Como Adriel Visoto retrata um mundo gay solitário e urbano em suas pinturas

Artista mineiro apresenta em galeria de São Paulo sua produção recente, inspirada por David Hockney e Edward Hopper

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Detalhe de 'Terraço', pintura de 2023 de Adriel Visoto

Detalhe de 'Terraço', pintura de 2023 de Adriel Visoto Divulgação

São Paulo

Um rapaz bebe refrigerante sozinho em uma rede de fast food. Outro observa o movimento da rua a partir da varanda de um prédio. Um terceiro joga videogame sentado no canto de um longo sofá, absorto por Mario Bros na telinha.

Nas pinturas de Adriel Visoto, rapazes solitários habitam metrópoles como São Paulo ou são retratados na intimidade de seus apartamentos. É como se o artista, com suas telas figurativas em pequenos formatos, chegasse bem perto de vidas anônimas que poderiam ser a de muitos de nós.

'Fast Food', pintura a óleo de Adriel Visoto de 2023
'Fast Food', pintura a óleo de Adriel Visoto de 2023 - Divulgação

Um conjunto de 14 de seus instantâneos pode ser visto agora na galeria Verve, no centro de São Paulo, na exposição "Estranho Comum", que reúne trabalhos feitos pelo artista mineiro no último ano.

"Toda a minha pesquisa está nessas narrativas mais íntimas. Mesmo quando as imagens se situam numa paisagem urbana, num espaço público, elas têm uma certa interioridade. São cenas de contemplação", diz o artista por telefone.

Visoto, de 35 anos, conta que suas pinturas nascem a partir de fotografias armazenadas no celular. Esta influência fica nítida para quem olha, tanto porque é possível reconhecer alguns lugares retratados quanto porque as telas são fidedignas a situações do cotidiano. Não há excessos nos quadros —todos os elementos estão em seus devidos lugares, congelados no tempo.

Os trabalhos do artista trazem à mente a estética dos pintores Edward Hopper e David Hockney, que Visoto reconhece serem influências relevantes na sua poética. Segundo o pintor, o primeiro é uma referência para ilustrações com personagens solitários, e o segundo, para a temática homoerótica.

É notável a ausência de mulheres nas telas de Visoto, assim como a presença de corpos masculinos nus, seja tomando banho, seja escolhendo uma camisa no armário. Há também detalhes, a exemplo de um calendário de padres italianos preso numa parede ao lado de uma imagem de um rapaz na praia.

Talvez muitos não pesquem as referências ao universo gay, mas para o artista isso não é um problema. Visoto afirma ver o erotismo em suas pinturas em segundo plano. "É uma questão não tão clara, não tão óbvia."

As telas em exposição têm paleta de cores reduzida e aspecto monocromático —numa das paredes todas são esverdeadas, em outra, em tom violeta, e assim por diante. A disposição tem o objetivo de criar uma atmosfera, diz o artista, e a tonalidade dominante se relaciona com suas memórias das cenas retratadas.

Isso quer dizer que pinturas mais solares vêm de imagens tiradas em tardes de sol, enquanto as violetas têm uma luz mais noturna. É também possível enxergar nessa luminosidade artificial uma relação com as publicações das redes sociais, na avaliação do crítico Ivo Mesquita, curador da mostra.

É como se as tonalidades fossem filtros. Assim como as pinturas de Visoto, as redes sociais mostram uma narrativa ficcionalizada de cada um. "É um artifício para como você quer ser visto", diz o artista.

Adriel Visoto - Estranho Comum

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