele se endereça a uma classe média quase sempre resistente à produção nacional.

Daí ser quase obrigatório o apelo a três atores conhecidos sobretudo por sua atividade na TV Globo. Mas também existe certa sensibilidade de Villaça ao abordar a questão. Embora procure não entrar muito na cronologia da nossa crise econômica, a crise é mais que evidente nas dificuldades financeiras de Pedro e sua cantina. É em suicídio que ele pensa.

Ivan, o advogado, não pensa em se matar, mas poderia. Está sendo abandonado ao mesmo tempo pela mulher e pelo filho. Ou seja, o núcleo familiar é não só mencionado, mas convocado. Se no cinema popular dos anos 2010 o consumo era o motor maior, hoje é o núcleo familiar, uma espécie de último refúgio para cada um.

Já Mariano nem a esse consolo pode almejar, já que enfrenta o que pior pode um religioso —uma crise de fé. Assim como Pedro, só pode contar nessa travessia, como apoio e objetivo, o reencontro da amizade.

Villaça expõe essa crise pisando em ovos, o que se compreende. Ninguém vai ao cinema para, além dos aborrecimentos do cotidiano, enveredar pelas dores de uma crise econômica e existencial do tamanho que existe hoje no Brasil (sem contar a crise política). Mas também é evidente que ninguém pode se alienar inteiramente dela.

Assim, "45 do Segundo Tempo" busca oferecer ao espectador algum consolo pelas dificuldades que atravessa, sem alienar ninguém inteiramente. Daí criar em torno dos personagens esse mundo acolhedor, do qual o suprassumo será o futebol. Ali o conflito é aberto, mas produz uma espécie de universo paralelo.

A paixão futebolística no filme é bem mais plana, destituída das dores e contradições que encontramos em, digamos, "Boleiros - Era uma Vez o Futebol...", de Ugo Giorgetti. O futebol paira acima ou ao lado das dores do mundo real. É capaz de resgatar todos os nossos problemas e, por isso mesmo, nos encaminhar a um final um tão simplório quanto o dono da cantina.

Mas é esse final, esse caráter simplório, que dão ao filme, justamente, a oportunidade de ao menos atrair um bom público aos cinemas. Se conseguir, esse filme simpático terá alcançado um objetivo similar ao de seus personagens —sobreviver aos obstáculos do mundo. No caso do filme, graças a uma estética que foge a qualquer desafio, mas que Villaça desta vez maneja com alguma desenvoltura.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.