Mostra relaciona obra de Francisco Brennand com culturas afro e indígenas

Exposição 'Invenção dos Reinos', no Recife, marca a abertura de sua oficina para receber trabalhos feitos por outros artistas

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Recife

Nas cerâmicas de Francisco Brennand, há alguns elementos que se repetem com frequência, como serpentes, ovos, pássaros, peixes e sereias. Mas este universo fantástico não foi apenas uma invenção do artista —ele surgiu a partir de seus estudos das culturas afrodescendentes e indígenas, antes de serem transformados em suas peculiares esculturas e murais.

Fotografia de Aoruarua exposta na mostra 'Invenção dos Reinos'
Fotografia de Aoruarua exposta na mostra 'Invenção dos Reinos' - Aoruaura

Sobre este argumento se organiza a exposição "Invenção dos Reinos", que abre neste sábado, na Oficina Francisco Brennand, no Recife. A ideia é tirar o escultor que dá nome ao espaço expositivo de seu lugar iluminado de criação e inseri-lo num contexto histórico de cosmogonias de outros povos, diz Marcelo Campos, um dos organizadores da mostra.

Para isso, esculturas, murais e pinturas de Brennand são colocadas ao lado do trabalho de outros 30 artistas contemporâneos, a maioria indígenas ou negros e alguns deles pouco conhecidos. Por exemplo, uma série de fotografias de Aoruaura onde vemos uma pequena cobra circundado um olho humano está próxima de esculturas de serpentes feitas pelo ceramista. Cobras também aparecem nas pinturas de Daiara Tukano.

Um dos destaques da exposição são os desenhos de Helcir Almeida, um funcionário da oficina que transformava os elementos da natureza em estudos para as cerâmicas utilitárias que Brennand executava. Almeida trabalhou por mais de 50 anos ao lado do escultor, e também criou o arco e a flecha que se tornaram o logotipo da instituição —uma representação minimalista do ofá, a arma do orixá Oxóssi.

Outra obra de destaque é uma paisagem sonora composta por Tiganá Santana, artista agora em exposição na Bienal de São Paulo. É uma peça de áudio que começa com ritmo de baião e vai aos poucos se transformando em sonoridade mais metálica. "Acho que tem a ver com este lugar, que era uma fábrica", afirma o organizador, em referência à função original da oficina.

"Invenção dos Reinos" marca a abertura da Oficina Brennand para receber o trabalho de outros artistas —até então, eram exibidos basicamente obras do criador do espaço, dado que o escultor morou e produziu no lugar por mais de 50 anos, até sua morte, no final de 2019.

A ideia agora é que a oficina seja um espaço cada vez mais inclusivo, afirma Marcos Baptista, o presidente da instituição. "O aspecto coletivo dessa exposição transmite a ideia de uma paisagem que pode ser ocupada e compartilhada por todos de forma participativa."

A participação se estende aos moradores da mata nos arredores da oficina. Há, por exemplo, um vídeo com um depoimento de Dona Zeza, uma amiga de Brennand com quem ele benzia e de quem recebia rezas —ela é iniciada na tradição religiosa da Jurema, um culto indígena com forte influência africana, muito presente no Recife e em João Pessoa.

A mata aparece ainda na exposição com as fotografias de Abiniel Nascimento, o registro de uma performance sua em meio à floresta. Segundo o organizador, a mostra procura trazer a mata para dentro da oficina, num gesto de "reencantamento" do local, que ele diz não ser somente de racionalidade.

Invenção dos Reinos

O repórter viajou a convite da Oficina Francisco Brennand

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