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É enganoso vídeo em que mulher acusa Lula de ter criado taxas sobre compras em sites internacionais

Segundo governo, só encomendas de até US$ 50 entre pessoas físicas sem fins comerciais não pagam Imposto de Importação

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São Paulo

São enganosas as afirmações de uma mulher que, em vídeo, critica o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por impostos cobrados por compra feita em site internacional. Na gravação, a autora exibe o valor da compra (R$ 266,54) e reclama que os produtos estão parados na alfândega até que ela pague R$ 521,97 de impostos, o que ela se nega a fazer. Sem citar o nome de Lula, ela diz: "Olha o que que o bandido ladrão está fazendo com os meus pacotinhos da Shein". Isso sugere que foi o atual presidente quem determinou a cobrança do imposto para compras de menos de US$ 50 (a dela deu US$ 44,93), o que não é verdade —o imposto já existia, ela apenas foi pega na fiscalização da Receita Federal.

Em nota sobre importação por pessoas físicas, o governo explica que, atualmente, "todas as compras, mesmo as de baixo valor, pagam 60% de tarifa à Receita Federal caso sejam pegas na fiscalização, hoje feita por amostragem". Apenas encomendas entre pessoas físicas sem fins comerciais não pagam o Imposto de Importação se não ultrapassarem US$ 50. "A Receita Federal monitora empresas que abusam do artifício para se passar por pessoa física." O imposto de importação incide sobre o valor das mercadorias, o do frete e o do seguro (que compõem o valor aduaneiro), não apenas sobre o valor total que o consumidor paga ao site.

"O benefício (de isenção de imposto para encomendas entre pessoas físicas) existe desde 1980, com o valor de US$ 100, e teve o limite reduzido pela metade no fim da década de 90", informa o texto, como verificado pelo Projeto Comprova. Ou seja, diferentemente do que diz a autora do vídeo, não foi o governo Lula que impôs as taxas de importação.

Pessoa de máscara e uniforme azu marinho olha para esteira com várias caixas de produtos de diferentes cores e tamanhos. Caixas, em primeiro plano, estão desfocadas
Centro de logística em Linyi, na China; produtos comprados em sites internacionais como Shein podem ser taxados quando chegam ao Brasil - Xu Chuanbao - 11.nov.2022/Xinhua

No documento exposto pela autora do vídeo, também aparece a cobrança de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), uma taxa estadual, e não federal, como ela coloca ao criticar o presidente. No caso da compra dela, o ICMS tem alíquota de 25%. Essa taxa incide sobre o valor aduaneiro, sobre o do imposto de importação e sobre o próprio valor do ICMS.

A discussão sobre taxação de produtos internacionais se intensificou após o governo anunciar que acabaria com a isenção do imposto de importação em envios abaixo de US$ 50 remetidos por pessoas físicas, mas, neste 18 de abril, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), recuou da medida.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance

O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O vídeo, publicado em grupo do Telegram no dia 12 de abril, teve 8,7 mil visualizações até 19 de abril.

Como verificamos

A reportagem coletou todos os dados aparentes nas folhas de papel expostas no vídeo que poderiam ajudar a localizar o pedido taxado ou identificar a mulher que gravou o conteúdo enganoso —os dados cadastrais da cliente no site da Shein e o código de rastreio do produto no site dos correios estavam expostos.

Pausando a cena em frames específicos, foi possível anotar o nome da autora do vídeo, o seu endereço e a cidade onde ela mora.

Buscando no Google o nome da mulher e a cidade identificada, apareceu uma clínica veterinária com o nome igual ao do cadastro da Shein (a fachada do comércio também tinha um número de WhatsApp).

A clínica veterinária não pareceu ser uma coincidência, pois o endereço do consultório ficava a 10 minutos a pé do endereço da pessoa física exibido no vídeo enganoso.

O Projeto Comprova, então, entrou em contato com o número de WhatsApp exposto e, em resposta, a médica veterinária afirmou ter compartilhado o vídeo sobre a taxação de sua compra no e-commerce chinês.

Em cooperação com a checagem, a médica veterinária enviou os documentos usados no vídeo para a reportagem.

A equipe também pesquisou sobre a cobrança de impostos em sites como os dos Correios e da Receita Federal e também reportagens sobre o tema.

O que diz o responsável pela publicação

Procurada pela reportagem, a autora do post afirmou que o que motivou a divulgação do vídeo foi uma "revolta com o ladrão que está taxando qualquer muambinha que a gente compra na Shein. Quando a gente viaja para o exterior temos direito a uma cota para compras internacionais. Compro poucas coisas para consumo próprio".

O que podemos aprender com esta verificação

Ao se deparar com conteúdos que fazem uma grande denúncia, o primeiro passo é buscar reportagens em sites de veículos profissionais sobre o assunto. Depois de uma rápida pesquisa já seria possível verificar se tratar de um conteúdo duvidoso, uma vez que a mudança de cobrança de imposto (da qual o governo recuou, como informado) havia sido apenas anunciada, não havia começado.

Por que investigamos

O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984. Sugestões e dúvidas relacionadas a conteúdos duvidosos também podem ser enviadas para a Folha pelo WhatsApp 11 99486-0293.

Outras checagens sobre o tema

O Comprova verificou recentemente que tributo para taxar compras em sites internacionais como Shein e Shopee existe desde 1999.

A investigação desse conteúdo foi feita por Folha e UOL e publicada em 19 de abril pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 41 veículos na checagem de conteúdos virais. Foi verificada por Estadão, O Popular, Grupo Sinos, SBT e SBT News.

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