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Cérebro sozinho é mais potente que toda a internet, diz cientista Rafael Yuste

Neurotecnologia precisa ser regulada por novos direitos humanos, defendeu pesquisador no Fronteiras do Pensamento

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São Paulo

Um único cérebro humano, formado por bilhões de neurônios, tem mais potência do que toda a internet no mundo.

É com essa premissa que Rafael Yuste, nomeado um dos cientistas mais influentes do mundo pela revista Nature, iniciou sua reflexão no ciclo do Fronteiras do Pensamento, em São Paulo, nesta segunda-feira.

O neurocientista Rafael Yuste - Divulgação

Yuste participa do Brain, projeto inaugurado por Barack Obama em 2017, cujo objetivo é revolucionar o entendimento do cérebro humano.

"Todas as atividades cognitivas são definidas pelo cérebro", lembrou o cientista, que defendeu os estudos do órgão, cujo funcionamento segue misterioso para a ciência, como imprescindível para o avanço no tratamento de doenças neurológicas, psiquiátricas e até motoras —como Alzheimer, depressão, esquizofrenia e esclerose lateral múltipla. "Hoje os médicos podem fazer pouco pelos pacientes porque não entendem o cérebro", defendeu.

Os avanços no conhecimento do órgão estão, segundo ele, em estudar a atividade coordenada dos neurônios, e não molécula por molécula —desafio grande até hoje, devido à falta de tecnologia.

A neurotecnologia, explica Yuste, é formada por dispositivos eletrônicos, óticos, moleculares e magnéticos. "Eles servem para registrar a atividade neuronal e alterá-la", diz.

Muitas dessas tecnologias já estão sendo usadas em testes com ratos e conseguiram introduzir, no cérebro dos bichos, imagens que não estavam vendo ou memórias de fatos que não viveram.

Em humanos, o avanço dessas técnicas poderiam permitir que pessoas com paralisia mexam membros robóticos por meio de um implante cerebral, por exemplo, ou possibilitar a comunicação com uma pessoa com Alzheimer que não consegue mais falar, decodificando seus pensamentos.

Mas a neurotecnologia, que passa por uma "revolução", segundo Yuste, não servirá apenas para tratar doenças. Em breve os humanos estarão usando esse tipo de tecnologia também para se comunicar, como que por telepatia, e para usar equipamentos —tornando-se, então, "humanos maiores".

Yuste admitiu que há muitos problemas éticos e sociais com a implementação dessas tecnologias, motivo pelo qual diversos cientistas envolvidos no projeto se reuniram na Universidade Columbia, nos Estados Unidos, chegando a uma defesa da reformulação da Declaração Universal dos Direitos Humanos para incluir normas de proteção ao cérebro humano do uso indevido da neurotecnologia.

Quase como um filme de ficção cientifica, Yuste afirmou que o direito à privacidade mental, para que o conteúdo da mente não seja decodificado sem consentimento, estaria em risco sem a atualização do código internacional. O mesmo acontece com o direito à "identidade mental" e ao livre arbítrio.

O cientista citou também o direito ao acesso equitativo as tecnologias de aumento cognitivo, "para evitar que tenham humanos melhorados e humanos que sem acesso a isso".

Para pôr em prática a proteção desses direitos, seria necessária também a investigação de empresas privadas de neurotecnologia. "Empresas já estão agindo como donas dos dados cerebrais coletados", alertou.

O Chile já elaborou uma emenda à Constituição para proteger dados cerebrais e no Brasil poderá acontecer o mesmo. Yuste disse que a possibilidade está sendo discutida com o senador Randolfe Rodrigues. "Precisamos nos assegurar que essas técnicas tão potentes sejam usadas em beneficio da humanidade", concluiu Yuste.

O ciclo Fronteiras do Pensamento já teve encontros neste ano com a escritora Rosa Montero e a ativista Nadia Murad, vencedora do Nobel da Paz, e continua até outubro.


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