Ambulantes de Copacabana são atingidos pelo estado de emergência devido ao coronavírus

Trabalhadores informais do Rio de Janeiro sofrem com falta de movimento

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Rio de Janeiro

Os vendedores da praia de Copacabana são um exemplo da fragilidade do trabalho informal frente a quarentenas e decretos que tiram as pessoas das ruas. A maioria trabalha para si mesmo, sem patrão, sem vínculo ou sem empresa aberta. Eles costumam ter, no máximo, uma conta no banco para receber o que vendem com suas maquininhas de cartão. Alguns nem isso.

É o caso do alagoano José Cícero Lima da Silva, 47, que há 30 anos vende queijo na brasa em praias do país. Por 16 anos o fez em Maceió; nos últimos 14, no Rio de Janeiro. Ele não conseguiu adquirir um aparelho porque não votou nas últimas três eleições. “Aí, cancelaram meu CPF, e não consegui alugar nem comprar uma maquininha”, contou, nesta terça (17).

Ele vende até cem unidades de queijo coalho (um a R$ 6, dois por R$ 10) num dia ótimo. Mas isso pode cair a zero quando chove. Com o lucro diário variando entre R$ 80 e R$ 200, o alagoano sustenta seis pessoas em sua casa no morro do Pavão-Pavãozinho: ele, sua mulher e quatro filhos.

Apesar de aceitar só dinheiro (o que atrapalha as vendas), Cícero foi o único dos entrevistados que afirmou ter uma reserva caso não possa mais andar pelas praias com seu braseiro e isopor. “Acho que a gente consegue sobreviver uns quatro meses”, arriscou.

Já o casal Luís Francisco, 54, e Luzinete da Silva, 40, de João Pessoa, Paraíba, que oferece diversos tipos de bolas (entre R$ 15 e R$ 40) e bronzeadores (de R$ 5 a R$ 40), conta que não tem absolutamente nada. “Não temos dinheiro para segurar nem um pouquinho. Estamos vendendo no almoço para pagar o jantar”, diz ele.

Juntos, eles conseguem levar para casa, em Belford Roxo, município da região metropolitana do Rio, até dois salários mínimos por mês. “Isso se fizer sol o mês todo”, alerta Luzinete. Eles têm ainda um casal de filhos, mas ambos já saíram de casa para formar novas famílias.

Morador de Bonsucesso, na zona norte, Romário de Souza Gomes, 57, é um raro trabalhador informal que paga INSS, apesar “de estar em atraso”. Paga porque, antes de começar a vender nas ruas, ele teve diversos empregos, como cobrador de ônibus e funcionário de transportadora. “Preciso ver como está minha aposentadoria”, conta ele, que vende chapéus, viseiras e baldinhos para as crianças.

A renda dele sustenta a mulher, a sogra e o filho. Com 30 anos na areia, recorda com saudades da “época em que havia só cinco produtos na praia: cerveja de garrafa, isso faz tempo mesmo..., camarão, mate biscoito e queijo”. E reclama que hoje tem muita gente vendendo. Para burlar a lotação, Romário achou outro nicho: “Também vendo em engarrafamento. Mas lá é pipoca, amendoim e biscoito.”

Atrás de seu Ray-Ban escuro e falsificado, José Vieira da Costa, 59, veio de São Paulo desempregado e há cinco anos oferece aos banhistas batata frita (R$ 6), picolé Moleka (a partir de R$ 3) e o lendário biscoito Globo (R$ 5). Ex-copeiro, ex-balconista de boteco, ex-recolhedor de apostas do bicho, ele diz conseguir “uns R$ 3.000 por mês”.

Com isso, paga aluguel de R$ 700 na comunidade Ladeira dos Tabajaras e envia mais R$ 500 para a família em São Paulo. Para chegar lá, fatura “até R$ 500 num dia bom”. Mas os dias estão ficando piores. “Ontem vendi R$ 200 e poucos. Hoje, só uns R$ 100”.

Questionado sobre suas reservas caso a clientela suma da praia, José é obrigado a recorrer aos céus: “A vida do homem, só quem proverá é Deus”. Pode até ser, mas Ele não costuma inteirar as contas no fim do mês. ​

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