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Brooke Masters

A dura vida de quem tenta viajar com um carro elétrico nos EUA

Infraestrutura não está pronta para um crescimento rápido, apesar das promessas do governo Biden

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Brooke Masters

Comentarista-chefe de negócios do jornal Financial Times

Nos últimos meses, o nosso novo carro elétrico funcionou perfeitamente. Um dos primeiros SUVs BMW iX a chegar ao mercado dos Estados Unidos, o modelo atrai elogios de manobristas de estacionamento e entusiastas de carros. O carregador rápido que instalamos em nossa garagem o alimenta facilmente para o deslocamento diário.

Então tentamos levá-lo para a estrada. A falta de estações de carregamento na maior parte da região centro-oeste tornou essa rota impossível.

Então, ao longo das rodovias supostamente bem servidas entre Boston, Nova York e Washington, encontramos diversas telas que não respondem aos toques, conectores sem conexão e carregamento muito lento. Em um ponto com oito estações, as três primeiras que tentamos não funcionaram.

Tesla Model S conectado a uma estação de carregamento de carros elétricos da companhia em Virgínia, EUA - Saul Loeb - 13.fev.2023/AFP

Para piorar as coisas, nossos dois anos de carga "grátis" financiados pela BMW desapareceram do sistema no meio da viagem, forçando-nos a pagar e pedir reembolso mais tarde. Os grupos de discussão online estão cheios de histórias semelhantes, sugerindo que a minha não foi uma experiência isolada.

Isso pode ser doloroso: o número de VEs (veículos elétricos) nas estradas dos EUA se multiplicou em cinco anos para três milhões, e muitas das 135 mil estações de recarga públicas são novas. Porém, isso também levanta perguntas sobre se o foco em fabricar e vender veículos elétricos nos levou a negligenciar as mudanças que deixarão as pessoas felizes quando tiverem um.

A AIE (Agência Internacional de Energia) prevê que um em cada cinco carros novos vendidos este ano serão VEs, contra um em 25 três anos atrás. Grande parte do crescimento se concentra na China, que apostou cedo na tecnologia e apoiou com subsídios fabricantes, compradores e fornecedores de eletricidade.

A adoção de veículos elétricos foi tão rápida que as montadoras estrangeiras não conseguiram acompanhar, permitindo que marcas chinesas como a BYD conquistassem participação de mercado.

No Ocidente, a experiência da Noruega é instrutiva. Os VEs com bateria saltaram de 20% dos carros novos para 80% em menos de cinco anos, graças a incentivos fiscais. No entanto, a infraestrutura de recarga teve dificuldade para acompanhar o ritmo, apesar do amplo apoio do governo, levando a longas filas nos postos de recarga nas rodovias nos feriados prolongados.

A experiência dos Estados Unidos provavelmente será ainda mais acidentada. A administração Biden anunciou planos de ter 500 mil estações de carregamento públicas até 2030, mas isso está muito longe da China, onde 1,8 milhão já estão em funcionamento e o governo prevê 20 milhões até 2025.

A situação nos Estados Unidos é complicada pelo fato de que a Tesla, que detém mais de 60% de participação no mercado de VEs, opera uma rede de recarga proprietária e até recentemente se recusava a abri-la para outras marcas. Mas isso está começando a mudar. A Volkswagen, que opera a maior rede do país, a Electrify America, tornou-a deliberadamente de acesso aberto.

A Ford anunciou na quinta-feira (25) um acordo que dará a seus veículos acesso a 12 mil Superchargers da Tesla.

O executivo-chefe da Ford, Jim Farley, argumenta que adicionar carregadores reduzirá não apenas o tempo de espera, mas também o custo geral dos veículos elétricos. Os clientes terão mais praticidade com baterias menores e mais baratas que percorrem 320 km, em vez de 640 km como muitos fabricantes estão tentando. "Devemos fazer a menor bateria possível", disse ele.

O encolhimento das baterias também ajudaria a resolver outro problema emergente. Se os padrões atuais se mantiverem, converter apenas a frota dos EUA em VEs exigiria três a quatro vezes mais lítio do que o mundo inteiro produz.

"Você precisa de um aumento de escala de 1.500 vezes na mineração, processamento, fabricação e depois o que você faz com isso no final", diz Keith Czinger, um dos pioneiros em VEs. "Qual é o impacto disso no meio ambiente?"

Até agora, os fornecedores de carga para VEs falharam em resolver o problema de que o processo leva muito mais tempo do que abastecer com gasolina. Ninguém quer ficar preso num estacionamento de shopping por 45 minutos, como eu fiquei no mês passado.

A história sugere que alguém vai aproveitar bem essa oportunidade. O Wall Drug de Dakota do Sul se tornou um destino turístico nacional, ao oferecer água gelada de graça aos viajantes para o Monte Rushmore nos dias anteriores ao ar-condicionado em carros.

A construção do sistema de rodovias interestaduais ajudou a impulsionar a rápida disseminação do McDonald's e seus concorrentes, especialmente depois que eles abriram as janelas "drive-through".

Porém, a nascente indústria de carga elétrica até agora não conseguiu monetizar a crescente demanda. As ações da EVGo e da Chargepoint caíram 80% em relação aos picos de 2021, e a Volta se vendeu para a Shell com uma perda semelhante no início deste ano.

A falta de infraestrutura tem consequências reais. As preocupações com a recarga ajudaram 25% dos primeiros compradores de carros elétricos dos EUA a voltar para o motor de combustão interna, segundo um estudo do governo. A parcela de americanos que dizem que é "muito improvável" comprar um VE está aumentando. Se essa é a onda do futuro, há mar agitado pela frente.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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