Caetano Veloso rouba a cena do C6 Fest com um público maior e mais animado

Entre todas as atrações internacionais, artista baiano foi quem comoveu a plateia apresentando seu sólido repertório

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Os shows que abriram o último dia do C6 Fest, que acontece desde sexta-feira, 19, no parque Ibirapuera, dedicaram-se a celebrar momentos e figuras históricas fundamentais para a música brasileira. Um dos homenageados, Caetano Veloso, encerrou a programação da área externa reunindo o maior público de todos os três dias de festival.

O cantor Caetano Veloso no C6 Fest - Adriano Vizoni/ Folhapress

Mesmo com várias atrações internacionais, foi o show de Caetano Veloso que mais atraiu o público. A plateia de Caetano ocupou boa parte da área externa do Auditório do Ibirapuera, com capacidade para 10 mil pessoas. É um dos quatro espaços do C6, que tem shows no auditório, para 800 pessoas e numa tenda, com capacidade de 5.000, além da pista eletrônica.

A força do repertório do artista ficou evidente ao longo do show, cheio de coros e com o público cantando junto. Depois de "Sozinho" e "Desde Que o Samba É Samba", apresentadas a voz e violão, o tropicalista abriu um sorriso e disse que era um presente ouvir o coro do público em alto volume.

Ele subiu ao palco com quase meia hora de atraso, perto de 18h30, e teve alguns problemas técnicos -de microfonia ao violão mudo por alguns segundos. A apresentação foi baseada em "Meu Coco", seu álbum mais recente, de 2021, que rendeu a faixa-título, "Anjos Tronchos", "Não Vou Deixar" e "Sem Samba Não Dá" ao repertório.

Caetano também passeou por pérolas antigas, como "Muito Romântico", de 1978, e se declarou a São Paulo, segundo ele, cidade definidora de sua trajetória. A capital paulista surgiu em "Sampa", para comoção da plateia, que reagiu com gritos à citação a Rita Lee, morta há duas semanas, na letra.

Com um rico naipe percussivo, Caetano abriu o repertório para algumas de suas músicas mais conhecidas. Cantou "Terra", "Qualquer Coisa", "Cajuína", "Leãozinho", "You Don't Know Me", "Baby", "Menino do Rio", "Odara" e "Reconvexo", numa rara apresentação com cara de festival no C6.

Mais cedo, nomes da cena mais recente deixaram de lado seus repertórios para mergulhar primeiro no ano de 1973 --um dos mais férteis e importantes da produção musical brasileira, com o lançamento de vários álbuns que se tornaram clássicos e estreias de artistas. Depois, em músicas famosas na voz de Gal Costa, morta em novembro de 2022.

O tom celebratorio, que poderia soar anacrônico, casou bem com as vozes escolhidas para subir ao palco. O elenco soube imprimir sua própria identidade nas canções lançadas há cinco décadas.

Juçara Marçal e Kiko Dinucci —integrantes do grupo paulistano Metá Metá e donos de dois álbuns celebrados nos últimos anos, "Delta Estácio Blues", de 2021, e "Rastilho", do ano anterior—, regeram toda a apresentação. Eles convidaram artistas para tocar canções lançadas no período em versões típicas de seus sons, com distorções e colagens sonoras.

A baiana Jadsa foi a primeira a entrar no palco, com "Umeboshi", de Gilberto Gil, e "Bala com Bala", de João Bosco. Depois veio Linn da Quebrada, que cantou "Abundantemente Morte", do álbum "Pérola Negra", clássico de Luiz Melodia, e "Fala", da obra homônima dos Secos & Molhados.

Também baiano, Giovani Cidreira celebrou a obra do conterrâneo Caetano a partir de "Araçá Azul", música tema do disco do mesmo nome. "Comportamento Geral", de Gonzaguinha, também ganhou versão potente ao vivo.

Arnaldo Antunes foi o último convidado, com "Roendo as Unhas", de Paulinho da Viola, e "Balanço", do homônimo de Tim Maia. O show terminou com todos no palco flexibilizando o recorte temporal em um ano para homenagear Rita Lee, com "Mamãe Natureza", do álbum de 1974 "Atrás do Porto Tem uma Cidade".

Sob as luzes de quatro holofotes e sozinho no palco, o músico paulista Tim Bernardes continuou a nostalgia e embarcou no repertório de Gal Costa, artista com quem colaborou e tocou. A última apresentação da cantora, no Coala Festival de 2021, aliás, contou com a participação do artista.

Foi com "Baby", música que Bernardes cantou naquele show no Memorial da América Latina, que ele abriu a apresentação. Foi um show sem firulas e virtuoso, que lembrou canções como "Vou Recomeçar", "Índia", "Negro Amor" e "Flor de Maracujá" e acabou com uma aplaudida "Vapor Barato", faixa de Jards Macalé eternizada no ao vivo "Fa-Tal - Gal a Todo Vapor", de 1971.

Um pouco antes do show de Caetano, na Tenda Heineken, a plateia já era bem mais numerosa —e jovem— do que na sexta e no sábado no show do Black Country, New Road. A banda britânica abriu a programação do domingo na tenda.

O grupo entrou no palco dançando ao som de "Crazy in Love" ds Beyoncé, interrompida no refrão pelo saxofone de "Up Song", com sua mensagem de amizade e amadurecimento entoada e ovacionada.

O entusiasmo de quem via o show perdurou. Mesmo as canções mais intimistas —nenhuma fruto dos dois álbuns de estúdio do grupo, deixados de lado depois da saída do vocalista Isaac Wood— foram recebidas com assobios e gritos, quando não cantadas junto.

É um feito impressionante para uma banda que lançou em shows e em um disco ao vivo, ainda este ano, as músicas apresentadas. O som, aliás, é complexo, com flauta transversal, sax, violino, banjo, violão, bandolim, piano elétrico, acordeão, além do baixo, guitarra e bateria.

Natalie Mering, a Weyes Blood, assumiu a plateia lotada na sequência. Ela abriu o show com "It's Not Just Me, It's Everybody", do disco "And in the Darkness Hearts Aglow" e agradou ao fazer dancinhas com seu vestido longo e branco esvoaçante. Mering rodopiou e saltitou pelo palco adornado com um candelabro enquanto cantava, com sua característica voz grave.

A performance, em uma música sobre estranhamento e solidão no decorrer de mudanças avassaladoras, fez um par bizarro, mas divertido.

Em uma das pausas entre músicas, ela perguntou quem ali acreditava em astrologia e pediu que as pessoas esquecessem seus mapas astrais —o comentário gerou certo furor.

A faixa etária do público subiu um pouco quando o The War on Drugs, headliner da Tenda Heineken da noite, começou o show.

Visualmente, o show perdeu para os que o antecederam. Sem telão e com um exagero de luzes brancas, a banda não tinha nenhum truque apelativo como o vestido brilhante de Weyes Blood ou o carisma dos muitos integrantes do Black Country, New Road.

São faixas longas, de guitarras muito distorcidas à frente e vocal que lembra Bob Dylan ou Bruce Springsteen, numa pegada de música para ouvir na estrada, bem americano. Soa como o "dad rock" —e alguns estavam até acompanhados de seus filhos— da geração X agora que os baby boomers estão mais para avós.

Dia mais prestigado e lotado do C6 em São Paulo, o domingo ainda teve uma programação concorrida na parte interna do Auditório do Ibirapuera. The Comet is Coming, grupo britânico que funde jazz com rock, funk e psicodelia, e o duo Domi & JD Beck, que faz uma espécie de jazz pós-millennial, tocaram no espaço.

Mas o show mais concorrido do auditório foi o de Samara Joy, a cantora americana que ganhou o último Grammy de artistas revelação. Ela ficou conhecida no Brasil por ter batido Anitta, que depois de décadas representou o país na categoria.

O show inteiro foi centrado em sua voz, que vibrou, grave ou aguda, com limpidez e precisão que impressionaram. Além do alcance, Joy se destacou pela delicadeza com que passeou pelas melodias, e por fazer isso sem esforço.

Esteticamente, Joy representa um jazz tradicional, acompanhada por piano, contrabaixo e bateria, que revezam solos durante as músicas. Ela parece uma figura saída diretamente do século passado —um "choque de nostalgia", como cantou em "Nostalgia", composição própria.

No palco, Joy conquistou o auditório como intérprete. Seja na sequência de "Guess Who I Am", conhecida com Nancy Wilson, e "Lately", de Stevie Wonder, seja nas versões de clássicos nacionais.

A americana cantou, com português bem ensaiado, "Chega de Saudade", famosa com João Gilberto, e "Flor de Lis", de Djavan. Nesta última, chamou a plateia para cantar junto, antes de deixar o palco.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.