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Wall Street antecipa boom na economia com disparada nos lucros

Bancos liberam grandes quantias que foram retidas como proteção durante a pandemia

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The New York Times

O clima em Wall Street é claramente de entusiasmo.

Um ano atrás, quando o coronavírus estava varrendo os Estados Unidos, os maiores bancos do país previam uma devastação econômica. Reservaram bilhões de dólares como proteção contra os imensos prejuízos que poderiam surgir, com as perdas recorde de emprego, edifícios de escritórios que se esvaziavam e com o fechamento de grande número de pequenas empresas.

O Touro de Wall Street, em Manhattan, na cidade de Nova York (EUA) - Carlo Allegri - 16.jan.19/Reuters

A história é completamente diferente hoje. Na quarta-feira (14), executivos dos bancos Goldman Sachs, JPMorgan Chase e Wells Fargo fizeram projeções econômicas otimistas. Disseram que os consumidores —cujas carteiras engordaram com o dinheiro recebido como parte dos programas de estímulo— estavam ansiosos para gastar, e que as companhias estão correndo para se expandir ou para adquirir novos negócios, agora que os Estados Unidos estão emergindo da pandemia da Covid-19.

“Está claro para mim que os Estados Unidos estão posicionados para uma forte recuperação este ano, puxados pelo consumo que está voltando aos níveis anteriores à Covid”, disse David Solomon, presidente-executivo do Goldman Sachs, a analistas, em uma conversa telefônica. “Esse sentimento vem sendo refletido pelos mercados de capitais”.

Jamie Dimon, presidente-executivo do JPMorgan Chase, o maior banco dos Estados Unidos pelo critério de ativos, expressou posição semelhante.

“Acreditamos que a economia tenha o potencial de registrar um crescimento extremamente robusto, por diversos anos”, afirmou Dimon em comunicado.

Ele atribuiu essa perspectiva aos gastos do governo com pacotes de estímulo e infraestrutura, às políticas positivas do Fed, o banco central dos Estados Unidos, e à forte esperança de que a pandemia esteja chegando ao fim.

Tudo isso é um bom sinal para os bancos, que começaram a anunciar seus resultados trimestrais esta semana.

Na quarta-feira, o Goldman Sachs e o JPMorgan Chase anunciaram lucros cerca de cinco vezes mais altos que os registrados no primeiro trimestre de 2020, graças a uma combinação de resultados de negócios fortes e da redução nas quantias que eles vinham mantendo como reservas para cobrir possíveis prejuízos com empréstimos.

O Wells Fargo anunciou lucros 700% mais altos do que os do período em 2020.

Mike Novogratz, operador veterano que dirige uma companhia financeira cuja especialidade são as criptomoedas, classificou os resultados dos bancos como “uma prova” do que acontece quando existe tanto dinheiro disponível para investir “quanto temos agora dentro do sistema”.

Ele previu uma recuperação iminente nas viagens, no entretenimento, na vida social e no investimento, e disse que a situação criada se pareceria com a do grande desenvolvimento que os Estados Unidos registraram na década de 1920.

Ele disse que os investidores precisavam agradecer o chairman do Fed, Jerome Powell, por ter tomado medidas de sustentação da economia, como a aquisição de ativos financeiros, e por ter mantido baixas as taxas de juros.

Há sinais de cautela suficientes para temperar o otimismo de Wall Street. O número de contágios e de internações hospitalares continua a subir em algumas áreas do país, enquanto a campanha de vacinação ganha impulso.

A recente decisão de suspender o uso da vacina em dose única fornecida pela Johnson & Johnson —uma das três vacinas aprovadas para uso nos Estados Unidos— e a relutância de até um quarto dos americanos quanto a serem inoculados podem retardar o avanço do país na direção da imunidade de rebanho. E as tendências que beneficiam os grandes bancos ainda não chegaram às empresas comuns, muitas das quais continuam a enfrentar dificuldades.

Além disso, a recuperação deve ter desequilíbrios, e as pessoas que já enfrentavam dificuldades antes da pandemia sofrerão mais do que aquelas que mantiveram empregos firmes.

Mas para os bancos que anunciaram resultados na quarta-feira, as indicações tendem a apontar claramente na direção de uma melhora.

Os resultados dos bancos no mais recente trimestre revelam “uma virada dramática de uma queda sem precedentes no crescimento ao longo da Covid-19 para uma dramática alta em V com relação ao que está acontecendo na economia mais ampla”, disse Stephen Scherr, vice-presidente financeiro do Goldman Sachs.

As expectativas quanto a essa recuperação foram refletidas pelas decisões dos três bancos quanto a reduzir as reservas que constituíram-no começo da pandemia para enfrentar prejuízos continuados em hipotecas e empréstimos, e nos pagamentos de cartões de crédito.

O JPMorgan liberou US$ 5,2 bilhões de sua reserva de crédito, e o Wells Fargo reduziu a sua em US$ 1,6 bilhão.

O Wells Fargo também ressaltou que os empréstimos formalmente contabilizados como prejuízo mostravam um recorde histórico de queda. O Goldman Sachs, que tem operações muito menores junto aos consumidores, também reduziu suas reservas, em cerca de US$ 200 milhões.

A força no investimento nos empréstimos e nas operações de mercado dos bancos intensificou a euforia.

Os três anunciaram receitas robustas em diversas linhas de negócios, propelidas por uma combinação de mercados ativos e em alta, uma onda de atividades novas no segmento de hipotecas, e um boom nas companhias de aquisição de propósitos específicos (SPAC, na sigla em inglês). As atividades de fusão e aquisição no setor empresarial também foram caracterizadas por um recorde de valor.

O Goldman Sachs —o banco dominante na assessoria a empresas e nos mercados— reportou que sua receita dobrou de US$ 8,7 bilhões para US$ 17,7 bilhões, graças a crescimentos de dois dígitos em ganhos de suas operações de investimento, administração de patrimônio e mercados.

O JPMorgan Chase reportou uma alta de receita de 14%, de US$ 29 bilhões para US$ 33 bilhões, puxada tanto pelos mercados quanto pelo seu banco de investimento.

O Wells Fargo elevou sua receita em 2%, ajudado em parte por uma alta de 19% nos empréstimos para aquisição de moradias, agora que muitos americanos optaram por deixar os centros das cidades e viver em subúrbios ou áreas rurais. Os resultados “refletem a melhora na economia dos Estados Unidos”, mas as taxas de juros baixas e a demanda fraca por empréstimos foram “fatores adversos”, disse Charles Scharf, o presidente-executivo do banco.

Os bancos foram grandes beneficiários – ainda que involuntariamente – dos gastos do governo nos últimos 12 meses para buscar atenuar o choque dos fechamentos causados pelo vírus na economia e impedir que esta entrasse em queda livre.

Há pouco mais de um ano, o Fed reduziu as taxas de juros a quase zero e reiniciou seus programas de aquisição de títulos. Na prática, ele injetou trilhões de dólares de dinheiro novo nos mercados financeiros, o que ajudou a estimular a atividade nos segmentos de hipotecas, títulos empresariais e fusões e aquisições.

De lá para cá, os mercados de ações registraram alta de mais de 80%, em meio a um boom de transações que chegou a um pico este ano. Os dois fatores ajudaram os bancos, que operam unidades que vendem e compram ações em nome de clientes.

As operações de ações do Goldman Sachs registraram US$ 3,7 bilhões em receita no primeiro trimestre, 68% de alta ante o período no ano passado. As operações do JPMorgan nas bolsas de valores tiveram receita de US$ 3,3 bilhões, com alta de 47% ante o período em 2020.

Com relação ao futuro, diversos bancos destacaram o impacto das recentes injeções de dinheiro dos pacotes de estímulo nas contas dosa consumidores —um componente dos cerca de US$ 5 trilhões que o governo federal americano dedicou a combater a crise nos últimos 12 meses.

O influxo de dólares federais ajudou a colocar as finanças domiciliares dos Estados Unidos em situação mais firme em diversos anos, disseram financistas, que acrescentaram ter visto crescentes indicações de que os consumidores estavam ansiosos para colocar esse dinheiro em uso.

“Estamos vendo gastos ampliados dos consumidores em viagens e em restaurantes, duas categorias que estavam especialmente restritas desde que surgiu a Covid-19”, disse Scharf, do Wells Fargo, em conversa com analistas, destacando que na semana encerrada em 2 de abril as despesas relacionadas a viagens pagas com cartões de débito mostravam alta de 422% ante o mesmo período em 2020.

O JPMorgan Chase também apontou para crescimento fortes nos gastos com viagens e entretenimento, os quais subiram em 50% em março com relação a fevereiro.

“Não há questão de que existe demanda reprimida significativa entre os consumidores”, disse Solomon, do Goldman Sachs, em conversa com analistas.

Ainda assim, muitas das pequenas empresas que foram mantidas à tona por meio da assistência federal —que distribuiu cerca de US$ 1 trilhão nos últimos 12 meses, em boa parte por meio de empréstimos cujos pagamentos devem ser dispensados— ainda não estão compartilhando dessa riqueza, e o principal apoio do governo às pequenas empresas, o Programa de Proteção a Folhas Salariais, está próximo de seu encerramento.

Cerca de 13% dos proprietários de pequenas empresas pesquisados no mês passado pela Federação Nacional de Empresas Independentes dos Estados Unidos disseram que teriam de fechar as portas permanentemente se as condições não melhorarem nos próximos seis meses.

“A recuperação geral continua a exibir desequilíbrios, nos setores que concentram pequenas empresas”, disse Holly Wade, diretora executiva do centro de pesquisa da federação.

Traduzido originamento do inglês por Paulo Migliacci

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