Descrição de chapéu Entrevista da 2ª

Atleta deve receber pelo que vale, não porque é homem ou mulher, diz presidente da Adidas

Salário no futebol feminino crescerá quando qualidade subir, segundo Kasper Rorsted

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São Paulo

Atletas homens e mulheres nem sempre devem receber os mesmos salários e premiações, afirma Kasper Rorsted, 57, presidente global da Adidas.

Patrocinadora da Copa do Mundo, a marca de material esportivo decidiu igualar os bônus pagos a jogadores nas versões masculina e feminina, mas, para o executivo, é errado comparar os dois eventos.

Em visita a São Paulo, onde conversou com funcionários no escritório de Barueri e aproveitou para assistir à estreia da seleção masculina na Copa América, Rorsted diz que não se trata de uma discussão sobre gênero, mas sobre o valor de cada produto. 

“A evolução não surge do dia para a noite. Se um dia [a situação das mulheres] vai ser igual à dos homens, não sei, mas não é um objetivo em si”, diz o executivo.

Para Rorsted, deve-se pagar o preço de um produto pelo que ele vale, independentemente de gênero.

“Eu sou dinamarquês, você é brasileiro. Neymar é o melhor jogador brasileiro, ele recebe muito mais do que o melhor jogador dinamarquês”, afirma o presidente.


A Copa do Mundo feminina está acontecendo agora, a Adidas é uma das patrocinadoras. Como vocês têm olhado o mercado de esportes feminino? Parte da estratégia que formulamos em 2015 era que iríamos ampliar o tamanho do negócio de mulheres em relação ao resto da companhia. Futebol é parte 
desse negócio.

Mas nosso olhar é muito mais relevante que isso, é assegurar que jovens meninas continuem no esporte.

A Adidas tomou a posição de pagar bônus de mesmo valor a atletas vencedores da Copa do Mundo masculina e feminina. Como os consumidores têm reagido às ações ligadas ao evento? De modo geral, a Copa do Mundo desta vez está sendo muito mais assistida e há um grande interesse por ela, mas acho errado comparar a versão feminina à masculina. São dois eventos diferentes.

A Copa do Mundo masculina é o maior evento esportivo no mundo.

O que precisamos assegurar é que a Copa feminina seja o maior evento esportivo feminino no mundo, mas não necessariamente temos de compará-los porque não há a mesma quantidade de atletas ativos.

O que anunciamos é que os bônus pagos a jogadores, como para melhor atleta e para artilheiro, teriam o mesmo valor.

Mas, de forma geral, a Copa feminina não está no mesmo nível comercial que a dos homens. Tem sido muito maior que a última edição, e é isso que queremos ver.

E como vê daqui para frente? O que precisa ser feito para reduzir esse desnível entre homens e mulheres? Mas não sei se precisam ter a mesma atenção sempre. Pegue outras áreas, por exemplo, ioga. Há muito mais mulheres interessadas em ioga.

O que temos de fazer é assegurar que, se pegarmos futebol, vamos melhorar a qualidade do futebol jogado todo ano. Se melhorar a qualidade, a atenção vai crescer.

E isso vai se refletir nas ligas, que se tornarão muito mais profissionalizadas e com o tempo os salários também crescerão. A evolução não surge do dia para a noite, eventualmente vai ter mais atenção em relação a isso.

Se um dia [a situação das mulheres] vai ser igual à dos homens, não sei, não é um objetivo em si.

 

O sr. acha então que faz sentido ter essa diferença, quando olhamos para patrocínios individuais? Vou responder de outra forma: você sempre deve pagar o preço do produto pelo que ele vale.

Eu sou dinamarquês, você é brasileiro. Neymar é o melhor jogador brasileiro, ele recebe muito mais do que o melhor jogador dinamarquês.

Então eu não acho que tem a ver com homens e mulheres, mas com o valor do produto. E se você começa a olhar para isso apenas por uma dimensão, da agenda de gênero, acho que não faz sentido. 

Alguns dos nossos atletas mais bem pagos de atletismo são mulheres, porque o seu valor é maior que o de homens.

E acho que eventualmente temos que olhar o produto em si, em vez de se é homem ou mulher, se é brasileiro ou dinamarquês ou alemão. E aí deve se colocar um preço.

Há muita demanda hoje em dia para que essa distância entre homens e mulheres seja menor, para que a remuneração seja parecida. Como companhia, você sente que precisa colocar mais dinheiro em um produto cujo retorno é menor devido a pressão popular? Primeiro, o que devemos fazer como companhia é garantir que [internamente] paguemos homens e mulheres igualmente. Que promovamos mulheres, o que já fazemos —temos 33% de gerentes mulheres hoje, dez pontos percentuais a mais que cinco anos atrás. 

E como disse antes, acho que temos que pagar o preço pelo produto.

A Beyoncé [com quem a marca desenvolverá linhas de calçados e roupas], por exemplo, é uma das nossas contratadas mais bem pagas porque esse é o preço do seu produto. 

Eu acho que ela é incomparável, assim como não se compara o futebol brasileiro ao dinamarquês. Se o produto é mais valioso que o masculino, ela deve receber mais.

Neymar é o jogador brasileiro mais famoso, e está envolvido em uma polêmica, sendo acusado de estupro. Como a Adidas lida com esse tipo de incidente, com personalidades e atletas apoiados? Quando você contrata um indivíduo não há garantia do que ele ou ela faz. 

Acho muito importante, antes de julgar alguém, ter os fatos sobre a mesa, sobre o que fez ou deixou de fazer. E se é um ídolo global há muitas opiniões, muito barulho em volta dele. 

Tentamos garantir que quem contratamos se comporte bem, que tenha bom histórico. Eventualmente se algo ocorre, sobretudo criminalmente, precisamos decidir o que fazer e tomar uma posição. 

Há dois anos, o técnico do time de tênis romeno [Ilie] Nastase fez alguns comentários muito duros sobre mulheres e nós encerramos o contrato. Então precisamos olhar casos individualmente.

Kasper Rorsted, presidente global da Adidas
Kasper Rorsted, presidente global da Adidas - Patricia Stavis/Folhapress

Como estão os negócios na América Latina e Brasil? Decidimos estar aqui porque é uma fatia enorme de mercado. E quando olhamos futebol, alguns dos melhores jogadores vêm daqui. 

A questão é, temos que administrar uma companhia que em alguns anos sobe, noutros desce. 

Temos visto na América Latina alguns países que sofreram com a crise política, seja Brasil ou Argentina; temos desaceleração da economia do Peru e do Chile; tem a Venezuela. Mas isso não nos desencoraja a fazer negócios.

Ainda estamos muito otimistas a longo prazo na América Latina, mas nunca achamos que vai ser tão estável como na Europa. A diferença é que aqui você pode crescer 10%, 15%.

E as expectativas para os próximos anos? Se me perguntar —claro, não vivo no Brasil— nossa esperança é que passada a eleição tenhamos uma estabilização do sistema político, porque é um mercado enorme, é um país de criação futebolística, então esperamos ter mais estabilidade política e econômica. 

Ainda há muita oportunidade no Brasil. A América Latina representa uma oportunidade enorme e o Brasil está no coração disso. 

O que fazemos no mercado brasileiro tem impacto no resto da companhia.

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