Descrição de chapéu Governo Lula

Haddad diz que apresentará plano de voo da economia para Lula em seu primeiro despacho

Ministro da Fazenda também minimizou as reações do mercado financeiro após sua posse

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Brasília

O ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou nesta terça-feira (3) que, em seu primeiro despacho, apresentará ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) um plano de voo com ações de curto, médio e longo prazo para a agenda econômica da nova gestão.

O chefe da pasta também minimizou as reações do mercado financeiro depois de seu discurso de posse na segunda-feira (2).

"Não acho isso [que está havendo um ataque especulativo à atual gestão]. As pessoas estão se apropriando dos números e do que aconteceu no Brasil em 2022. Estava um clima de que economia estava no rumo certo e esse clima está se desfazendo pela apresentação dos números do enorme rombo eleitoral deixado pelo Bolsonaro."

Cerimônia de posse de Fernando Haddad (PT), ministro da Fazenda, em Brasília - Gabriela Biló/Folhapress

Segundo Haddad, o movimento desfavorável dos ativos brasileiros, com dólar em alta e Bolsa em queda, mostra que está "caindo a ficha" dos agentes econômicos sobre a herança deixada pelo governo Jair Bolsonaro (PL).

Economistas e investidores ouvidos pela Folha, porém, atribuem os movimentos de ontem a medidas do governo Lula que indicam risco de maior intervenção na economia, como a retirada de estatais do plano de privatização, alterações em relação à ANA (agência ligada ao marco do saneamento) e declarações sobre mudança na política de preços da Petrobras.

"No meu primeiro despacho, eu vou apresentar um plano de voo ao presidente Lula de curto, médio e longo prazo. Vou apresentar um conjunto enorme de ações para ele, de decisões que ele vai ter de tomar, uma a uma", disse Haddad em entrevista ao site Brasil 247.

"O Lula é muito detalhista, ele gosta de saber o impacto de cada uma delas, evidentemente ele vai concordar com parte, discordar de outra, querer analisar com mais calma outras tantas. É assim que ele trabalha e estou acostumado a fazer. Com base na decisão que ele tomar, vamos ter de reestimar os indicadores [econômicos]", acrescentou.

Segundo Haddad, a apresentação das propostas deve acontecer nos próximos dias, quando Lula tiver disponibilidade na agenda. No dia seguinte à posse, o presidente recebeu diversas autoridades estrangeiras em encontros bilaterais, como os presidentes de Portugal (Marcelo Rebelo de Sousa) e Argentina (Alberto Fernández).

Na entrevista, Haddad, sem citar o nome da Folha, criticou o editorial "Retomada em risco", publicado pelo jornal em 22 de dezembro.

"Teve um jornal que chegou num editorial a colocar 'Lula está ameaçando a retomada', quando a economia está desacelerando há dois trimestres... então as pessoas estavam iludidas. Eu nem acredito em má-fé, acho que era gente desavisada, muito desavisada, que estava iludida sobre a situação das finanças, não tinha o tamanho do rombo da cabeça, e não tinha a clareza do impacto dos maiores juros reais do mundo sobre o crescimento econômico."

Diferentemente do que diz o ministro, o editorial mencionava expressamente tanto a desaceleração quanto o impacto dos juros: "É verdade que existia a necessidade de recompor os recursos do Orçamento para o amparo às famílias carentes. Também é fato que os preços ainda inspiram cuidados, os juros estão muito elevados e a atividade se encontra em desaceleração. Justamente por isso, a estratégia correta seria uma intervenção prudente na despesa pública, limitada ao suficiente para assegurar a assistência social. A responsabilidade fiscal facilitaria a queda da inflação e dos juros, e a economia poderia recobrar o crescimento sustentável, crucial para a redução da pobreza."

Haddad assumiu o Ministério da Fazenda nesta segunda com uma mensagem de responsabilidade com as contas públicas, combate à inflação e prioridade aos temas sociais. No entanto, não esboçou um plano de voo, deixando de especificar como pretende colocar suas promessas em prática.

Em seu primeiro discurso, o novo ministro disse que não está no cargo "para aventuras", em recado para o mercado financeiro, que continua desconfiado.

Ao tomar posse, Haddad também reafirmou o compromisso de enviar ao Congresso Nacional ainda no primeiro semestre a proposta de um novo arcabouço fiscal, em substituição ao teto de gastos –classificado de "estupidez" pelo presidente Lula em um dos discursos de posse no domingo (1º).

Nesta terça, o ministro da Fazenda disse que o governo pretende iniciar as discussões sobre a nova regra fiscal e sobre a reforma tributária a partir de abril. Haddad argumentou que é preciso aguardar a posse dos novos parlamentares, em fevereiro, e a formação de bancadas e comissões temáticas na Câmara dos Deputados e no Senado.

Os dois temas "podem e devem" andar juntos, segundo o titular da pasta econômica. No caso da reforma tributária, o governo vai tratar primeiro da questão dos impostos indiretos, que incidem sobre o consumo, para depois agir sobre tributos que incidem sobre a renda.

"Nós pretendemos enfrentar, a partir de abril, a reforma tributária dos impostos indiretos, que incidem sobre consumo. Por isso que se fala no IVA (Imposto de Valor Agregado) para simplificar tudo isso, tornar menos custoso o pagamento de impostos", disse.

"Na sequência, vamos enfrentar o debate sobre os impostos diretos, Imposto de Renda sobre dividendos, as deduções vão ser discutidas, o que é justo, o que não justo, como você desonera o trabalhador de baixa renda, de média renda, como você melhora a composição da cesta de tributos no Brasil", continuou.

Haddad falou que as mudanças no Imposto de Renda devem obedecer ao princípio da anualidade e, portanto, só poderiam entrar em vigor no exercício seguinte. Isso não vale para iniciativas de corte de impostos (como o reajuste da tabela), mas atrapalha o plano caso o objetivo seja implementar ao mesmo tempo medidas compensatórias (como a tributação de dividendos).

Como mostrou a Folha, a discussão referente aos impostos que incidem sobre consumo é tida como mais amadurecida após o Congresso ter se debruçado sobre duas PECs que simplificam a tributação no país. A 45, de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), prevê a substituição de cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, o estadual ICMS e o municipal ISS) pela ideia do imposto sobre bens e serviços (IBS).

Já a 110, do Senado, transforma nove tributos (IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, Cide-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS e ISS) em um IBS.

O ministro disse ver espaço para avanço da reforma tributária no Congresso e diz que Simone Tebet (MDB), titular do Ministério do Planejamento e Orçamento, contou a ele que a proposta só não foi votada anteriormente porque "o governo [Bolsonaro] não quis".

A votação, segundo relato de Haddad, a partir do que diz ter ouvido de Tebet, ficou travada no Senado pela insistência da gestão anterior, que tinha Paulo Guedes no comando do Ministério da Economia, na volta de um imposto sobre transações financeiras nos moldes da extinta CPMF.

Haddad aproveitou a ocasião para repetir críticas contra o governo Bolsonaro, feitas também nesta segunda no discurso de posse.

Segundo o titular da Fazenda, as medidas tomadas no período eleitoral deixaram um rombo de R$ 300 bilhões nas contas públicas, com o uso de 3% do PIB (Produto Interno Bruto) para aumento de despesas e renúncias fiscais, e levaram o país a ter "o maior juro real do mundo hoje", com a elevação da taxa básica de juros (Selic) de 2% a 13,75% ao ano. "Esse é o grande legado do Bolsonaro", disse.

"Você está num mundo em que o Brasil está com uma taxa de inflação menor que os EUA e a Europa. Só que estamos com a taxa de juros real maior do planeta. Olha o paradoxo que estamos vivendo, uma situação completamente anômala. Uma inflação comparativamente baixa e uma taxa de juros real fora de propósito para uma economia que já vem se desacelerando", disse ele.

Questionado sobre como vem tratando dessa questão com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que "eles sabem disso, fazem isso o tempo todo, acompanham o que está acontecendo no mundo o dia todo".

"O que eu não entendo é por que isso não vem à luz com a clareza que deveria, o custo que a farra eleitoral produziu."

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