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Réplica: O BNDES e o Plano Marshall

Tesouro Nacional injetou 0,24% do PIB ao ano, não 1,5%, como afirma artigo de Marcos Mendes

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Gilberto Borça Jr.

Mestre em economia pelo IE-UFRJ, economista do BNDES e pesquisador associado ao Ibre/FGV

Jose Antonio P. Souza

Doutor em economia pelo IE-UFRJ e economista do BNDES

O debate sobre o papel do BNDES na economia brasileira é necessário e bem-vindo, mas convém separar o joio do trigo nas opiniões que volta e meia retornam à mídia.

Recentemente Marcos Mendes publicou nesta Folha mais um texto equivocado sobre o BNDES, onde afirma: "Nos quatro anos entre 1948 e 1951, o Plano Marshall custou, em média, 1,1% do PIB norte-americano por ano. Com esses recursos viabilizou-se a reconstrução da Europa no pós-guerra. O Tesouro Nacional injetou no BNDES 1,5% do PIB por ano, ao longo de sete anos (2008-15), e colhemos mais problemas que soluções".

Ao utilizar uma comparação grandiloquente, o colunista da Folha acabou cometendo alguns equívocos.

Logo do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) na entrada de sua sede, no Rio de Janeiro
Logo do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) na entrada de sua sede, no Rio de Janeiro - Sergio Moraes/Reuters

Primeiro, a maior parte do Plano Marshall foi uma transferência dos EUA a países europeus, em dólar, sob condicionalidades estritas. Já a "injeção" de recursos do Tesouro no BNDES foi empréstimo! Em outras palavras, estava programado que o BNDES pagaria de volta os recursos ao Tesouro, o que vem acontecendo desde 2015, em processo iniciado pelo governo Dilma.

Segundo, como é corriqueiro em artigos alarmistas sobre o "perigo claro e iminente" da reestruturação do BNDES, Mendes erra o cálculo relativo ao custo dos aportes do Tesouro no BNDES. Em valores nominais, de 2008 a 2022, a União "aplicou" R$ 441 bilhões no BNDES e "sacou" R$ 688 bilhões do banco. Ainda falta um "pré-pagamento" de R$ 23 bilhões, do BNDES ao Tesouro, mas considerando apenas o que já foi feito, a taxa interna de retorno nominal da operação para a União foi de 6,7% ao ano.

O ponto central do debate sobre o "BNDES do passado" é o custo de carregamento dos empréstimos da União ao banco. Segundo dados do Tesouro, de 2008 a 2022, a diferença entre o juro pago pelo Tesouro no mercado e o juro que o Tesouro recebeu do BNDES foi de R$ 146 bilhões em preços correntes.

Em paralelo ao custo de carregamento dos empréstimos ao BNDES (o que os economistas chamam subsídio implícito), o Tesouro gastou R$ 60 bilhões, também a preços correntes, com equalização de juros em empréstimos concedidos pelo BNDES com os recursos emprestados pela União (o que os economistas chamam subsídio explícito).

O valor total da operação "empréstimo e equalização" para o BNDES foi, portanto, de R$ 206 bilhões em 15 anos (R$ 13,7 bi por ano). Em proporção do tamanho da economia, o total de subsídios implícitos e explícitos via BNDES foi de 3,7% do PIB de 2008-22, ou 0,24% do PIB por ano, valor cinco vezes menor do que os 1,5% do PIB mencionados por Mendes!

Apesar de o BNDES do passado ter custado muito menos do que o Plano Marshall, os leitores devem estar se perguntando: gastar 0,24% do PIB com subsídio financeiro é alto ou baixo para o Brasil? Esta é a pergunta relevante, cuja reposta depende de avaliação tanto dos custos quanto dos benefícios da medida. Mendes considerou apenas os custos.

As críticas ao BNDES do passado partem do pressuposto de que toda e qualquer atuação do banco teve impacto zero sobre a economia - o que é um dos casos possíveis, não o único caso possível. A literatura sobre o impacto do BNDES na economia também inclui resultados positivos sobre o PIB, emprego e arrecadação tributária, ou seja, a literatura indica que parte do subsídio concedido volta ao Tesouro na forma de receita adicional de impostos.

Quanto volta? Este é o debate que o BNDES do futuro pretende retomar, mas para que o processo seja construtivo, é preciso abandonar sofismas ideológicos do passado, além de saber diferenciar empréstimo de transferências.

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