Descrição de chapéu aeroportos

Santos Dumont lota enquanto Rio vive impasse sobre aeroportos

Futuro do terminal e do Galeão está sob análise no governo Lula

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Rio de Janeiro

O aeroporto Santos Dumont, no centro do Rio de Janeiro, teve um salto na movimentação de passageiros em 2022, e lideranças locais avaliam que o terminal opera acima da sua capacidade.

A situação ocorre em meio a um impasse envolvendo os dois grandes aeroportos do município.

A gestão de Jair Bolsonaro (PL) projetava conceder o Santos Dumont em conjunto com o Galeão, na zona norte do Rio, mas o futuro dos terminais ainda desperta incertezas e está sob análise do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Para lideranças fluminenses, é preciso frear a demanda no Santos Dumont. Na avaliação local, a medida é necessária para gerar maior coordenação no tráfego aéreo do Rio e direcionar mais voos ao Galeão, que passou por esvaziamento e entrou em processo de relicitação no ano passado.

Movimentação de passageiros no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli/Folhapress

A capacidade anual do Santos Dumont é estimada em 9,9 milhões de passageiros pela Infraero, a empresa pública federal que administra o aeroporto, voltado para a aviação doméstica.

Porém, em 2022, o terminal recebeu 10,17 milhões de viajantes, entre embarques e desembarques, o maior número de uma série histórica com dados disponíveis desde 2012 no site da Infraero.

A alta foi de 49,5% em relação a 2021 (6,8 milhões). No pré-pandemia, o contingente estava próximo de 9 milhões –foi de 9,1 milhões em 2019 e de 9,2 milhões em 2018.

"O reflexo [do aumento] é a fila de passageiros em determinados horários, é a aglomeração, o desconforto", afirma o ex-secretário estadual de Transportes Delmo Pinho, assessor da presidência da Fecomércio RJ (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Rio de Janeiro).

"É a mesma coisa que ter um carro para cinco passageiros e operar o veículo com seis ou sete pessoas. Vai ter gente sentada no colo ou dentro do porta-malas", diz.

Pinho relata que entidades empresariais defendem, com base em estudos técnicos, uma redução na capacidade do Santos Dumont para 8 milhões de passageiros ao ano.

Esse limite, afirma, seria suficiente para manter a atratividade financeira do aeroporto e ajudar na recomposição dos voos no Galeão.

Segundo dados publicados pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o Santos Dumont recebeu 9,9 milhões de passageiros pagos em 2022 –definição que exclui viajantes que não geram receitas para as companhias aéreas.

É o maior nível de uma série histórica com dados disponíveis desde 2000 no site da agência.

Em nota, a Infraero afirma que "opera dentro da margem da atual capacidade do aeroporto Santos Dumont".

Conforme a companhia, são adotadas melhorias contínuas no processamento de passageiros, junto às empresas aéreas, para obtenção de ganhos de eficiência e garantia dos "mesmos níveis de segurança e qualidade".

O aeroporto internacional do Galeão, por sua vez, recebeu 5,7 milhões de passageiros pagos em 2022, segundo a Anac.

O número, que soma voos nacionais e internacionais, equivale a apenas 41,8% do patamar de 2019 (13,7 milhões), no pré-pandemia. Ao longo da década passada, o Galeão chegou a receber mais de 16 milhões de viajantes por ano.

Para autoridades locais, o esvaziamento guarda relação com o inchaço do Santos Dumont, que fica mais próximo de negócios instalados no centro da cidade e de pontos turísticos da zona sul, por exemplo.

O Galeão está localizado na Ilha do Governador, e o acesso é feito por vias como a Linha Vermelha, local frequente de engarrafamentos e com casos de violência urbana.

Responsável pelo aeroporto, a RIOgaleão anunciou em fevereiro de 2022 pedido de devolução da concessão. A empresa associou a medida a dificuldades econômicas agravadas pela pandemia.

Com isso, o governo Bolsonaro passou a projetar um leilão em conjunto do Galeão e do Santos Dumont. Por essa lógica, um mesmo grupo investidor poderia ficar com a administração dos dois terminais.

Em novembro, a RIOgaleão, que é controlada pela Changi, de Singapura, assinou com ressalvas um termo aditivo para dar andamento à devolução.

À época, a Anac indicou que, ao assinar o documento, a concessionária declararia "adesão irrevogável e irretratável à relicitação".

Porém, com a troca de governo, o debate ganhou novos contornos. Após reunião no Rio em janeiro, o ministro Márcio França (Portos e Aeroportos) sinalizou interesse da gestão Lula e da própria empresa em costurar um acordo para a permanência da atual concessionária.

Prefeitura quer restrições

O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico do Rio, Chicão Bulhões, avalia como positiva a indicação do governo e elogia o trabalho da empresa.

Contudo, Bulhões entende que o debate mais urgente envolve a necessidade de "coordenação" entre Galeão e Santos Dumont.

A prefeitura defende que os voos no aeroporto doméstico fiquem restritos a trechos mais próximos, em um raio de 500 quilômetros –o que incluiria a conexão com São Paulo–, além da ligação com Brasília.

"O Santos Dumont está acima da sua capacidade de passageiros", diz Bulhões. "Se esse problema de regulação não for resolvido, vai ter uma concessão disfuncional de qualquer maneira [no Galeão]", diz.

Marcus Quintella, diretor do centro de estudos FGV Transportes, não vê o Santos Dumont como motivo do esvaziamento do aeroporto internacional.

Ele diz que o Galeão é um "excelente" terminal, mas que foi afetado por problemas estruturais do Rio, como as turbulências econômicas dos últimos anos e a violência urbana.

"Um aeroporto não gera passageiros. O que gera é a cidade. É a economia da região", afirma.

Delmo Pinho, da Fecomércio RJ, considera que é preciso melhorar os acessos ao Galeão.

"Se você quiser que uma pessoa saia de um aeroporto central e vá para o outro, que é muito bom, mas está mais distante, o trajeto tem de ser confortável. Ela precisa se sentir segura."

Movimentação de passageiros no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli - 11.jul.22/Folhapress

Relicitação tem muitas etapas, diz ministério

Consultado pela Folha, o Ministério de Portos e Aeroportos afirma que "o caminho natural" para o Galeão "é realizar a relicitação", mas menciona que o processo "envolve muitas etapas".

"De qualquer maneira, o ministério está empenhado em encontrar a melhor solução para a ampliação das operações do Galeão, seja ele administrado pela atual ou por uma nova concessionária", diz.

A pasta também relata que a questão do Santos Dumont "passa necessariamente pela solução a ser dada para o Galeão", já que ambos compõem o sistema aeroportuário do Rio.

"Cabe ressaltar que, gerenciado pela Infraero, o Santos Dumont possui ótimos índices de avaliação", afirma.

A RIOgaleão diz que "mantém o compromisso de atuar com excelência operacional e de segurança" e que "segue trabalhando para o desenvolvimento comercial" do Galeão.

"A concessionária se coloca à disposição para contribuir no trabalho de análise da situação aeroportuária do Rio de Janeiro", aponta.

A Anac, por sua vez, afirma que "todos os envolvidos estão conversando para discutir as melhores soluções possíveis" e que os passageiros locais precisam dos dois aeroportos.

Segundo a agência, "com os desafios da crise econômica e da pandemia, é natural que haja impacto na demanda total e que o Santos Dumont sofra menos no curto prazo, sem prejuízo, no entanto, da demanda potencial de longo prazo da [área de controle terminal] TMA-RJ, a qual está diretamente relacionada ao crescimento econômico da região".

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