Descrição de chapéu indústria

Indústria do sabonete cresceu com a promessa de evitar cecê

Venda do produto no país soma R$ 8,7 bilhões ao ano, diz Euromonitor; público prefere fragrâncias frescas e frutadas

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São Paulo

O anúncio publicado no Jornal das Moças, em outubro de 1946, trazia a imagem de uma jovem melancólica em frente ao espelho, logo abaixo da frase: "Beleza inútil. Ela tem C.C. (cheiro de corpo)". A propaganda em questão, da marca de sabonetes Lifebuoy, hoje fabricada pela Unilever, dizia que o produto "contém o elemento antisséptico especial que, de fato, evita o 'C.C'".

Ao longo dos últimos 70 anos, muita coisa evoluiu na propaganda de produtos de higiene pessoal, a começar pela vinculação dos atributos do sabonete à sensação de bem-estar pessoal, sem apelos ao estigmatizante "cecê", como ficou conhecido o cheiro de suor.

Mas na segunda metade dos anos 1940, após a Segunda Guerra Mundial, quando os chuveiros elétricos começavam a se popularizar, o banho diário passou a ser uma prática comum. A despeito da tradição herdada dos povos indígenas, que tomavam vários banhos de rio por dia, o brasileiro das primeiras décadas do século passado tomava poucos banhos por semana (ou um só), de preferência no sábado.

anúncio em preto e branco que diz "Nada de C.C. comigo... Uso Lifebuoy"
Propaganda do sabonete Lifebuoy, hoje produzido pela Unilever, em edição da revista O Cruzeiro, de fevereiro de 1947. - Reprodução revista O Cruzeiro

Hoje, de acordo com a consultoria Euromonitor, o Brasil consome, ao ano, US$ 1,42 bilhão (R$ 7,4 bilhões) em sabonetes em barra, o que representa uma alta de 16% (no valor em dólar) em comparação a 2016. Considerando o consumo de sabonete líquido, os brasileiros gastam US$ 251 milhões (R$ 1,3 bilhão) com o produto, cujo consumo saltou mais de sete vezes nos últimos cinco anos no país.

A expectativa, segundo a consultoria, é que este mercado atinja US$ 1,74 bilhão (R$ 9 bilhões) até 2026.

Prioridade para o brasileiro é o perfume

"A penetração dos sabonetes em barra no Brasil é muito alta em comparação com a Europa, onde o mercado de líquidos é mais desenvolvido", diz Katia Ambrosio, diretora de marketing de cuidados pessoais da Colgate-Palmolive Brasil, dona das marcas de sabonete Palmolive e Protex.

O Brasil é líder no ranking global da Colgate-Palmolive na venda de sabonetes em barra.

"Mas o mercado de líquidos está avançando por aqui, não só pelos novos hábitos adquiridos durante a pandemia –a fim de evitar o compartilhamento do produto, por exemplo–, como também pelos benefícios emocionais", diz Katia.

Segundo a executiva, o sabonete líquido é visto como algo "mais moderno", associado a momentos de bem-estar, carinho e autocuidado. "Existe um viés emocional que influencia na escolha desse tipo de produto no Brasil", afirma. Outra promessa dos sabonetes líquidos é promover a hidratação da pele.

De acordo com dados da Euromonitor, a Unilever é dona das marcas que lideram o mercado de sabonetes no Brasil: Lux, no formato barra (participação de 18,5% em 2021), e Lifebuoy no formato líquido (3,3%).

A segunda marca mais vendida do mercado de sabonete em barra é Natura Ekos (10,9%), da brasileira Natura, seguida por Protex (7,5%), da Colgate-Palmolive. Já em sabonetes líquidos, a vice-liderança e o terceiro lugar estão, respectivamente, com as marcas Natura (2%) e Avon Care (1,9%), ambas do grupo Natura&Co.

Duas mulheres, uma branca e uma negra, trabalham em uma bancada com vários sabonetes em barra, na cor branca
Produção de sabão e sabonetes feitos com óleo de babaçu, na zona rural de Lago do Junco (MA). - Lalo de Almeida/ Folhapress

A fragrância é a prioridade do brasileiro na hora de escolher o sabonete. "No Brasil, fragrâncias frescas e frutadas estão entre as preferidas, e para boa parte dos consumidores é importante que a experiência remonte a uma conexão com a natureza", afirma Kátia.

Neste caso, diz, a preferência é pelas fragrâncias locais que reflitam a cultura brasileira e os ingredientes naturais.

"O brasileiro procura aliar higiene e bem-estar, uma preocupação que ganhou maior importância nos últimos anos, com a pandemia", afirma Kátia.

A indústria, por sua vez, vem se esmerando em lançar produtos com foco esfoliante, hipoalergênico e antibacteriano.

Nove pontos para entender a história do banho

Curiosidades sobre a evolução da higiene pessoal, segundo "O banho não foi sempre assim", de Federico Kukso e Ileana Lotersztain (Editora Callis) e "Passado a Limpo - A História da Higiene Pessoal no Brasil", de Eduardo Bueno (Editora Gabarito)

  • Quem inventou

    Há mais de 2.000 anos, os romanos construíram enormes centros que inspiraram os atuais spas ("Salus per Aquam", ou saúde pela água). Havia um ritual: primeiro frigidarium (água fria); depois tepidarium (água morna); caldarium (espécie de sauna); e por último depilação, massagem e óleo perfumado.

  • Banho na África

    Os antigos egípcios se lavavam com água, óleos e unguentos perfumados. Tanto egípcios quanto sumérios tomavam banho de óleo e álcool de jasmim, lírio, jacinto e madressilva. O reino de Pount, na atual Somália, era conhecido como "o reino de todos os aromas"

  • Pudor medieval

    Durante a ascensão da Igreja Católica na Idade Média, ficou proibido tomar banho: pensamentos pecaminosos poderiam aparecer ao se apalpar o próprio corpo nu. Os médicos também não recomendavam banho: os poros poderiam se dilatar e era por eles que -se acreditava- entraria a peste negra, que assolou a Europa no século 14.

  • Na Europa, durante a Idade Média e por muitos séculos mais, era costume jogar pela janela o conteúdo dos penicos. Isso era feito a qualquer hora, de preferência à noite, acompanhando o grito "vai água!". Pelas ruas e praças da Europa, corriam riachos repletos de excrementos humanos e dos animais que viviam nas casas, lixo, sangue e vísceras de animais que eram abatidos em plena via pública.

  • Na China, porém...

    Em 1391, o Departamento de Abastecimento Imperial da China encomendou a produção de 720 mil folhas de papel para usar no banheiro, com 60 x 90 centímetros de tamanho, decoradas com os principais personagens e acontecimentos da história chinesa, mas de uso exclusivo da corte imperial.

  • Para que gastar dinheiro?

    No mundo ocidental, o papel higiênico surgiu em 1857 com o empresário americano Joseph Gayetti. Mas sua invenção não teve muito apelo no começo: parecia ridículo gastar dinheiro em algo que podia ser substituído por coisas que já existiam em casa, como feno, lã, palha ou folhas de milho.

  • A força dos perfumes

    Durante o século 18, tomava-se banho ao ser batizado e em outras poucas vezes - ou até nunca mais. "Lavavam" somente as partes visíveis do corpo - rosto e mãos -, a seco e com uma toalha limpa. Os ricos se borrifavam com perfumes, enquanto os pobres não tinham como disfarçar o mau cheiro. Os ricos, porém, "ficavam limpos" trocando frequentemente a camisa branca que, supostamente, absorvia a sujeira do corpo. As roupas íntimas eram trocadas só uma vez por mês.

  • Índio dá o exemplo

    Na América Central, os indígenas costumavam ir ao temazcal (casa de vapor), estruturas parecidas a iglus, onde havia pedras esquentadas em brasa, borrifadas com infusões de plantas medicinais para produzir vapor. No Brasil, os primeiros portugueses, que tomavam de um a dois banhos por ano, estranharam quando viram os índios tomarem de cinco a oito banhos por dia. Também os indígenas brasileiros se depilavam com língua de pirarucu: acreditavam que, sem pelos, se diferenciavam dos animais.

  • O esgoto, finalmente

    Em meados do século 18, os grandes centros urbanos, como Londres e Paris, passaram a ter problemas gravíssimos com o acúmulo de resíduos e sujeira nas ruas. A solução surgiu em 1843, em Hamburgo, na Alemanha, onde foram planejados os primeiros esgotos subterrâneos modernos, o que fez com que as casas começassem a ser construídas com banheiros conectados ao sistema de esgoto, que conduzia a sujeira até os rios. Em Hamburgo, houve a preocupação de tratar essas "águas residuais" com produtos químicos, para evitar a contaminação das águas.

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