Descrição de chapéu The New York Times

Sem Ikea nem Levis: varejistas ocidentais deixam a Rússia

Sanções ocidentais fazem marcas optarem por interromper operações no país

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Sapna Maheshwari Vanessa Friedman
The New York Times

Na segunda-feira (7), o diretor financeiro da Stanley Black & Decker disse a investidores que a empresa ainda está decidindo se manterá seus negócios na Rússia devido às novas sanções que afetam o país, ou sairá nas próximas semanas ou meses.

"É algo que estamos observando de perto para ver como se desenrola", disse Don Allan, diretor financeiro da empresa, em uma conferência. A companhia tem cerca de cem funcionários e gerou uma receita anual de US$ 150 milhões, disse ele, com um estoque estimado de US$ 30 milhões a US$ 40 milhões.

Menos de 24 horas depois, a empresa disse que decidiu fechar.

Homem passa em frente a loja da Gucci em Moscou - AFP

Um número cada vez maior de marcas e varejistas americanos e europeus está modificando suas operações na Rússia em resposta à invasão da Ucrânia pelo país, com grandes redes e marcas de luxo fechando lojas e suspendendo outros negócios. As medidas afetam centenas de lojas e milhares de empregados russos.

Na semana passada, Apple, H&M Group, Nike, Ikea, LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton, Hermès e Chanel disseram que fecharão temporariamente suas lojas na Rússia. Nesta semana, a Levi Strauss & Co. e a Adidas disseram que também estão interrompendo as vendas no país. Na terça, as lanchonetes McDonald's e Starbucks disseram que fecharão temporariamente suas centenas de lojas na Rússia.

Os varejistas estão preocupados com os danos à sua reputação por fazer negócios na Rússia, mas também reagem aos desafios práticos impostos pelas sanções e pelo rápido declínio no valor do rublo russo, disse Tahlia Townsend, sócia e copresidente do grupo internacional de compliance comercial da Wiggin & Dana.

"As sanções aos bancos, em particular, tornaram muito difícil levar dinheiro para a Rússia para pagar funcionários ou serviços públicos, proprietários, fornecedores", disse ela. "Não é fácil obter dinheiro de volta da Rússia, portanto, mesmo que possam ser pagos por seus produtos, eles podem não conseguir consolidar essa receita de volta nos Estados Unidos ou em qualquer outro lugar em que estejam sediados."

A maioria dos grandes varejistas disse que continuará pagando funcionários na Rússia. Alguns, como a Levi's, especificaram que pagariam os funcionários em moeda local. Não está claro como esses planos podem ser afetados se a crise continuar por meses e as empresas esgotarem seus fundos no país.

Os varejistas não estão apenas interrompendo as vendas, importações e exportações. A Ikea, com 15 mil funcionários na Rússia e sua aliada, a Belarus, interrompeu a produção de móveis de madeira. A TJX, proprietária da T.J. Maxx e Marshalls, disse que venderá sua participação de 25% na Familia, varejista com mais de 400 lojas na Rússia, que adquiriu por US$ 225 milhões em 2019. O valor contábil de seu investimento na Familia caiu para US$ 186 milhões a partir de 29 de janeiro, com base na avaliação de rublos russos para dólares americanos, segundo seus registros. A Adidas também suspendeu sua parceria com a União Russa de Futebol.

O fechamento de empresas ocidentais e a incapacidade de comprar bens simples, como jeans de fabricação americana ou móveis de fabricação sueca, podem disparar alarmes para os russos, que enfrentam um estado digital fechado sob o governo do presidente Vladimir Putin, de acordo com Anna Nagurney, professora na Escola de Administração Isenberg da Universidade de Massachusetts.

"É uma maneira de dizer às pessoas que algo está muito errado", disse ela. "Você começa a se perguntar o que está acontecendo, o que está acontecendo? Pode imaginar isso, você vai a uma loja ou outra e não consegue realizar transações. Isso vai criar uma grande ansiedade e incerteza."

Ainda assim, outros acadêmicos afirmam que as paralisações de varejistas americanos e europeus podem alimentar a narrativa de Putin sobre os países ocidentais.

"É completamente coerente com o que Putin diz a eles", disse Tymofiy Mylovanov, presidente da Escola de Economia de Kiev. "Está enviando a mensagem de que o Ocidente é mau."

As medidas tomadas por marcas de luxo foram observadas de perto, especialmente após uma reportagem da Bloomberg News em 2 de março de que russos ricos estavam correndo para comprar joias e relógios para tentar preservar o valor de suas economias. O CEO da Bulgari disse à agência de notícias que as vendas nas lojas russas aumentaram nos dias anteriores e que a invasão da Ucrânia, que começou em 24 de fevereiro, "provavelmente impulsionou os negócios". Ele acrescentou que a marca estava lá "para o povo russo, e não para o mundo político".

A Bulgari é propriedade da LVMH, que teria fechado suas cerca de 120 lojas na Rússia a partir de domingo. As marcas Prada e Kering também disseram que fechariam temporariamente as lojas.

Ainda assim, elas foram criticadas nas redes sociais pelo que alguns viram como uma reação morna. Várias pessoas criticaram a Hermès por seu post de fechamento de loja no LinkedIn, dizendo que a marca estava "profundamente preocupada com a situação na Europa neste momento". Elas disseram que a Hermès deveria ter se referido diretamente à guerra e citado a Ucrânia na publicação.

Townsend disse que as marcas de luxo também podem ficar nervosas por vender na Rússia porque cada vez mais pessoas ricas do país estão submetidas a sanções.

"Normalmente, quando você entra para gastar em uma marca de luxo cara, não espera que a loja pegue seu passaporte e veja se você está numa lista de sanções", disse ela. "Se fizerem isso, poderão perder clientes."

Calças jeans da Levi's
Entre as empresas que saíram da Rússia, estão marcas como Levi's, Adidas, Gucci e Chanel - Justin Sullivan/AFP

A escalada da crise coincidiu com uma série de desfiles de moda em Milão e Paris neste mês, eventos que não muito tempo atrás tinham nas primeiras filas alta frequência de jovens esposas de oligarcas, que eram elogiadas como influenciadoras e uma grande atração para os fotógrafos.

Agora, quase todos os executivos de luxo foram rápidos em dizer que sua principal preocupação é com seus funcionários na Rússia, em vez de condenar as ações do governo russo. Na semana passada, entretanto, os estilistas deixaram de fazer comentários para quase universalmente –e publicamente– afirmar seu apoio à paz em forma de declarações em shows ou adendos às suas notas de desfile.
Ainda assim, nem todos na indústria estão deixando a Rússia.

Falando antes de seu desfile de outono de 2022 em Paris, o designer Rick Owens disse que não havia resolvido totalmente o que fazer, mas não achava que o povo russo "merecia ser punido".

A Uniqlo, de propriedade da gigante de roupas Fast Retailing, planeja manter suas lojas russas abertas, com seu fundador, Tadashi Yanai, dizendo a um jornal japonês: "Vestuário é uma necessidade da vida. O povo da Rússia tem o mesmo direito de viver que nós".

Especialistas preveem que o vazio deixado pelas empresas de varejo ocidentais será preenchido pela China, que provavelmente trabalhará para atender à classe média da Rússia e se beneficiar em curto prazo. E alguns varejistas não russos poderão encaminhar seus produtos pela China, contornando a Europa.

Para a maioria dos varejistas americanos e europeus, os negócios na Rússia não são tão grandes que sua perda cause um grande impacto nos lucros. A Levi's, por exemplo, disse que apenas 4% de suas vendas líquidas vieram do Leste Europeu, e apenas metade disso estava vinculada à Rússia. Segundo a Stanley Black & Decker, suas vendas e estoques na Rússia sugerem que o conflito não é "um grande risco" para a empresa. Na Dries Van Noten, Axel Keller, presidente da marca, disse que pausaram as entregas para Rússia, Ucrânia e Belarus, que juntas respondem por apenas 6% da receita.

As empresas que querem voltar a fazer negócios no país "não desejam ofender as sensibilidades russas", disse Townsend. Mas, acrescentou ele, "para muitas empresas, o mercado fora da Rússia é mais importante do que o mercado interno russo, e elas querem estar no lado certo da decisão moral".

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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