Embora considere positivo um projeto para desvinculação orçamentária, o economista-chefe para a América Latina do BNP Paribas, José Carlos Faria, afirma que o governo deveria se concentrar primeiro na reforma da Previdência.
"Seria positivo [se o governo conseguisse reduzir a rigidez dos gastos públicos], mas trabalhar com duas reformas complexas e controversas assim é difícil. Acredito que a estratégia mais eficiente seria focar, em um primeiro momento, na Previdência. Essa deveria ser a prioridade", disse Faria a jornalistas nesta terça-feira (12).
O governo pode pensar ainda em outras medidas para melhorar o perfil das contas públicas, como dar continuidade às privatizações e trabalhar na abertura da economia brasileira.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo no domingo (10), o ministro da Economia, Paulo Guedes, se mostrou confiante a respeito da aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da Previdência, que aguarda para começar a ser analisada na Câmara dos Deputados. Mas ele animou o mercado financeiro ao indicar que o governo também enviaria "o mais rápido possível" outra PEC, de desvinculação orçamentária, cuja análise seria iniciada pelo Senado.
"Tivemos uma mudança estrutural nos últimos anos que foi a aprovação do teto sobre os gastos públicos. Há um esforço de governo para reduzir gastos, mas, infelizmente, não há muito espaço para isso porque a maior parte é de despesas obrigatórias, sendo que a Previdência é responsável pela maior fatia. O principal problema estrutural é a Previdência, sem a reforma, fica difícil segurar os gastos", afirmou o economista.
Pela proposta do governo, a economia com as mudanças nas aposentadorias superaria R$ 1 trilhão em dez anos. Guedes disse que alterações no texto são possíveis, mas reforçou que R$ 1 trilhão é o piso para negociação.
O BNP Paribas tem uma estimativa menor: R$ 500 milhões a R$ 600 milhões em dez anos, considerando que o Congresso deve mexer no texto. "Ainda assim, seria um resultado melhor do que o precificado pela última reforma, encaminha por Michel Temer", diz Faria.
Segundo o economista, os pontos que devem ser alvo de mudanças no Congresso incluem o BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos de baixa renda, e a aposentadoria rural. Podem sofrer alterações também a idade mínima para aposentadoria das mulheres —que subiria de 60 para 62 anos— e o período de transição, que seria de até 14 anos, contra 20 anos na reforma de Temer.
O banco espera que a tramitação da PEC seja concluída em outubro.
"Trabalhamos com o cenário de que a aprovação da reforma, mesmo diluída, vai abrir caminho para a economia brasileira acelerar no segundo semestre e ter um crescimento um pouco mais substancial no ano que vem", disse Faria.
O BNP revisou suas projeções para o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil neste ano de um crescimento de 3% para 2%. Além da incerteza fiscal ainda elevada, Faria diz que há problemas tanto no lado do consumo, com o desemprego alto, quanto da recuperação lenta dos investimentos.
Num cenário de recuperação gradual da economia e inflação controlada, o BNP mudou sua projeção de uma alta para a Selic (taxa básica de juros) em 2019 para estabilidade nos 6,5% ao ano. A próxima elevação na taxa, segundo a previsão, ficou para março de 2020.
Em relação à inflação, o banco trabalha com projeções de 3,5% no fim deste ano e 4% no próximo.
Sobre o cenário externo, Faria diz que o tom é cauteloso, com uma desaceleração da economia global em vista, mas o que acaba tendo impacto relativamente favorável para países emergentes como o Brasil.
Segundo Faria, o câmbio por aqui está subvalorizado. Às 12h30 (horário de Brasília), o dólar comercial era cotado a R$ 3,80.
"Se olhamos o balanço de pagamentos, o déficit em conta corrente é muito pequeno. Não precisamos ter um câmbio tão depreciado. Uma vez que os fundamentos ficais sejam corrigidos, a combinação de um cenário internacional favorável e conforto no balanço de pagamentos dele levar à apreciação do real, ainda que possamos ver certa volatilidade lá fora e ruídos ao longo da tramitação da reforma [da Previdência] no Congresso."
A projeção do BNP é de que o dólar termine 2019 cotado a R$ 3,25.
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