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Com alta de juros nos EUA, renda fixa no exterior atrai interesse de brasileiros

Lançamentos de produtos nos últimos meses facilitaram o acesso aos títulos do governo americano

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São Paulo

Não é só a renda fixa brasileira que tem despertado interesse dos investidores nos últimos meses.

A alta de juros conduzida pelo Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA), que levou a taxa básica da economia americana de 0,25% ao ano em março de 2022 para a atual banda entre 4,75% e 5% ao ano, começa a chamar a atenção dos brasileiros para a renda fixa dos Estados Unidos.

Embora com uma demanda ainda muito inferior em comparação aos títulos públicos do governo brasileiro, o investimento em papéis emitidos pelo Tesouro americano e em títulos corporativos negociados no exterior vem ganhando maior apelo no mercado local, com gestoras trabalhando no lançamento de produtos para atender o interesse crescente.

Pessoas caminham em frente ao prédio da Bolsa de Valores de Nova York, nos EUA
Pessoas caminham em frente ao prédio da Bolsa de Valores de Nova York, nos EUA - Spencer Platt - 11.nov.2022/AFP

Uma das maiores gestoras de recursos do mercado em escala global, a BlackRock, com cerca de US$ 8,5 trilhões (R$ 43,7 trilhões) em ativos sob gestão, lançou, em fevereiro do ano passado, oito produtos que dão ao investidor local acesso ao mercado de renda fixa no exterior.

Conhecidos pela sigla BDRs (Brazilian Depositary Receipts) de ETFs (Exchange Traded Funds), esse tipo de investimento é uma espécie de fundo de estratégia passiva, que segue uma carteira de composição predefinida e é negociado em Bolsa como uma ação.

Dos 8 produtos lançados há cerca de um ano, 6 seguem o rendimento dos títulos públicos emitidos pelo governo americano, chamados de "treasuries", com diferenças entre o prazo médio de duração dos títulos, e dois acompanham papéis de dívida corporativa.

Segundo Paula Salamonde, diretora do segmento institucional e ETFs iShares da BlackRock Brasil, a demanda pelos BDRs de ETFs de renda fixa global, que têm valores iniciais de investimento em torno de R$ 50, começou a ganhar tração no fim do ano passado, depois que o Fed já havia avançado no processo de aperto monetário, com a taxa de juros acima do patamar de 4% ao ano.

Com um patrimônio combinado de aproximadamente R$ 46 milhões em dezembro de 2022, os fundos de índice, como também são conhecidos os BDRs de ETFs, alcançaram em fevereiro um volume de R$ 87 milhões, praticamente dobrando de tamanho em dois meses. Já a média do volume diário negociado foi de R$ 8 milhões em fevereiro.

Embora ainda se trate de quantias relativamente modestas, principalmente para os padrões da BlackRock, a executiva diz que o rápido crescimento em um curto espaço de tempo indica o interesse e o potencial da classe de ativos no país.

"O fluxo está partindo tanto do investidor pessoa física quanto do institucional, por causa da oportunidade que eles estão enxergando. É um ativo de risco muito baixo, com retorno acima de 4,5% ao ano", afirma Paula, acrescentando que, por ser negociado originalmente no mercado americano, os BDRs de ETFs também acompanham a variação do dólar ante o real.

"Desde as eleições do ano passado, notamos o investidor brasileiro buscando cada vez mais ativos dolarizados, diante das incertezas da economia e da política no Brasil", afirma Cauê Mançanares, CEO da Investo, gestora que lançou em julho de 2022 dois ETFs cuja proposta também é a de acompanhar índices de renda fixa no exterior que replicam uma carteira teórica composta por milhares de títulos de dívida.

O USDB11 acompanha o ETF americano BND (Vanguard Total Bond Market ETF) e foca apenas o mercado de renda fixa dos EUA, com cerca de 70% da carteira investida em títulos do Tesouro americano e 30% em títulos de dívida. Já o BNDX11 tem sua performance atrelada ao BNDX (Vanguard Total International Bond ETF), que acessa o mercado global de renda fixa, com foco em ativos da Europa, do Pacífico e dos Estados Unidos.

Com volume médio mensal de R$ 17 mil e R$ 6.200 no mês de lançamento das estratégias, respectivamente, os ETFs vêm aumentando o giro de negociação —em março, o volume médio alcançou R$ 520 mil e R$ 150 mil em cada um dos fundos.

Os ETFs foram lançados com valores de R$ 100 e hoje são negociados na Bolsa em torno dos R$ 90. A desvalorização, explica Mançanares, se deve ao efeito da marcação a mercado, com o impacto negativo do processo de aumento dos juros pelo Fed para os preços dos títulos replicados nas carteiras dos ETFs.

Paula, da BlackRock, afirma que a gestora prevê a manutenção dos juros americanos no patamar atual, com uma possível redução das taxas em meados do segundo semestre. Ela diz que a crise no setor bancário global, com redução na demanda por crédito, contribui para que o Fed interrompa o ciclo de alta dos juros.

Corretoras oferecem aplicação direta em títulos, mas com valores de entrada mais elevados

Responsável pela área de pesquisa de renda fixa da XP Investimentos, Camilla Dolle diz que, apesar do patamar de 13,75% da Selic, faz sentido o investidor considerar a alocação de um pedaço da carteira em renda fixa no exterior.

Dessa forma, ele diversifica o portfólio em outras geografias consideradas mais seguras, se expõe a uma moeda forte como o dólar e se aproveita de um momento no qual a taxa de juros nos Estados Unidos se encontra em um nível historicamente elevado para os seus padrões, afirma a especialista.

"Estar alocado em títulos do Tesouro dos EUA é interessante porque o rendimento subiu bastante nos últimos meses, e a expectativa é que isso em algum momento no próximo ano deva se reverter, então é um momento propício para aproveitar", endossa Bruno Mori, economista e sócio fundador da consultora Sarfin.

A XP lançou em maio de 2022 um serviço de conta internacional, em que o cliente tem acesso a investimentos no exterior por meio do aplicativo da corretora.

Em março de 2023, a XP passou a oferecer pela conta internacional o investimento direto em "treasuries", com aporte mínimo a partir de US$ 5.000. Em outubro, a corretora já havia disponibilizado o investimento em "bonds", que são os títulos corporativos negociados no mercado americano, também com valores a partir de US$ 5.000. Para ter acesso à conta internacional da XP, o cliente precisa ter patrimônio líquido superior ou igual a R$ 10 mil na corretora.

Na Avenue, corretora que oferece a abertura de contas no exterior para brasileiros, não é preciso ter um patrimônio mínimo, mas os valores para investir em títulos do governo americano ou de empresas é mais alto, a partir de US$ 10 mil.

Segundo Guilherme Zanin, analista da Avenue, enquanto os títulos do governo americano pagam um juro em torno de 4,75% ao ano, no caso dos títulos corporativos, é possível encontrar papéis de nomes conhecidos do investidor brasileiro, como Google e Amazon, com taxas que variam de 5% a 6%, sempre em dólar.

Zanin afirma que um investimento mais acessível pela plataforma são os ETFs de renda fixa no exterior, com aportes que começam a partir de US$ 1. Ele diz que são mais de 800 ETFs de renda fixa negociados no mercado americano, com diferentes estratégias entre títulos públicos e títulos corporativos com variados níveis de risco.

O analista acrescenta que o investidor também consegue acessar pela plataforma fundos de investimento de renda fixa de gestão ativa, em que os gestores estão constantemente rotacionando a carteira em busca das melhores oportunidades no mercado. Nesse caso, o tíquete mínimo começa a partir de US$ 2.000.

Com o crescimento das plataformas digitais de investimento, o investidor também consegue encontrar nelas fundos de renda fixa global de grandes gestoras, como Oaktree e Man Group, com valores de entrada mais baixos, a partir de R$ 500.

"A gente acha que o investidor pessoa física dificilmente tem vantagem competitiva em tentar escolher os melhores ativos sozinho, em comparação com gestoras especializadas com centenas de analistas olhando para os mercados todos os dias", afirma Ian Caó, sócio-fundador e diretor de investimentos da Gama, empresa que atua na distribuição de fundos globais por meio de parcerias com grandes plataformas.

No entanto, pela legislação do mercado local, a maior parte da oferta hoje ainda é restrita ao investidor considerado qualificado, que é aquele com mais de R$ 1 milhão em investimentos.

O analista da Avenue diz que, com o aumento da aversão ao risco na esteira da crise bancária, tem percebido um movimento chamado de "fly to quality", ou voo para a qualidade, na tradução para o português, em que os investidores priorizam os investimentos no mercado americano, por ser considerado o mais seguro entre as principais opções de investimento disponíveis globalmente.

"Em momentos de aversão ao risco, os títulos considerados os mais seguros do mundo, com remuneração acima de 4,5%, acabam atraindo muitos investidores."

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