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'Meu primeiro voto no Lula e no PT': o que pensam os empresários desiludidos com Bolsonaro

Carga tributária alta, gestão errática da pandemia e devastação ambiental desapontaram setor privado

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São Paulo

Em uma das diversas charges que passaram a circular nas redes sociais neste domingo (30) após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência do Brasil, está uma tirinha em que um homem pergunta a uma mulher: "Quando você virou petista: com Lula ou com Dilma?". Ao que ela responde: "Com Bolsonaro."

A charge ilustra bem o que parte do empresariado brasileiro sentiu sob a gestão do atual presidente Jair Bolsonaro (PL): eleito como um defensor do discurso liberal, a favor das privatizações, do Estado mínimo, Bolsonaro fez com que, em sua gestão, a carga tributária brasileira atingisse 34% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2021, o maior patamar em pelo menos 12 anos. As privatizações, por sua vez, empacaram, com exceção da Eletrobras.

Para piorar, a gestão errática da pandemia fez com que a retomada da economia no país demorasse mais tempo que o esperado. O descaso da gestão do atual presidente com a Amazônia e o avanço do desmatamento arranharam a imagem do Brasil no exterior, indo na contramão da cartilha de desenvolvimento ambiental, social e corporativo (ESG), que vem pautando as decisões empresariais em todo o mundo. Neste sentido, a eleição de Lula trouxe alívio aos empresários descontentes.

homem branco, careca, de barba grisalha e terno preto
Roberto Klabin, acionista da fabricante de papel e celulose Klabin, fundador da SOS Mata Atlântica e da SOS Pantanal. - Zanone Fraissat/Folhapress

"O Lula fez um ótimo discurso, de acolhimento, de abertura, de reinserção do Brasil na agenda mundial, também do ponto de vista ambiental", disse à Folha Fabio Barbosa, presidente da multinacional brasileira Natura&Co. "Mas a prioridade número 1 agora é detalhar o seu programa econômico, definir quais são os nomes da equipe econômica e como vai endereçar a questão fiscal", afirma o executivo, ex-presidente do Santander Brasil e da Febraban (Federação Brasileira de Bancos).

No primeiro turno, Barbosa havia votado na senadora Simone Tebet (MDB), que apoiou Lula no segundo turno. "O apoio da Simone foi decisivo, eu adorei [a participação dela]", disse. "Agora, Lula deve dizer como vai gerar empregos e reduzir a fome, em meio a um contexto internacional que não é favorável", diz Barbosa.

Na visão do executivo, o país tem dificuldades, mas também enorme potencial. "Lula tem capital político neste momento e o país não está condenado a uma economia empacada."

Quem também havia escolhido Simone Tebet como presidente em 2 de outubro foi Roberto Klabin, acionista da fabricante de papel e celulose Klabin.

"Foi a primeira vez que eu votei em Lula e no PT", diz o empresário, fundador da SOS Mata Atlântica e da SOS Pantanal, organizações não governamentais ligadas à defesa ambiental. "Votei para garantir que o Brasil continue sendo uma democracia e consiga reverter a devastação do meio ambiente", diz ele, que em eleições anteriores apoiou o PSDB.

Na opinião de Klabin, foi importante Lula não ter vencido no primeiro turno. "Ele foi obrigado a se aproximar mais do centro, não ficou preso ao universo do PT", diz ele, que também elogia a atuação de Simone Tebet na campanha, assim como o acordo de Lula com a deputada federal eleita Marina Silva (Rede).

O petista se comprometeu a incorporar em seu programa de governo diretrizes elaboradas pela sua ex-ministra do Meio Ambiente.

"A vitória de Lula foi a melhor coisa que poderia ter acontecido com o Brasil", diz Klabin. "Mas o país sai das eleições muito dividido, semelhante ao que acontece nos Estados Unidos. Isso me preocupa."

um homem pergunta a uma mulher: “Quando você virou petista: com Lula ou com dilma?”. Ao que ela responde: “Com Bolsonaro.”
Uma das charges que passaram a ser veiculadas nas redes sociais após a vitória de Lula no domingo - Reprodução

Vitória apertada pede pacificação nacional, dizem executivos

Um alto executivo do setor de aviação civil destaca que a vitória de Lula sobre Bolsonaro foi a mais apertada em um segundo turno das eleições presidenciais: 51% contra 49% dos votos válidos. Na opinião dele, em primeiro lugar, é preciso garantir que a transição seja tranquila e que Lula governe para todos os brasileiros, procurando eliminar o que ele chamou de ânimos radicais exacerbados.

Caio Magri, presidente do Instituto Ethos, destaque que o segundo turno foi marcado pelo uso da máquina pública "como jamais se viu em uma eleição desde o fim da ditadura". "É preciso unir o Brasil em prol do combate incessante às desigualdades e pelo desenvolvimento sustentável", diz ele, que considera como prioridades do novo governo erradicar a fome e combater as desigualdades sociais.

"O Ethos vai trabalhar nesta direção, convidando as empresas para serem parceiras no processo. Haverá muito trabalho pela frente, mas estamos conscientes de nossas responsabilidades."

Com a proposta de fomentar os conceitos ESG nas empresas, o Ethos tem 454 associadas, entre elas Natura, Grupo Pão de Açúcar, Carrefour e Renner.

Na opinião de Betania Tanure, sócia da consultoria BTA Associados, que atende grandes empresas na área de comportamento organizacional e gestão executiva, o maior desafio agora é unir um país polarizado, sob o risco de o Brasil não avançar do ponto de vista econômico, social e ambiental.

"É preciso celebrar a democracia, que permite a alternância de poder, conforme a vontade da maioria", diz Betania, que também é conselheira do Magazine Luiza. "Acredito que o empresariado está mais maduro e compreende a sua influência na sociedade. Os empresários que são realmente gestores não olham a sua empresa de maneira isolada."

A respeito das denúncias de assédio eleitoral de empresários sobre funcionários para voto em Bolsonaro, Betania diz que os casos não ilustram uma prática relevante no país. "É algo inadmissível, mas ainda assim são casos isolados, em empresas ou negócios de menor porte", afirma.

Na opinião da psicóloga, especialista em comportamento organizacional, deve-se levar em conta que as emoções decorrentes da pandemia ainda estão sob a flor da pele. "Estamos vivendo ainda um pós-guerra, que deve se curar com o tempo e fazendo o que precisa ser feito."

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