SOBRE O TEXTO Os poemas abaixo são de autoria de um dos expoentes da poesia na Antiguidade romana, que teria sido influência decisiva para autores como Virgílio, Horácio e Ovídio. Aqui apresentados em tradução nunca publicada, os poemas integram o "Livro de Catulo", que reúne versos líricos e epigramas sobre amor, adultério, amizade e política.
1
A quem dou meu livrinho leve e novo
publicado e polido em pedra-pomes?
Pra você, meu Cornélio, pois pensava
que haveria valor em tais bobagens.
Entre itálicos só você ousava
toda a história explicar em três volumes
eruditos (por Jove!) e trabalhosos.
Tome, aceite o livrinho, como seja,
quanto possa valer, patrona virgem,
e que um século ao menos ele dure!
5
Vamos, Lésbia, viver, fazer amores,
que as fofocas dos velhos mais ranhetas
já não valem pra nós sequer merreca.
Cada sol que declina já retorna;
quanto à nós, quando a breve luz declina,
deveremos dormir a noite infinda.
Quero beijos, milhares e centenas,
depois mais, aos milhares e centenas,
depois muitos milhares e centenas,
depois quando fizermos mais milhares,
misturemos a conta, sem sabê-los;
nem malvados nos lancem maus olhados,
se souberem que assomam nossos beijos.
7
Ah, você me pergunta quantos beijos,
Lésbia, eu quero pra ter que basta e sobra.
Faça a conta de toda a areia Líbia
e assafétidas feitas em Cirene
entre o oráculo para Jove ardente
e o sepulcro sacral do velho Bato;
faça a conta dos astros noite adentro
vendo amores excusos dos humanos.
Essa conta de beijos por beijarmos
basta e sobra ao Catulo enlouquecido:
curiosos não fecham tanta conta
e as más línguas não lançam seu fascínio.
8
Catulo, triste, largue dessa loucura
pois se perdeu, perdeu: e dê por perdido.
O sóis brilhavam pra você no passado;
pois só corria aonde a moça queria
e então amava mais que amaram às outras.
E tantas brincadeiras juntos brincavam:
você queria e ela não desqueria.
O sóis brilhavam pra você com certeza,
mas se ela já não quer -- molenga, não queira!
Não busque quem te foge, deixe a tristeza!
Mas fique firme e forte, vai, endureça!
Garota, adeus, Catulo agora endurece!
Não vai atrás e não quer mais forçar barra.
Você que espere, pois ninguém te procura.
Bandida, mas que vida agora te resta?
Quem vai te visitar? Pra quem será bela?
Quem amará? De quem vai ser a querida?
Quem beijará? De quem morder os beicinhos?
Mas vai, Catulo, ature tudo, endureça!
13
Bem se janta, Fabinho, aqui comigo,
logo logo, se os deuses concederem
e você me trouxer imensa e boa
janta junto do brilho de uma moça,
vinho, sal e tempero às gargalhadas.
Se isso enfim me trouxer, venusto amigo,
bem se janta, eu garanto, pois a bolsa
de Catulo se encheu de pó e teias.
Mas em troca te entrego amores puros
de deleites suaves e elegantes
e o perfume que um dia minha moça
recebera de Vênus e Cupidos,
pois você, se cheirar, dirá aos deuses
que te façam, Fabinho, um só-nareba.
Caio Valério Catulo (c. 87 a.C. - c. 57 a.C.) foi um poeta da Roma Antiga.
Guilherme Gontijo Flores, 34, é poeta, tradutor e professor da UFPR.
Maíra Mendes, 36, é artista visual e ilustradora.
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