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Com mais confiança e crédito, classe média volta a comprar imóvel

Lançamentos de médio e alto padrão avançaram mais em 2018 do que habitação popular; desemprego ainda é entrave

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São Paulo

O ano começa animador para o setor imobiliário. A retomada do crédito com recursos da poupança e o aumento expressivo de lançamentos mais caros em 2018 apontam para um retorno das classes médias ao mercado.

Em 2018, o volume financiado para aquisição ou construção de imóveis interrompeu três anos consecutivos de queda e avançou 15%, segundo a Abecip (associação das entidades de crédito imobiliário).

O grande impulso veio do salto de 33% nos valores financiados com recursos da poupança, o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo), para R$ 57,4 bilhões.

 

O setor vinha sendo sustentado mais pela demanda no programa de habitação popular Minha Casa Minha Vida.

Já com recursos do FGTS, muito usado no MCMV, o crescimento em 2018 foi de só 2%, para R$ 60 bilhões —patamar de desembolso que segue em níveis históricos altos. A projeção da associação, porém, é de queda de 5% neste ano.

“O FGTS foi fundamental nos anos de crise. Mas ele tem uma característica de fundo, de recursos limitados. O SBPE volta a ter o papel que sempre teve no mercado, de puxá-lo, ainda que sobre uma base baixa”, afirmou Gilberto Duarte de Abreu Filho, presidente da Abecip, ao divulgar os resultados do setor.

No auge, em 2014, os desembolsos do SBPE chegaram a R$ 113 bilhões.

Cristiane Magalhães, diretora de crédito imobiliário do Itaú Unibanco, diz ser positivo ver o avanço do mercado em um segmento “mais livre”. “É um movimento mais natural e menos induzido”, afirma. 

O financiamento imobiliário no banco subiu 5,8% em 2018. 

Para este ano, a Abecip projeta mais um crescimento de 20% do SBPE, a R$ 69 bilhões.

“Essa é uma estimativa diante de um cenário intermediário de incerteza. Não sabemos se as reformas serão aprovadas”, disse Abreu Filho.

Ele se refere especialmente à reforma da Previdência, considerada pelo mercado financeiro passo fundamental para um ajuste fiscal do país. 

A perspectiva de que as contas públicas entrem nos eixos ajudou a derrubar os juros de longo prazo, medida importante para a composição das taxas imobiliárias nos bancos.

Há cerca de seis meses, antes das eleições, contratos com vencimento em 2029, por exemplo, tinham taxas a 12%. Hoje, estão em 9%.

“Vai fazer muita diferença para o mercado o que acontecer com essas taxas. Se as reformas passarem, elas vão cair e o apetite dos bancos e de toda a economia aumentam”, disse o presidente da Abecip.

LANÇAMENTOS

Os dados da associação consideram crédito para a compra de imóveis prontos. Mas o crescimento expressivo de lançamentos voltados para a média e a alta rendas indica que incorporadores já antecipam alta da demanda também nos estandes de vendas.

Lançamentos para essa faixa avançaram 54% nos 12 meses até novembro, último dado da Abrainc (associação das incorporadoras), na comparação com igual período de 2017. Os lançamentos dentro do MCMV subiram menos, 24%, mas ainda são 75% das novas unidades no mercado.

Mirella Parpinelli, diretora da imobiliária Lopes, apontou que o mercado destravou  em outubro, após a eleição.

“O ano começou com os desafios de muitos feriados, Copa, indefinição política. Mas sabíamos que, dependendo do resultado da eleição, o mercado ia reagir. Animou mais do que imaginávamos”, afirmou.

Segundo ela, a imobiliária vendeu 100% mais no último trimestre do ano e dobrou seu faturamento, na comparação com os três meses finais de 2017. “O impulso veio das classes média e alta. Até o terceiro trimestre, o ticket médio do comprador era de R$ 540 mil, mas no três meses seguintes foi para R$ 705 mil”.

A Abecip espera que um bom desempenho da poupança em 2019 estimule ainda mais essa fonte de crédito. O saldo dos recursos aplicados no SBPE atingiu R$ 618,1 bilhões em 2018, segundo a associação, que projeta um crescimento de 11% para 2019.

“Já coloca um compromisso nos bancos, uma pressão para financiar mais em 2019”, disse Abreu Filho.

Para Magalhães, do Itaú, a maior disponibilidade de dinheiro para emprestar é um incentivo. Ela destacou também mudanças que entraram em vigor em janeiro que ajudam a flexibilizar o uso, pelos bancos, de recursos da poupança para financiamento imobiliário.

Além disso, a combinação de inflação e juros baixos, benéfica para o setor, que vigorou ao longo de 2018 deve perdurar.

Foi de olho nisso que o bancário Raphael Messagi, 24, decidiu trocar uma casa da família em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, pelo seu primeiro apartamento próprio —uma unidade de um quarto no Ipiranga (na zona sul da capital paulista), que deve ser entregue em 2020.

“Eu procurei bastante. Esperei para ver a questão das taxas. Com a Selic [taxa básica de juros] baixa, vi que não havia previsão de elas subirem tão cedo e achei que era a hora de comprar”, disse.

O juro médio do financiamento imobiliário chegou a 9,5% ao ano em dezembro, segundo o Banco Central —e pode ser próximo de 8% em grandes bancos, dependendo do cliente.

O bancário Raphael Messagi, 24, que comprou seu primeiro imóvel - Danilo Verpa/Folhapress

A competição aumentou, as taxas caíram. Não vejo perspectiva para cederem mais, mas também não devem subir”, disse Magalhães.

Segundo Abreu Filho, hoje há políticas e preços semelhantes aos melhores momentos do crédito imobiliário no país. “Se não estamos fazendo ainda mais crédito é porque, de fato, estamos esperando o cliente ter mais coragem e ir para o balcão de venda”.

“A volta da confiança do consumidor é fundamental para uma aquisição de longo prazo como um imóvel”, disse Felipe Cunha, diretor de incorporação da Living, braço da Cyrela.

Para isso, o mercado de trabalho precisa avançar. A taxa de desemprego ficou estável em 2018, a 11,6%, mas o país ainda fechou o ano com 12,1 milhões de pessoas sem trabalho.

“Este ano já demonstra um aquecimento muito mais intenso. Mas o volume mais forte [de compra] deve vir a partir do momento em que os índices de desemprego caírem”, disse Emilio Fugazza, diretor financeiro e de relações com investidores da Eztec.

Por parte dos empresários, a cautela é maior. O índice de confiança geral da construção ficou estável em janeiro na comparação com dezembro, mas o segmento de edificações avançou.

“Começamos a ter um pouco de luz. Para este ano, a lei dos distratos ajuda bastante”, disse Milton Bigucci, presidente da MBigucci. O texto regulamentou multa de até 50% do valor já pago pelo consumidor que desistir da compra do imóvel.

Focada na classe média, a incorporadora segurou lançamentos nos últimos anos e investiu R$ 120 milhões em terrenos na capital paulista e região metropolitana para garantir novos empreendimentos por mais de uma década.

Mas, dizem especialistas, a combinação de aumento da demanda, com consequente queda de estoques, e o baixo ritmo de construção nos últimos quatro anos deve elevar o preço dos imóveis, principalmente nas grandes capitais.

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