Descrição de chapéu Folhainvest

Entre a surpresa e a cautela, Faria Lima digere vitória de Lula

Equilíbrio de forças, com Congresso mais à direita e BC independente, reduz margem de manobra do novo governo, diz gestor

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São Paulo

Gestores de fundos de investimento oscilam entre a surpresa com a reação positiva do mercado nesta segunda-feira (31), após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra Jair Bolsonaro (PL), e a cautela até que seja possível ter uma noção melhor sobre qual será, de fato, a política econômica a ser adotada a partir de 2023.

Segundo Rafael Ihara, economista-chefe da gestora Meraki Capital, havia uma expectativa negativa dos investidores locais, principalmente por causa das preocupações com o rumo das estatais, como Petrobras e Banco do Brasil, e com a falta de clareza na política fiscal.

"Mas os estrangeiros parecem estar menos preocupados com isso e entraram comprando. É impressionante como os ativos locais estão performando bem hoje", diz Ihara, acrescentando que o mercado segue na expectativa do nome que comandará o ministério da Economia, que ele avalia ser a maior preocupação dos investidores no momento. "Nomeações das estatais também serão importantes, mas devem vir depois."

O economista diz ainda que a segunda maior preocupação é qual será o tamanho do gasto acima do teto no ano que vem, mas que o mercado só deve ter clareza sobre essa dimensão no começo de 2023, quando o novo governo assumir.

Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursa após confirmação da vitória, em São Paulo
Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursa após confirmação da vitória, em São Paulo - Nelson Almeida - 30.out.2022/AFP

O equilíbrio de forças, com um Congresso mais à direita e um Banco Central independente, reduz bastante a margem de manobra do novo governo. Por isso, tirando Petrobras e Banco do Brasil, que devem sofrer ingerências diretas, o resto do mercado tem um dia normal, diz Luiz Fernando Alves, gestor da Versa Fundos de Investimento.

"O mercado está mostrando hoje que não tem lado, e espera os anúncios da equipe econômica e planos de governo com o pragmatismo habitual", afirma Alves.

O gestor da Versa diz ainda que agora resta esperar para ver como o novo governo vai equacionar o equilibro das contas públicas com a manutenção do Auxílio Brasil e o anseio por investimentos em infraestrutura indicado pela campanha petista.

"Se não for uma equação equilibrada, que leve a um aumento da inflação ou do prêmio de risco, o BC vai levar os juros para a lua e acabar com a economia. Por isso, o governo não tem muita opção."

Sócio fundador e gestor da GTI Administração de Recursos, André Gordon afirma que deve seguir em uma espécie de compasso de espera nas próximas semanas, até que seja possível ter uma clareza maior sobre qual será a condução da política econômica do novo governo.

Até lá, ações que podem vir a ser mais impactadas por decisões de Brasília, como as da Petrobras, devem seguir nas carteiras dos fundos da gestora, frente ao bom momento operacional em que a empresa se encontra, mas em um tamanho menor do que nos últimos meses, diz Gordon. É um ajuste não por causa dos fundamentos da empresa, mas por uma administração do risco, que aumentou com a vitória petista, afirma.

Gordon afirma ainda que irá privilegiar neste momento ações de empresas menos suscetíveis às notícias políticas, com o desempenho mais atrelado às estratégias individuais de negócio de cada uma. A empresa de calçados Vulcabras e as produtoras de commodities Suzano, JBS e Vale, são apontadas como exemplos, por estarem mais vulneráveis a um risco de desaceleração abrupta da economia global nos próximos meses e não tanto com o Brasil, afirma o gestor.

Sócio-fundador da gestora Adam Capital, André Salgado afirma que, frente aos preços considerados muito baratos dos ativos locais, os fundos têm mantido posições no índice Ibovespa e nas ações da Petrobras.

No entanto, para se preparar para um estresse maior do mercado com a vitória de Lula, também montou uma posição em dólar contra o real, como uma forma de proteção para o portfólio, mas que já começou a ser desfeita.

"Os preços estão atrativos o suficiente para o cenário que estamos chamando de ‘Lula esperado’, que é sem muita maluquice nas estatais e no time econômico", afirma Salgado.

O sócio da Adam diz que, mesmo que não tenha mais nenhuma melhoria operacional ou de governança, segue vendo com bons olhos as perspectivas para os papéis da Petrobras e para a Bolsa de forma geral nos níveis atuais de preços. O que não pode acontecer é uma deterioração aguda, com aumento nas intervenções ou a nomeação de políticos de viés muito populistas, afirma Salgado. "A partir agora, o que tem de ser feito é uma reanalise do cenário a cada nome que for anunciado, a cada política que for anunciada."

"Aparentemente, o mercado acredita que o Lula vai trazer alguém como o [Henrique] Meirelles, mas não acredito que seja alguém nessa linha. Se fosse, o Lula já teria dado uma sinalização antes", afirma Gordon, da GTI. Por outro lado, prossegue, ele diz que não espera também que o comando da Economia será delegado a figuras políticas como, por exemplo, Aloizio Mercadante.

"Acho que tende a ser alguém com o perfil como o do [Fernando] Haddad, eventualmente tendo na equipe nomes como o Marcos Lisboa."

Em relatório, o economista-chefe da XP e ex-secretário municipal da Fazenda em São Paulo, Caio Megale, diz que os nomes da equipe econômica, assim como a estrutura dos ministérios, são os principais pontos de atenção que mais devem influenciar o desempenho dos mercados em um primeiro momento.

"Após a formação da equipe, o próximo desafio será alterar o atual teto constitucional para permitir maiores gastos. O teto hoje não permite, por exemplo, que o programa Bolsa Família permaneça em R$ 600 por mês por pessoa —promessa que Lula fez várias vezes durante a campanha", aponta Megale.

Como a mudança do teto exige uma emenda constitucional, as negociações com o Congresso precisam começar o quanto antes, afirma o economista-chefe da XP. "Isso significa que, desta vez, Lula precisa montar a equipe econômica mais rápido do que o habitual. Talvez ainda nesta semana."

As reformas econômicas —principalmente a reforma tributária— e qual será o modelo de concessões de infraestrutura para o setor privado, também estarão no radar dos investidores daqui para frente, diz Megale.

Já o time da Toro Investimentos indica que a manutenção de R$ 600 do Auxílio Brasil, e a possibilidade de medidas adicionais de distribuição de renda, como a alteração na faixa de isenção do Imposto de Renda, podem beneficiar ações de empresas de consumo pouco sensíveis ao cenário externo na Bolsa.

Como exemplos, eles citam a farmacêutica Pague Menos e as varejistas Grupo Mateus e Assaí Atacadista.

"A expectativa da maior disponibilidade de renda, dentre as classes sociais mais baixas, também deve impactar positivamente outras empresas do varejo no geral, como, por exemplo, Magazine Luiza, Lojas Renner e Americanas, além de empresas de shopping centers, como a Aliansce Sonae."

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