Piketty diz que política econômica pouco ousada da esquerda favorece governo autoritário de direita

Em debate com brasileiros, economista citou Bolsonaro ou Trump com exemplos

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São Paulo

O economista francês Thomas Piketty afirmou que o Brasil precisa avançar em reformas para reduzir as desigualdades e que a decisão de partidos de esquerda de serem menos ousados nessas questões favorecem o discurso de governantes de direita autoritária, como os presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro.

“Esse comedimento em colocar essa agenda contribuiu para abrir caminho para narrativas de direita autoritária”, afirmou. "Há no mundo atual um discurso do tipo Bolsonaro ou Trump, do tipo autoritário e até xenófobo às vezes, que infelizmente tem certa força.”

Em entrevista gravada e apresentada em evento que marcou a conclusão da celebração dos 100 anos da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), nesta quarta-feira (9), o economista disse que os governos do PT melhoraram a situação dos 50% mais pobres no Brasil, por meio de políticas transferências de renda, por exemplo.

“Entretanto, a redução da pobreza e a melhora relativa da situação dos 50% mais pobres foi insuficiente. Em parte, ela aconteceu, não em detrimento dos 10% ou 1% mais ricos, mas sim dos 40% do meio, que não são nem os 50% mais pobres, nem os 10% mais ricos”, afirmou.

“Isso, sem dúvida, se deve à falta de reformas estruturais do sistema fiscal, do sistema de propriedade, de tributação de sucessões, de redistribuição da propriedade. Em parte, porque era e continua limitada a capacidade do Estado, no Brasil, de dirigir essas reformas e talvez, mais ainda, por causa das regras eleitorais e institucionais do sistema brasileiro.”

Em entrevista à Folha em julho deste ano, quando foi lançado no Brasil o seu livro “Capital e Ideologia”, Piketty já havia afirmado que a falta dessas reformas estruturais acabou contribuindo para a decepção da sociedade com o PT e criticado o sistema político nacional por conta da dificuldade em se obter maioria no Legislativo.

Nesta quarta-feira, disse que em outros países o governo pode conduzir suas políticas “sem precisar compor uma coalização complexa que é uma porta aberta para mecanismos de trocas de votos e de corrupção”. Ele citou exemplos de políticas de direitos de propriedade e de voto de trabalhadores em empresas na Suécia e Alemanha.

Piketty disse ainda que a volta dos democratas ao poder nos EUA pode ser positiva para futuros governos de esquerda no Brasil, embora o nome do presidente eleito Joe Biden não fosse o seu candidato ideal ao cargo.

“Biden e determinados tipos de governo na Europa podem ajudar a desenvolver soluções igualitárias, de redução das desigualdades, com mais cooperação internacional, que são mais difíceis de acontecer com Trump no poder ou governos conservadores na Europa”, afirmou.

O evento foi organizado pelo CEA/UFRRJ (Centro de Estudos Avançados da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro) e pelo CBAE/UFRJ (Colégio Brasileiro de Altos Estudos da Universidade Federal do Rio de Janeiro).

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