[SOBRE O TEXTO] O poema nesta página integra o livro "Melancolia", que deve ser lançado em 2019.
Melancolia
1.
Rasgo meu destino
e o trago sem revolta
retiro do bolso minha arma
uma folha de papel
e uma caneta,
não há pólvora!
O ar que me espera
é o ar que me salva,
uma explosão é pouco.
Então uso as metáforas
e as imagens ao meu favor
quando escrevo sem medo
quando escrevo com dor,
grito grito e fico mudo
quando a tarde escurece,
o dia foi-se, tudo padece,
sem prazer, só silêncio,
um instante de alegria não há!
Melancolia,
faz-se necessário
dar um passo, arrisco!
Não me desfaço.
Para esse livro
não escreverei
o que é fácil de entender
o que é fácil de ler
o que é fácil de não ser
o que realmente sou.
Plástico bolha que brinco
ao embrulhar
o boneco do livro.
Iniciarei sem medo,
com a cabeça erguida
falarei em primeira pessoa,
direi, eu! Eu digo!
Cruzarei os mares
com o barco a vela
que me for mais propício
brincarei com o precipício
e sem sentir o ar
respirarei suavemente,
há anos tento descobrir
há anos busco tentar,
tento, há anos descobrir,
o que sou, o que quero
e por que fiz o que fiz
sem pensar e sem sentir,
e me arrependo,
e me distraio, e me confundo
nos anos de minha vida árdua,
cuspida de vinagre
onde o sabor me alucina,
deixei que o vento
cortasse a minha casa
de um extremo ao outro,
esculpi a parede mais linda
de tijolos maciços
com maçarico,
argila, cuspe,
e minhas próprias mãos,
não me importo
se não citarei nesse poema
grandes filósofos,
o casulo está aqui, em mim,
eu me escondo,
eu digo que é frio
quando é noite
e que é quente
na madrugada.
Nada?
Não, sou eu!
Esse livro sou eu!
Melancolia,
a palavra,
resume esse livro
que levo à vida
e o solto no mundo
de todos que o alcançarem.
Falo, porque não
escreverei de forma vã,
quero olhar
para minha melancolia,
e me entristecer, e sentir
que viver é simplesmente viver.
Fogo, aço moído,
ácido cuspido,
sofrimento?
Quero estar no topo,
plástico bolha que brinco
ao embrulhar
o boneco do livro.
2.
Esse estrago continua,
linda essa lua despida,
sua ida é sem volta,
revolta? Tristeza?
Melancolia.
Racha na minha cabeça
o sol que o dia quente no Rio de Janeiro
mantém mesmo a meu contragosto,
não gosto mas não fujo,
o frio dos países nórdicos
me atrai, a escuridão
durante o dia me convida
e sem volta ou ida, eu vou!
Parágrafo
embaralhado
com reis valetes e damas,
o coringa é o que
mais vale.
Vai entender?
Pois eu não entendo!
Astrofísica, astronauta, os astros,
e continuo a caminhar,
a caminhar,
e caminho sem deixar um rastro.
Carlos Cardoso é poeta, autor de "Na Pureza do Sacrilégio" (Ateliê Editorial).
Ilustração de Camila Gray.
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