Emanoel Araújo queria em vida doar sua coleção; leia entrevista inédita do artista

Em mostra no Museu Afro Brasil, intelectual morto aos 81 anos relembrou chegada a uma São Paulo de Tarsila do Amaral

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Brasília

"A exposição é uma vivência paulistana de um artista chamado Emanoel Araújo." Foi assim que o próprio intelectual, morto nesta quarta-feira, aos 81 anos, definiu "Arqueologia Amorosa de São Paulo", mostra de janeiro deste ano no Museu Afro Brasil com coleção que ele mesmo criou ao longo dos anos.

Retrato de Emanoel Araujo, em 2012, no Museu Afro Brasil
Retrato de Emanoel Araujo, em 2012, no Museu Afro Brasil - Isadora Brant/Folhapress

Pinturas que evocam a capital ainda das várzeas, trabalhos de Regina Gomide e John Graz com a chegada do art déco ao país e mobiliários de Lina Bo Bardi e Paulo Mendes da Rocha faziam, acima de tudo, jus aos 81 anos do artista de Santo Amaro da Purificação, na Bahia, segundo ele mesmo.

"Quando eu cheguei aqui, em 1965, todo mundo estava trabalhando, produzindo. E todos estavam naquele afã de um mercado que não existia", lembrou ele na exposição em entrevista a este jornal. "Todo mundo", no caso, eram artistas do calibre de Tarsila do Amaral.

O também diretor do museu nunca tinha mostrado sua coleção particular com a extensão que fez nessa mostra, que durou até junho, e ele afirmou que pretendia dar um destino público a ela.

"Gosto que as pessoas sejam abduzidas pelas exposições", disse ele. "São fragmentos que, emendados, daria para se ter uma visão dessa cidade extraordinária —porque essa visão de São Paulo só se tem em São Paulo."

O artista baiano que se diz fortemente influenciado pela cidade —e que o burburinho dos anos 1960 foram definitivos para que ele escolhesse ficar na cidade— também foi fundamental para as artes visuais na capital paulista.

Com Paulo Mendes da Rocha, Araújo botou o prédio do Pinacoteca abaixo e integrou o pátio ao jardim da Luz. Ele também movimentou um público recorde à época, com 150 mil visitantes em 38 dias para a mostra de Auguste Rodin.

"Quando eu dirigia a Pinacoteca, fiz questão de fazer a reforma com Covas e Marcos Mendonça para realmente reativar a questão das pessoas irem ao centro. O parque da Luz era um antro de prostituição muito decadente, um espaço de venda de droga. Também interfere no parque para que ele voltasse a algo que fosse verdadeiramente seu significado, sua competência, que era de um jardim público", afirmou ele.

Um dos principais feitos da sua trajetória como divulgador da arte no Brasil veio justamente com a direção do Museu Afro Brasil, no parque do Ibirapuera, criado em 2004, durante a prefeitura de Marta Suplicy.

O diretor, no entanto, dedicou maior gratidão a José Serra, do PSDB, sucessor da petista na prefeitura paulistana. Em 2005, Araújo chegou a se tornar o titular da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.

Araújo também considerava que a cidade sempre teve maus administradores. "Ela foi muito pouco cuidada, e sempre se ocuparam de transformar a cidade em grandes prédios prédios, com arranha-céus, mas se esqueceram da periferia e mesmo dos centros."

Fotografias de German Lorca, que fez história com suas imagens ultrageométricas, e trabalhos de Marcello Nitsche também deram conta de homenagear os que marcaram a paisagem urbana da cidade. "A gente sempre considera que as coisas todas são uma homenagem não só à cidade, mas a cada participante dessa exposição, como Nitsche", conta ele, que teve o artista como colega.

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