Bolsonaro tenta enterrar marca petista com MP do novo Bolsa Família e PEC dos precatórios

Texto do Auxílio Brasil traz formato do programa, objetivos e diretrizes, mas sem estabelecer valores nem explicitar recursos

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) apresentou nesta segunda-feira (9) o substituto do Bolsa Família. A MP (medida provisória) do Auxílio Brasil, com as regras do programa, tenta pôr fim a uma marca do PT.

Para abrir caminho para o programa driblando o teto de gastos, o governo também entregou ao Congresso uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para parcelar dívidas da União reconhecidas pela Justiça (os precatórios) previstas para 2022.

O texto estabelece que esses valores serão corrigidos apenas pela Selic, enquanto hoje há possibilidade de correção também pela inflação acrescida de juros.

Jair Bolsonaro durante cerimônia de posse de Ciro Nogueira como ministro da Casa Civil - Evaristo Sá - 4.ago.21/AFP

Voltado às eleições de 2022, Bolsonaro reformulou o programa de transferência de renda e promete aumentar o valor médio dos benefícios em pelo menos 50% (para R$ 283,50).

Em média, são transferidos hoje R$ 189 por mês no Bolsa Família. O aumento não alcançaria a promessa anterior do presidente de elevar o valor para ao menos R$ 300.

O texto da MP foi entregue pessoalmente por Bolsonaro ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

O presidente da República foi acompanhado pelos ministros Flávia Arruda (Secretaria de Governo), Ciro Nogueira (Casa Civil), Paulo Guedes (Economia), João Roma (Cidadania), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral), e general Augusto Heleno (Gabinete Segurança Institucional).

A ampliação dos gastos na área social faz parte de uma estratégia do governo de tentar interromper a queda de popularidade de Bolsonaro e ampliar as chances de reeleição do presidente.

O novo programa, pelos planos do Palácio do Planalto, deve começar a ser executado em novembro, logo após a última parcela do auxílio emergencial.

No entanto, o governo ainda não conseguiu garantir uma forte ampliação da verba para o Auxílio Brasil a partir de 2022. Para isso, precisará ajustar contas na elaboração do Orçamento do próximo ano.

Lançado em meio às incertezas que rondam as contas de 2022, o texto chega a condicionar parte do programa à real existência de recursos. Em certo trecho, explicita que o número de benefícios e beneficiários dependerá da verba disponível.

O teto de gastos tem apenas R$ 30 bilhões de espaço, segundo contas mencionadas pelo Tesouro.

Com aperto, isso seria suficiente para um pagamento médio de R$ 300 para cerca de 17 milhões de famílias, embora ainda haja outras despesas a serem colocadas nesse espaço (como um reajuste para servidores).

A classe política pressiona por um pagamento maior no Auxílio Brasil e chega a citar nos bastidores um valor de R$ 400.

Hoje, a principal aposta para dar espaço ao programa é a PEC que adia o pagamento dos precatórios. Apesar disso, com a PEC pendente de aprovação, a MP do Auxílio Brasil estabelece o formato do programa, seus objetivos e diretrizes, mas sem valores ou detalhes sobre as fontes orçamentárias.

O valor médio da transferência de renda e o número de famílias beneficiárias serão definidos apenas em setembro, segundo o governo, pois dependem do dinheiro liberado para o novo programa

"Sabemos que a pandemia trouxe uma inflação para os alimentos para o mundo todo. Então não podemos deixar desassistidos os mais vulneráveis", afirmou Bolsonaro. "Já [está] decidido por nós uma proposta mínima de 50% para o Bolsa Família, que agora chama-se Auxílio Brasil aqui", disse.

As propostas do governo foram entregues em reunião com o presidente da Câmara, um dos principais aliados de Bolsonaro. Lira falou que a pandemia deixou os vulneráveis mais expostos à inflação e citou preocupação ao mencionar a PEC dos precatórios.

"Uma PEC que visa a um ordenamento de uma questão que nos preocupa muito, essa questão dos precatórios, para que não tenhamos nenhum tipo de narrativa a prejudicar a imagem do Brasil e do ordenamento das contas públicas", disse Lira.

O presidente da Câmara quer tentar aprovar as duas propostas em menos de um mês.

"Essa matéria tem urgência, como também a PEC dos precatórios, que tem que ser apreciada antes do envio da proposta do Orçamento [no fim de agosto], para que haja previsibilidade e uma perenidade nas ações do Executivo para 2022", afirmou Lira.

Uma MP entra em vigor imediatamente, mas precisa do aval do Congresso em 120 dias para não perder a validade. Uma PEC, porém, tem rito longo na Câmara e no Senado, além de depender do apoio de 60% de cada Casa.

"Vamos tentar. Se o Congresso nos ajudar, priorizar essas pautas, é possível", afirmou o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

João Roma, ministro da Cidadania, pasta que comanda o Bolsa Família, disse que a reformulação do programa permitirá aumentar o número de beneficiários dos atuais 14,6 milhões para mais de 16 milhões.

Até semana passada, técnicos do governo diziam que o objetivo era chegar a uma cobertura próxima de 17 milhões de famílias no novo programa social.

Roma lembrou que isso depende do tamanho do Orçamento do programa, que, segundo ele, será contabilizado dentro do teto de gastos —regra que limita o crescimento das despesas públicas acima da inflação.

O programa manterá as premissas do antecessor ao atender famílias em situação de extrema pobreza (renda mensal de até R$ 89 por pessoa, segundo o padrão atual do governo) e pobreza (entre R$ 89 e R$ 178). Isso não é corrigido desde 2018.

Os ministérios chegaram a traçar cenários para elevar esses patamares, por exemplo, para R$ 100, no caso de extrema pobreza, e R$ 200, para a linha de pobreza. Com isso, mais famílias poderiam pedir para entrar no programa de transferência de renda.

No entanto, por causa das indefinições orçamentárias, esse reajuste seguirá em discussão, segundo técnicos do governo.

Guedes afirmou que a MP do Auxílio Brasil e a PEC dos precatórios são decisivos para o futuro do Brasil.

"A PEC dos precatórios cria a previsibilidade dos gastos. Os Poderes são independentes, porém a capacidade de pagamento e a pressão que isso exerce sobre o governo precisa ser disciplinada", disse o ministro da Economia.

Mais cedo, o ministro da Economia afirmou ainda que a PEC teria um mecanismo que destina valores obtidos com privatizações de estatais para os mais pobres.

Conforme fora explicado por membros da equipe econômica nos últimos dias, a proposta instituiria um fundo alimentado com recursos da privatização de estatais e da venda de ativos.

Dos recursos que chegassem ao fundo, 60% seriam destinados ao abatimento da dívida pública. O restante da divisão iria de 20% para pagamento de precatórios e 20% para a área social.

"Ele [Bolsonaro] vai começar a transferir o que é do povo para o povo. Os recursos com dividendos sociais, com os desinvestimentos, de forma que aconteça transferência não só de renda mas transferência de riqueza para os mais frágeis", disse Guedes nesta segunda.

Na PEC, porém, o governo não incluiu os repasses sociais. Segundo fontes da equipe econômica, a ideia ainda está de pé, mas o objetivo é dar protagonismo ao Congresso. Portanto, o dispositivo deve ser incluído no texto por parlamentar da base aliada.

Segundo Roma, da Cidadania, o desenho elaborado vai respeita as regras fiscais. "Isso deverá ser alcançado dentro do teto de gastos", disse ele, que atrelou a definição do valor à versão final da PEC dos precatórios, o que deve acontecer também até setembro.

Presidente Jair Bolsonaro participa de cerimônia de posse do republicano João Roma como novo ministro da Cidadania
Presidente Jair Bolsonaro participa de cerimônia de posse do republicano João Roma como novo ministro da Cidadania - Raul Spinassé/Folhapress
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