Obra de Tunga ocupa sala que era da aranha de Louise Bourgeios no MAM-SP

Museu no parque Ibirapuera exibe pela primeira vez no Brasil 'Eu, Você e a Lua', um dos últimos trabalhos feitos pelo artista

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Um forte cheiro de âmbar toma conta da sala de vidro do Museu de Arte Moderna de São Paulo. A essência pinga a partir do buraco na ponta de um dedo gigante de bronze, escorre sobre uma pasta esbranquiçada e, por fim, molha o chão de terra. Esta ação, uma mistura de elementos humanos e minerais, faz parte de uma grande instalação de Tunga montada agora pela primeira vez no Brasil, que fica em exposição no MAM até janeiro do ano que vem.

"Eu, Você e a Lua" foi uma das últimas obras executadas pelo artista, pouco antes de sua morte, em 2016, e emprega elementos recorrentes em seu vocabulário, como garrafas de vidro, cristais e esculturas de dedos. O trabalho ganha relevância não apenas por seu ineditismo no país, mas também por estar exposto num espaço nobre, à vista de todos os frequentadores do parque Ibirapuera, onde antes ficava a aranha de Louise Bourgeois, vendida neste ano sob lamentos da classe artística.

Obra 'Eu, Você e a Lua' (2015), de Tunga, montada no Museu de Arte Moderna de São Paulo - Ding Musa/Imagem licenciada pelo Instituto Tunga

Era uma visão familiar para os pedestres, patinadores e skatistas, a do aracnídeo com suas imensas patas de bronze encapsulado na redoma de vidro do MAM. Em comparação com a obra de Tunga, que exige mais do espectador por não ter uma leitura óbvia, "a aranha tinha uma coisa mais imediata", afirma Cauê Alves, curador-chefe do museu.

Agora, é preciso fazer sentido para compreender um trabalho que apela à visão e ao olfato. "A obra tem essa coisa sensorial de transformar um elemento em outro, o visível em cheiro", diz Alves. "Sua força está nessa coisa rústica e bruta, mas muito refinada. Olha a delicadeza do cristal", acrescenta, apontando para as pedras que pendem de um tripé.

Por rústico Alves se refere ao elemento central do trabalho, um antigo tronco de árvore petrificado, ao redor do qual todas as peças da obra gravitam. Foram necessários oito homens para carregar o tronco, ele conta, numa operação que contou com a ajuda do ex-assistente de Tunga para que a obra ficasse tal qual o criador queria, incluindo o chão de saibro, o mesmo das quadras de tênis.

"Eu, Você e a Lua" estava em Nova York, onde integra uma coleção privada. Ela foi exibida pela primeira vez em 2015, num castelo na França, e depois passou pela feira Art Basil, na Suíça, pelo Reino Unido e por uma exposição no museu Minsheng, em Pequim. Sua chegada a São Paulo é uma oportunidade de ver uma instalação de grandes dimensões de Tunga, que lembra suas obras de porte semelhante expostas no pavilhão do artista em Inhotim, o museu mineiro.

Este é o trabalho de maior relevância mostrado na sala de vidro desde a saída da aranha de Louise Bourgeois, que ficou exposta ali por 21 anos, entre 1997 e 2018, por causa da importância de Tunga, um dos principais nomes do cenário artístico brasileiro da segunda metade do século 20 até sua morte. O pernambucano tinha larga carreira no exterior —foi o único brasileiro vivo a expor na Pirâmide do Louvre e participou da Bienal de Veneza e da Documenta de Kassel.

A sala, que agora é vista de fora por um número menor de pessoas, dado que a marquise do Ibirapuera está em reforma e bem menos gente passa por ali, abrigou trabalhos de outros artistas contemporâneos nos últimos anos, como uma instalação de Rodrigo Bueno, um trabalho de Shirley Paes Leme que refletia sobre a cidade de São Paulo e uma série de peças de cerâmicas de Lidia Lisbôa em formato de formigueiro.

A escultura 'Aranha', da artista francesa Louise Bourgeois, quando esteve exposta na vitrine do Museu de Arte Moderna de São Paulo - Marcelo Ximenez/Folhapress

A aranha foi vendida em maio por US$ 32,8 milhões num leilão na Sotheby’s de Nova York, cerca de R$ 163,7 milhões, sob protestos de parte da classe artística que questionou a atitude da Fundação Itaú de se desfazer de uma obra de tamanha relevância de seu acervo. Outras aranhas da mesma série estão hoje em exibição em alguns dos principais museus do mundo, como o Guggenheim, em Bilbao, na Espanha, e a Tate Modern, em Londres.

De acordo com comunicado da Fundação Itaú divulgado à época do pregão, os fundos do leilão vão custear as operações do Itaú Cultural, garantindo a perenidade do centro cultural paulistano. Também naquele momento, o MAM afirmou que a exibição da obra foi um marco na história do museu.

'Eu, Você e a Lua', instalação de Tunga

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.