A energia no seu estado é das mais caras ou mais baratas? Compare

Entenda por que há tanta variação de preço, apesar de o país ter um sistema de energia interligado

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Brasília

As famílias no Piauí têm renda mensal per capita de R$ 837, uma das mais baixas do país. Famílias de Brasília estão no topo nacional desse ranking de ganhos, com cerca de R$ 2.500. Mas o piauiense paga uma tarifa de energia 20% mais cara que o morador da capital federal.

Brasília e Piauí não são casos isolados. A conta de luz no Brasil é assim. Apesar de o país ter um sistema de energia interligado, o custo final para os consumidores sofre grandes variações de valores.

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Conta de Luz Enel SP.; valores das tarifas variam entre as 53 distribuidoras - 27.02.19 - Gabriel Cabral/Folhapress

Minas Gerais abriga a maioria das hidrelétricas do sistema Furnas, um dos pilares do abastecimento nacional, mas sua tarifa é quase 14% mais cara que a do Paraná, que tem geração ínfima, em comparação. A energia no Rio de Janeiro, polo turístico internacional, é 22% mais cara que a das praias de Santa Catarina. O mesmo vale numa relação entre o pouco desenvolvido Pará e o pujante São Paulo. A tarifa de energia é 25% menor na capital paulista.

As diferenças ocorrem porque a formação do preço no setor inclui uma gama de componentes entrelaçados que escapa ao senso comum, diz Ângela Gomes, consultora para assuntos estratégicos da PSR, empresa da área de energia.

A própria tarifa final, que aparece na conta de luz, é a soma de duas outras tarifas, distintas entre si, a Tusd (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição) e a TE (Tarifa de Energia). Ambas, por sua vez, são compostas por elementos que também variam.

Regras para pagamentos de subsídios e números de consumidores por área estão entre os fatores que alteram o valor final, de forma diferente entre as 53 distribuidoras do país.

A tarifa mais elevada para o consumidor é a do Pará, que sai por R$ 816 o MWh (megawatt-hora), a menor é a do Amapá, no valor de R$ 506 o MWh. Os valores aparecem na conta em KWh (kilowatt-hora), respectivamente, 0,816 KWh e 0,506 KWh. A diferença é de 61%. Os dados são de 2021, para efeito de comparação com todos os reajustes anuais, mas as diferenças tendem a mudar pouco neste ano, explicam especialistas do setor.

O ICMS já foi um elemento de peso na variação. Mas a aprovação de um teto de 17% a 18% para o imposto estadual sobre a energia, em junho deste ano, reduziu as diferenças de caráter tributário.

Distribuidora não pode escolher de quem vai comprar energia

O preço pago na compra da energia é um elemento importante para explicar a multiplicidade de valores. Porém a localização das empresas —longe ou perto de usinas geradoras— não faz a menor diferença nisso. Pela legislação atual, as distribuidoras não têm autonomia para escolher de quem vai comprar.

É por isso que empresas como Cemig ou Energisa Minas Gerais não puxam um fio direto de Furnas, assim como a Equatorial Piauí não pode usar apenas a energia dos parques solares do estado, que estão entre os maiores geradores de energia barata do Brasil.

As distribuidoras só podem comprar energia em leilões. "E o valor da compra da energia depende do leilão em que a distribuidora entrar", explica Ângela.

Esses leilões são organizados pelos órgãos públicos do setor, como MME (Ministério de Minas e Energia) e Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Cada distribuidora também tem seu cronograma para entrar num leilão. Não vão juntas ao mesmo tempo. E os leilões são caixinhas de surpresa.

Não dá para saber ou escolher quanto terá de solar e eólica, hoje as mais baratas, ou térmicas, mais caras. Uma distribuidora apenas entra no leilão, informando o volume que precisa comprar para o abastecimento de seus clientes.

Perdas e gatos também deixam a conta de luz mais cara

Perdas de energia também influenciam o custo final. Elas podem ser operacionais, por ineficiência da empresa, ou por fatores além do seu controle, como furto.

A conta de luz Rio é um das mais afetadas no Brasil por perdas desse tipo. A ligação clandestina, o chamado gato, é o principal problema. Na Celesc, essa perda é bem menor.

Os diferentes custos de transporte da energia pelo sistema também precisam ser considerados, diz Helder Sousa, diretor de Regulação da TR Soluções, empresa de análise do setor elétrico. Souza destaca o transporte na distribuição, que considera despesas de equipamentos, rede e subestações, por exemplo.

Nesse quesito, uma empresa como Enel São Paulo, que atua numa região com concentrações urbanas e muitos usuários por quilômetro de rede, vai ter resultados melhores do que uma Equatorial Pará, cuja rede atravessa longas distâncias de vazios demográficos.

A regra para pagamento de subsídios também alimenta diferenças. Um exemplo está na repartição dos subsídios previsto na CDE (Conta de Desenvolvimento Energético).

Neste ano, eles somam R$ 30 bilhões. Consumidores do Norte e Nordeste, antes isentos, agora pagam, mas uma parcela bem menor, R$ 3,4 bilhões. A parcela maior da conta, R$ 26,4 bilhões, fica com consumidores no Sudeste, Sul e Centro Oeste. O valor que cabe a cada distribuidora também varia, e o cálculo para a distribuição considera o mercado de cada uma.

Outro item que influencia as diferenças nas contas de luz é o efeito de despesas que as distribuidoras cobrem e têm direito a repassar ao consumidor quando for feito o reajuste na conta de luz. Esse reajuste ocorre uma vez por ano, na data de revisão tarifária definida no contrato de concessão. Todas as despesas que ocorrem nos 12 meses entre os reajustes são cobertas pelas empresas.

O pagamento da CDE é um exemplo do efeito sobre o valor final.

O seu rateio ocorre em janeiro. A despesa é coberta pelas distribuidoras, com direito a receber o valor desse gasto, corrigido pela taxa básica de juros, a Selic. A empresa que tiver um reajuste da tarifa em março terá uma correção menor do que a empresa que tiver o reajuste em julho, por exemplo. Isso influencia diretamente no valor repassado à conta de luz, e nas diferenças entre as diversas contas.

Essa lógica pode ser aplicada para inúmeras despesas em que ocorre descasamento entre o pagamento e a data de reajuste.

No passado, a tarifa de energia já teve um preço único no Brasil, lembra Marcos Madureira, presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), mas a metodologia se revelou prejudicial. O resultado não foi bom, diz ele.

"A distribuidora mais eficiente bancava a menos eficientes, e os consumidores da mais eficiente não eram beneficiados. Não havia incentivo para ninguém melhorar o desempenho", diz Madureira.

No modelo atual de regulação, as empresas são comparadas entre si e incentivadas a trabalhar para alcançar os indicadores de desemprenho das melhores. Parte dos ganhos de eficiência pode ser incorporada ao resultado, além de reduzir a conta de luz de todos os consumidores.

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