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Por que a Globo precisa tanto do BBB, que virou mina de ouro com crise nas novelas

Nova edição, que estreia nesta segunda (8), tem a missão de superar o recorde negativo de audiência do ano passado

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Rio de Janeiro

O Big Brother Brasil está de cara nova para reconquistar seu público antigo, firmar poder frente ao mercado publicitário e contornar uma crise vivida pela TV Globo. É o que indicam as várias reformas anunciadas para a 24ª edição do reality, que foi de triunfo a pedra no sapato em dois anos.

O BBB do ano passado registrou a pior audiência da história do programa, com uma média de 18,7 pontos na Grande São Paulo, equivalentes a 3,87 milhões de telespectadores. Foram quase dez pontos a menos do que a média de 2021, quando a vitória da paraibana Juliette Freire parou o Brasil.

A sala de estar do BBB 24 - Manoella Mello/Divulgação

A nova edição do programa, que estreia nesta segunda-feira com 26 participantes —o maior elenco da história, entre anônimos e celebridades—, tem a missão de contornar a crise da queda de audiência, uma vez que um fracasso no BBB poderia representar um rombo na receita da Globo.

A emissora tem o reality show como um de seus principais pilares financeiros para a programação de boa parte do ano, afirma Mauricio Stycer, jornalista especializado na cobertura de televisão e colunista da Ilustrada. Para se ter ideia, esta edição já ultrapassou a casa do R$ 1 bilhão com publicidade.

As novelas, antes a galinha dos ovos de ouro da emissora, vão de mal a pior. Entre as que estão em exibição, "Elas por Elas" tem registrado 16 pontos de audiência na Grande São Paulo, um recorde negativo para a faixa das seis, e "Fuzuê" é o título de menor audiência da faixa das sete em uma década.

Os últimos folhetins, com exceção de "Pantanal" e de "Vai Na Fé", também tiveram números ruins. "Travessia", trama de Gloria Perez que antecedeu "Terra e Paixão", teve capítulos que registraram a pior audiência da história da emissora para uma novela das nove.

É neste cenário que o BBB virou a principal vitrine publicitária da Globo. É difícil ver um episódio que não exiba entre duas e três ações publicitárias que forçam os participantes a virarem garotos-propagandas das marcas.

"A Globo chegou ao ponto absurdo, e digo como elogio, de patrocinar até a ressaca dos caras depois das festas. É genial", diz Chico Barney, jornalista especializado na cobertura de reality shows, lembrando o patrocínio de um popular remédio para curar os excessos das bebedeiras a ações dos programas.

E o BBB é um produto barato, na visão dos especialistas. Levar duas dezenas de pessoas a uma casa artificial por três meses sai mais em conta do que apostar às escuras numa novela ou numa série, que demandam cidades cenográficas grandiosas e a contratação de atores com salários que, somados, ultrapassam os R$ 3 milhões que podem ser dados a quem chega à final do reality.

A Globo fechou contratos milionários com empresas como McDonald's, Amstel e Mercado Livre para esta edição. A cota publicitária mais cara custou R$ 114 milhões, num acordo que garante exposição da marca em todas as mídias do programa.

Mas, para isso, a emissora faz mudanças profundas na dinâmica do jogo. A maior delas foi anunciada em agosto, mesma época em que a empresa vende o programa para o mercado publicitário, segundo Mauricio Stycer

A baixa audiência, dizem os especialistas, se deve a uma parcela de espectadores que não estava vendo mais seus desejos representados na telinha. Em 2021, os fãs de Juliette, a vencedora da edição, fizeram com que o programa perdesse um dos participantes mais queridos do público, o economista Gil do Vigor, que havia brigado com ela dias antes da final.

Aconteceu algo semelhante no ano retrasado, quando o exército de fãs do ator Arthur Aguiar se mobilizou para fazer com que ele chegasse ao pódio, ainda que o participante não fosse o favorito de muitos. É uma constante que se repetiu com os admiradores da vencedora do ano passado, Amanda Meirelles, que estava longe de cativar a maioria.

"As torcidas organizadas sequestraram o BBB nos últimos três anos, e isso vinha tendo um efeito muito negativo", afirma Chico Barney. "São vários grupos de centenas de pessoas organizadas 24 horas por dia, brigando na internet. Quando uma torcida monopoliza o jogo, enfraquece o programa, porque tira o telespectador mais ocasional da jogada."

A Globo, diz Barney, tem demonstrado um desejo de se conectar de novo com o espectador médio do programa, que assiste a bel-prazer, sentado no sofá de casa, sem fazer do BBB a coisa mais importante de sua vida.

É por causa disso, diz ele, que a emissora mudou o esquema de votação. Pela primeira vez, os votos serão computados a partir de um sistema duplo. No esquema tradicional, agora chamado de "voto da torcida", cada pessoa pode votar quantas vezes quiser. No outro, é possível dar apenas um voto por CPF. O resultado será calculado a partir da média ponderada dos formatos.

Na prática, deve ficar mais difícil que os fãs de um participante se mobilizem em mutirões que atravessavam dias e noites votando sem parar, o que acaba com o efeito surpresa do jogo e impõe sua vontade à de um público que é maior, mas menos engajado.

Além disso, pessoas com menos de 16 anos, que costumam ter mais tempo livre, devem pedir autorização de um adulto antes de votar, o que deve impedir que crianças e adolescentes controlem os rumos do jogo.

Apesar das mudanças, Rodrigo Dourado, um dos diretores do programa, afirma que as novidades não visam agradar a um nicho de espectadores. "O voto único vai ser importante para contemplar o público que quer sentar, assistir ao programa e se sentir empoderado. Mas o voto da torcida também é importante. Não podemos abrir mão da galera engajada", diz.

Fato é que as votações têm representado conflitos para a emissora. As redes sociais foram tomadas nos últimos anos pela suspeita de que fãs teriam usado robôs para fraudar o resultado do programa. Ao ser questionado sobre o assunto, Dourado foi interrompido por José Bonifácio de Oliveira, o Boninho, chefão do BBB e do gênero de variedades na emissora, que não participava da entrevista coletiva.

"Não tem robô. A gente não pode contar o que fazemos porque estaríamos dando chance de as pessoas entenderem como é. Mas trabalhamos inclusive na deep web, para você entender o nível de cuidado. Não existe robô, nunca existiu nem vai existir. É impossível. Temos até hacker trabalhando conosco", afirmou.

Foi Boninho quem também afirmou, na Comic Con Experience, em dezembro, ter perguntado aos candidatos se eles estavam com o nome sujo durante o processo de seleção. "O público pediu, e a gente vai trazer um BBB mais popular."

Esta foi outra indicação de que o BBB quer voltar aos seus primórdios, também com a escolha dos participantes. Pela primeira vez em cinco anos, as celebridades representam apenas um terço do elenco, e não metade, como vinha sendo.

O diretor não mentiu. Quase todos disseram estar passando por dificuldades financeiras ao se apresentarem ao público. O baiano Lucas Pizane disse ser "pé rapado" e que deve aluguel. O catarinense Maycon Cosmer se definiu como "tia da merenda" e afirmou não ser preciso se formar em medicina para ser feliz.

Há ainda a operadora de caixa Leidy Elin, que fez sucesso nas redes ao dizer que está pouco interessada em fama e que só quer saber do prêmio para ter estabilidade financeira. A paulista Beatriz dos Santos também gerou burburinho ao declarar que já trabalhou como camelô e que passou a vida fugindo de fiscais.

Com um elenco cheio de "gente como a gente", não resta dúvidas de que a Globo está mesmo preocupada em se reconectar com o povo.

Colaborou Gabriel Vaquer

O jornalista viajou a convite da TV Globo

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