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Mudança na Lei das Estatais reduz valor das companhias, dizem especialistas

Tentativa de flexibilizar restrições a políticos une aliados de Bolsonaro e Lula

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São Paulo

A Lei de Responsabilidade das Empresas Estatais, sancionada em 2016 e alterada na noite desta terça (13) a toque de caixa pela Câmara, melhorou a gestão das empresas públicas e resultou em mais valor tanto para seus acionistas como para a sociedade brasileira, segundo avaliação de especialistas na área.

Uma flexibilização das regras que restringem a nomeação de políticos para cargos nos conselhos e na diretoria dessas empresas é uma demanda antiga do Legislativo. O tema ganhou força neste ano, unindo aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A Lei de Responsabilidade das Estatais (13.303/2016) foi sancionada pelo presidente Michel Temer (MDB), como resposta a uma série de investigações que apontaram uso político das empresas em administrações anteriores. O objetivo era fortalecer a governança das estatais e blindá-las contra ingerência política.

O presidente Michel Temer ao lado de ministros durante cerimônia de 1 ano da Lei de Responsabilidade das Estatais, no Palacio do Planalto, em Brasilia - Eduardo Anizelli-29.jun.2017/Follhapress

Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), afirma que, se fosse para mudar a legislação, seria para torná-la mais rigorosa, o que dificilmente receberia o apoio dos parlamentares.

Pesquisas do IBGC mostram que as estatais estão aderindo cada vez mais aos dispositivos da lei, mas pesa ainda a falta de fiscalização e de um órgão responsável por punir aqueles que não cumprem a legislação. Gregório diz que a aplicação das regras não depende só da estatal, mas também das atitudes do acionista controlador.

Ele afirma que o objetivo da lei não é impedir o governo de exercer seu papel de controlador, mas evitar a indicação de pessoas mais interessadas nas questões partidárias do que na qualidade dos produtos ou serviços entregues pela estatal.

"Uma empresa bem governada tende a gerar resultados melhores para todos. Não só para o acionista. Os colaboradores vão trabalhar em condições melhores, e os usuários e clientes vão receber melhores entregas em função de uma boa governança", afirma.

Sylvio Coelho, que coordenou a elaboração da legislação no Senado em 2016, atuando no gabinete do relator da matéria, senador Tasso Jereissatti (PSDB-CE), diz que a legislação segue as melhores práticas internacionais e as recomendações da OCDE.

Ele diz que há no Legislativo uma série de propostas que buscam reduzir as exigências de acesso aos cargos de gestão.

"Elevamos o nível de exigência a padrões internacionais, e o Congresso aprovou. Na sequência foram sendo apresentados projetos de lei no sentido de reduzir drasticamente essas exigências", afirma Coelho.

Para ele, a legislação ainda é nova e é necessário que seja dado mais tempo para que as estatais possam implementar seus dispositivos, mas já é possível ver resultados notórios em termos de eficiência, eficácia e efetividade da lei.

Além da melhora na gestão e nos resultados das empresas, ele destaca o ganho de valor. "É só verificar o que aconteceu com as ações da Petrobras nesses dias. O mercado reage em função da possibilidade de redução da qualidade da governança."

Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimento, também destaca a receptividade positiva do mercado à legislação e a reação negativa às tentativas de mudá-la.

"A lei foi importante para proteger os acionistas nos últimos anos. Houve excesso de interferência política em empresas estatais, a Petrobras ficou sem publicar balanço porque nenhuma auditoria externa queria assinar, e isso puxou uma reação do Congresso", afirma o economista.

Ele diz que o futuro governo busca retomar algumas práticas e que essas tentativas de voltar ao passado provocam a reação dos investidores. "Pode ser que tenha políticos competentes que funcionem como gestores dessas empresas, mas a gente fica desconfiado."

Em nota, a agência de classificação de risco Moody's avaliou a mudança da lei como negativa para bancos públicos, por entender que eleva os riscos de governança "uma vez que a intervenção política pode impactar suas estratégias de negócios e geração de resultados".

"O risco de conceder crédito com taxas mais baixas que os preços do mercado poderia resultar em pressões de rentabilidade em meio a um cenário de aumento do risco de crédito de 2023", completou a agência.

Em junho deste ano, membros do centrão defenderam alterar a lei para facilitar trocas no comando da Petrobras.

Na época, a possibilidade de flexibilização teve o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e da presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR).

Uma eventual flexibilização da Lei das Estatais poderia colocar em xeque a ambição do Brasil de ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Em relatório publicado no fim de 2020, o grupo de países ricos reconheceu que os conselhos das estatais se tornaram mais independentes de interferências em função da Lei das Estatais.

A OCDE ainda recomendou ao Brasil ir além das conquistas já alcançadas, estendendo os requisitos e vedações para todos os comitês do conselho de administração e para o conselho fiscal.

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