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Recuperada, incorporadora Viver muda de rumo e mira obras paradas

Empresa vai se concentrar em empreendimentos para a classe média paulistana e lançou negócio para recuperar construções

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São Paulo

Cinco anos depois de pedir recuperação judicial, a incorporadora Viver encerrou o processo no dia 2 de agosto.

Em fato relevante publicado na data, afirmou que 98% das dívidas já haviam sido quitadas, e que a recuperação cumpriu os objetivos de preservar a continuidade das atividades do grupo e os interesses e direitos de clientes, colaboradores e acionistas, além de proteger a situação financeira da empresa.

“A companhia entende que este é o momento de crescer e se fortalecer visando uma estrutura cada vez mais sólida, retomando os lançamentos imobiliários cautelosamente”, afirma o documento.

O diretor-executivo da empresa, Ricardo Piccinini, que assumiu o cargo durante o período de recuperação judicial, no início de 2019, disse antes da resolução sobre o término da recuperação judicial que a Viver planejava ter lançamentos ainda neste ano, e iria se concentrar em empreendimentos para o público de renda média na cidade de São Paulo, em bairros como Santana, Vila Mariana e Butantã.

"Por questão de guidance de mercado não podemos abrir detalhes de projetos futuros, mas podemos reforçar que a companhia está trabalhando para retomar em breve com um robusto planejamento e pipeline de lançamentos de novos empreendimentos em São Paulo", afirmou na última semana.

A estratégia da empresa para o pós-recuperação é bem diferente daquela que a levou a esse processo. A Viver, que até 2011 se chamava Inpar (veja linha do tempo abaixo), abriu seu capital em 2007, e expandiu a atuação pelo Brasil.

“A Viver fez mudança estratégica depois do IPO, saiu do alto padrão nos Jardins para fazer econômico de Porto Alegre ao Pará, o que se mostrou pouco rentável e culminou na recuperação judicial”, afirma Arthur Ruperes Marin, vice-presidente de operações da incorporadora, que também está na empresa desde 2019.

Como explica João da Rocha Lima, coordenador do Núcleo de Real Estate da Escola Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), a expansão geográfica pelo país foi um caminho traçado por muitas incorporadoras que abriram capital nessa época —e não foram poucas que tiveram problemas com isso.

“Nós tivemos um grande volume de IPOs em 2005, 2006, e, ao meu ver, as empresas foram todas super avaliadas. Elas acessaram volumes impressionantes de capital relativamente à sua capacidade de gestão”, diz.

Quatro torres à beira mar
Torres do Beira Mar Condomínio Clube, obra da Viver em Paulista (PE) que está sendo recuperada pela Solv - Divulgação

Da noite para o dia, essas incorporadoras passaram a ter muito mais recursos financeiros, mas também a obrigação de investi-los. “Do meu ponto de vista, elas adotaram estratégias muito inadequadas, especialmente de se espalhar pelo Brasil”, diz Lima. “Todas perderam muito dinheiro, algumas conseguiram se sustentar, mas outras quebraram ou estão em situação quase que insolvente até hoje.”

A atuação em novas regiões exige uma adaptação grande da empresa, já que costumes, exigências e a capacidade de pagamento dos consumidores mudam. “Cada praça é uma praça, você tem que conhecer gostos, usos e costumes, tem que ter arquiteto local, além da parte burocrática, cada prefeitura é uma aprovação, tem que ter conhecimento dos trâmites”, explica Alberto Ajzental, professor e coordenador do curso de Negócios Imobiliários da FGV. “A estratégia de expansão precisa ser muito bem pensada.”

A mudança de padrão das construções também é uma decisão arriscada, afirma Ajzental. “É mais difícil ir de produto para classe média ou luxo para popular do que o inverso, porque você tem que saber fazer barato”, diz.

Segundo Piccinini, entrar em recuperação judicial apenas para resolver os problemas financeiros não seria uma boa escolha, por isso foi pensada uma mudança na atuação da companhia. “Encarar a recuperação só para reestruturar dívida não dá em nada, tem que ter um novo plano de negócio”, diz.

Ele e Marinse conheceram em outra incorporadora que está em recuperação judicial, a PDG. Na experiência anterior, já tiveram que lidar com obras paradas e trabalhar em planos para recuperar o negócio.

Esse conhecimento foi levado para a Viver, e deu origem a mais uma empresa, a Solv, especializada em recuperação de ativos imobiliários residenciais estressados, ou seja, prédios com obras paradas.

Marin conta que quando eles assumiram a Viver, havia muitas obras paradas, porque a empresa deixou de ter crédito disponível. Viram ali uma oportunidade de começar um novo negócio. “Olhando pelo copo meio cheio, a Viver serviu de laboratório, construímos uma solução, e podemos ajudar quem tem esse problema”, afirma. Além da parte de construção civil, a retomada das obras envolve lidar com processos judiciais e credores, e vender os apartamentos.

A Solv atuou na resolução de obras da Viver e também recupera empreendimentos de outras empresas, como um negócio separado.

A empresa está recuperando obras em Recife e Goiânia, e agora vai trabalhar em empreendimentos parados em São Paulo e Santo André, no Grande ABC.

Diferentemente da nova fase da Viver, a Solv tem atuação nacional, mas restrita a regiões com mais de 1,5 milhão de habitantes. A preferência é por obras residenciais ou que possam ser convertidas em residências, e que estejam com pelo menos 40% de conclusão.

Segundo Piccinini e Marin, que também são fundadores da Solv, a empresa pretende trabalhar com cinco ou seis obras por ano.

O diretor-executivo diz que o pedido de encerramento da recuperação judicial animou investidores. As ações da Viver tiveram um pico após o pedido de término da recuperação judicial, feito em meados de junho. O valor das ações da companhia, que estava em R$ 2,62, chegou a R$ 9,81.

Os caminhos da incorporadora

1992
A incorporadora Inpar é fundada pelo empresário Alcides Parizotto, que 30 anos antes havia criado a rede Atacadão

2007
A Inpar realiza abertura de capital, com captação de R$ 756 milhões

2008
O fundo imobiliário americano Paladin se torna o principal acionista da incorporadora

2011
A Inpar muda de nome para Viver

2016
Em setembro, com cerca de R$ 1 bilhão em dívidas, a Viver pede recuperação judicial

2020
É criada a Solv, negócio da incorporadora focado na recuperação de obras habitacionais paradas

2021
Em 2 de agosto, a incorporadora comunica o mercado sobre o encerramento da recuperação judicial, tendo pago 98% das dívidas aos credores

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