Descrição de chapéu Brasil que dá certo

Entrega urbana noturna pode cortar custos e aumentar a produtividade

Projeto-piloto em SP mostra redução de 33% no tempo de descarga e velocidade 200% superior

Danae Stephan
São Paulo

Pensada para desafogar o trânsito na cidade de São Paulo, a restrição à circulação de caminhões, reformulada em 2016, é um dos motivos apontados por especialistas para o aumento do custo de distribuição de materiais na cidade –e, em consequência, do aumento nos preços dos produtos.

Em 2015, esse custo equivalia a 11,73% do faturamento bruto das empresas. Em 2017, subiu para 12,37%, de acordo com a pesquisa Custos Logísticos no Brasil, da FDC (Fundação Dom Cabral).

Parece pouco, mas essa diferença de 0,64% corresponde a um acréscimo de R$ 15,5 bilhões nos custos logísticos.

No custo logístico total, a distribuição urbana responde por 23,4%, contra 40,1% de transporte de longa distância e 17,7% de armazenagem. 

Montagem sobre imagem de caminhão que roda sem placa para fugir do horário de restrição de circulação na Marginal Tietê, em São Paulo 
Montagem sobre imagem de caminhão que roda sem placa para fugir do horário de restrição de circulação na Marginal Tietê, em São Paulo  - Eduardo Anizelli/Folhapress

Para contornar esse e outros problemas do setor, como falta de segurança e de locais para carga e descarga, municípios investem em projetos-piloto e inovação que já começam a dar resultados.

É o caso do programa de entrega noturna, iniciativa da Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo, em parceria com a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo), o Banco Mundial e o Centro de Inovação em Sistemas Logísticos (CISLog) da USP.

Participaram do piloto 15 empresas voluntárias localizadas em área de uso misto, na zona oeste, por três meses.

A redução no tempo de descarga foi de 33% (12 minutos), e a velocidade dos caminhões aumentou 200%, em comparação com as velocidades dos horários de pico. Além disso, motoristas apresentaram níveis menores de estresse.

O projeto é parte do plano diretor de cargas da cidade. “A ideia é melhorar a estrutura de circulação de veículos pesados, sem prejudicar o abastecimento, e tirar a pressão do sistema viário”, diz João Octaviano Machado Neto, secretário de mobilidade e transporte de São Paulo.

Mas há uma resistência das empresas envolvidas, tanto das distribuidoras quanto dos varejistas, por conta da questão de segurança e do custo com funcionários.

“O Brasil tem esse paradigma, construído em cima de um mito, de que a entrega noturna é mais perigosa. Isso nunca foi provado”, diz Paulo Resende, coordenador do núcleo de logística, supply chain e infraestrutura da FDC e responsável pela pesquisa de custos logísticos.

O aumento de gasto com equipe também é questionado por especialistas. “Os custos aumentam em função de leis trabalhistas, mas se forem considerados a maior produtividade e o uso do veículo dia e noite, acaba compensando”, afirma Bianca Bianchi Alves, especialista em transportes urbanos do Banco Mundial.

“O maior problema do projeto, no fim, foi controlar os ruídos”, diz Hugo Yoshizaki, coordenador da pós-graduação em logística empresarial e do CISLog, ambos da Universidade de São Paulo.

Medidas como colocar borracha na porta do caminhão e treinar funcionários para que não falem alto, não liguem o rádio e não deixem o caminhão parado com motor ligado resolveram a maior parte dos problemas.

Esses resultados não são surpresa para Fabrício Chaves, diretor de logística de distribuição da Ambev, que há cinco anos vem testando o método no Brasil inteiro.

“Temos vários modelos de distribuição, a depender do nível de restrição de cada local”, afirma. “Temos certeza de que as restrições ao longo dos anos vão aumentar. Por isso, flexibilidade é a palavra mais importante hoje em logística”, diz Chaves.

Segundo ele, o uso de novas tecnologias de mapeamento do trânsito também tem dado resultados, mas é cedo para falar em números.

Crescimento do e-commerce é próximo desafio

O comércio eletrônico no Brasil cresceu 98,3% entre 2011 e 2015. Em 2017, o crescimento foi de 12% em relação a 2016, e esse desempenho deve se repetir em 2018.

“A preocupação é como a cidade se prepara para esse crescimento”, diz Bianca Bianchi Alves, do Banco Mundial, engenheira especialista em transportes urbanos.

Como as mercadorias vendidas pela internet são itens de valor agregado mais alto, muitas vezes são entregues por carro ou motoboy.

 “Temos cerca de 400 mil motoboys em São Paulo. Imagine se essa quantidade for duplicada durante o dia”, diz Hugo Yoshizaki, coordenador do CISLog, da USP.

Outro projeto em estudo em São Paulo pode ajudar a minimizar esse impacto. Envolve microcentros de distribuição, parcerias público-privadas que devem incluir ainda moradia e serviços.

Hoje as empresas entram com os caminhões até a área permitida e, de lá, redistribuem suas cargas para veículos menores, os chamados VUC (veículos urbanos de carga). “Os terminais também estão presentes no plano diretor de cargas. A ideia é trabalhar melhor essa redistribuição para reduzir custos”, diz o secretário de Transporte, João Octaviano Machado Neto.

Com a maior proximidade do centro, também é possível combinar o uso de veículos menores, como motos e bicicletas, para entregas em bairros vizinhos.

“Paris tem uma série de iniciativas como essa. Lá, a prefeitura incentiva a construção de minicentros em estacionamentos públicos, desde que sejam usados obrigatoriamente veículos verdes ou híbridos”, diz Yoshizaki, que é engenheiro de transportes.

Outra solução seria implantar um sistema de “lockers” (armários) em pontos como estações de metrô, onde usuários poderiam retirar suas encomendas. 

É um método comum em favelas e locais de difícil acesso, onde vendinhas recebem de encomendas a correspondências”, diz Bianchi. “Não é uma solução nova, mas é sustentável”.

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