Fernández faz coro a Lula e diz que Argentina quer 'acordo balanceado' com UE

Ao lado de Ursula von der Leyen, presidente argentino afirma que ainda existem barreiras, mas que elas não são difíceis de resolver

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Buenos Aires

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fez coro a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e afirmou que o país quer um acordo balanceado entre União Europeia e Mercosul. Ao lado da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ele sinalizou que ainda há entraves à aprovação do texto, mas que eles não são difíceis de resolver.

Os dois líderes se reuniram nesta terça-feira (13) na Casa Rosada, em Buenos Aires, um dia depois que a alemã foi ao Palácio do Planalto, durante um giro que está fazendo pela América Latina. Após o encontro em Brasília, Lula criticou exigências ambientais extras dos europeus e disse que a premissa das negociações não deve ser "desconfiança e sanção".

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em encontro com o presidente argentino Alberto Fernández na Casa Rosada - Juan Mabromata/AFP

Fernández também mostrou discordâncias, mas em tom menos duro: "Queremos efetivamente um acordo com a União Europeia, mas que balanceie as economias de cada uma das regiões. E que tenha em conta essa simetria, porque de outro modo pode ser [...] um acordo que beneficia mais a União Europeia e não tanto a nós", afirmou à imprensa em declaração conjunta após a conversa.

Ele pediu, porém, que não seja "mal interpretado" depois que a líder europeia foi questionada sobre uma aparente resistência dos dois países sul-americanos. "Não tomem o que falei como se não estivéssemos alinhados", declarou. "Estarei muito contente se firmarmos esse acordo até o fim do ano", adicionou.

Segundo o líder peronista, existem "temas pontuais para destravar o acordo, e não para travá-lo", e há vontade política para fazê-lo. Negociada desde 1999, a parceria comercial entre os blocos foi assinada em 2019, no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), mas vive um impasse desde então, sem a ratificação pelos dois lados.

"[Os problemas] têm a ver com o protecionismo de alguns países da Europa na produção agrícola e de grãos. E um outro problema é o Pacto Verde que a Europa assinou para melhorar o desenvolvimento europeu, mas que inevitavelmente afeta o acordo. [...] São problemas que podemos resolver, não são difíceis", afirmou.

Fernández disse ainda considerar que a preocupação da Europa, principalmente do presidente francês Emmanuel Macron, com o desmate da Amazônia "desapareceu" desde que Lula assumiu, "porque o presidente [brasileiro] não participa dessas políticas, e, ao contrário, ele e [a ministra] Marina Silva são grandes promotores do cuidado com o meio ambiente".

O Parlamento Europeu aprovou em abril uma lei que proíbe a venda no continente de produtos oriundos de desmatamento em florestas, o que abrange gado, madeira, soja, café, cacau, borracha e dendê, além de seus derivados, como couro, chocolate, móveis, carvão vegetal e produtos de papel.

O acordo atual entre UE e Mercosul tem padrões de sustentabilidade que não são obrigatórios, por isso os blocos estão negociando um termo adicional, chamado de "side letter", que torna esses compromissos ambientais uma exigência. Em entrevista no final de abril, Lula já havia dito que a atual proposta era impossível de ser aceita.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, no Palácio Do Planalto - Gabriela Biló/Folhapress

A França é um dos principais opositores do acordo nos termos atuais. O país defende, entre outras coisas, a inclusão do que seriam "cláusulas espelho", isto é, os produtos só podem entrar na União Europeia se seguirem as mesmas condições que o bloco impõe internamente.

Von der Leyen, por sua vez, repetiu no pronunciamento que há agora "uma janela de oportunidade" para fechar o acordo politicamente e que quer concretizá-lo até o final do ano —depois disso, o texto ainda teria que passar por análises técnicas e pelo Parlamento Europeu, por exemplo, até que entre em vigor.

"Nós mandamos a primeira carta e estamos esperando a sua resposta [...] o mais rápido possível", declarou ela a Fernández, também em tom mais ameno do que parece ter dirigido a Lula. Ao presidente brasileiro, a alemã disse que espera "com impaciência" um retorno para ouvir o que o país tem a propor.

Em seu discurso, a política, considerada uma das mulheres mais poderosas do mundo, insistiu várias vezes que a União Europeia "quer ir além" nas relações com a Argentina, que já tem o bloco europeu como maior parceiro, equivalente a 40% dos investimentos estrangeiros —ela anunciou um aporte de 10 bilhões de euros (cerca de R$ 53 bilhões) em toda a América Latina durante a visita.

Ambos os líderes assinaram nesta terça um memorando de entendimento sobre matérias-primas, incluindo o lítio, mineral usado nas baterias de veículos elétricos cujo interesse disparou no último ano, diante da busca do Norte Global por fontes de energia mais limpas. A Argentina faz parte do "triângulo do lítio", que junto com Bolívia e Chile detém mais da metade das reservas mundiais.

Von der Leyen disse que a ideia é "ir além da mera extração, porque pensamos que é muito importante que o valor agregado na cadeia de transformação permaneça na região, gerando postos de trabalho e oportunidades empresariais para a Argentina".

Depois de Brasília e Buenos Aires, a política ainda deve passar por Santiago nesta quarta (14) e Cidade do México nesta quinta (15), atores relevantes do Sul Global, disputado pelos polos que se opõem na guerra entre Rússia e Ucrânia. As visitas acontecem um mês antes da conferência entre União Europeia e Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), nos dias 17 e 18 de julho em Bruxelas.

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