Cientista quer levar mandioca gigante à Paraíba

Segundo Nagib Nassar, professor emérito da UnB, variedade tem maior produtividade de farinha e amido

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São Paulo

Nascido no Egito, o cientista Nagib Nassar, 85, tenta levar à Paraíba uma variedade de mandioca com um tamanho maior, capaz de produzir mais farinha, amido e outros produtos. Segundo ele, que é professor emérito da UnB (Universidade de Brasília), as raízes do tubérculo têm de três a quatro vezes o tamanho de uma variedade comum.

A mandioca foi batizada de quimera. Na mitologia grega, o termo é dado a um monstro cuja aparência revela um híbrido de vários animais. Na pesquisa de Nassar, por sua vez, o nome indica que o tubérculo reúne características de duas variedades compatíveis –uma delas é silvestre e a outra, cultivada– que foram postas em contato para que sintetizassem a nova mandioca, sem qualquer tipo de cruzamento sexual.

"A quimera estimula a produção de raízes. Nós aumentamos o tamanho da raiz e, então, elevamos a produção de fécula, da farinha, do amido. Nós aumentaríamos a produção nacional duas ou três vezes", diz Nassar.

Nassar segura uma mandioca com comprimento maior do que seu corpo. Ele está ao lado de um laboratório. É possível var algumas plantas.
A quimera, mandioca desenvolvida pelo professor Nagib Nassar - Arquivo pessoal

De acordo com o pesquisador, a ideia é que, juntas com outras variedades de mandioca melhoradas pelo pesquisador, estacas da quimera sejam levadas a cinco agricultores paraibanos depois do período de seca do inverno deste ano. A finalidade é aumentar a produção local.

Para isso, o professor afirma ter submetido o projeto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Segundo ele, as tratativas ainda estão no início e ainda há muito para ser organizado. Procurada pela Folha, a pasta diz que ainda não há nada de concreto que possa ser divulgado sobre a iniciativa.

As quimeras foram desenvolvidas há cerca de oito anos, segundo Nassar, e serão propagadas para os agricultores.

De acordo com o cientista, também devem ser escolhidas casas de farinha para receber instruções sobre como enriquecer a farinha da mandioca por meio da folha do tubérculo. A adição, diz ele, é capaz de elevar o teor proteico de 1% para 9%.

Em seu mestrado, concluído em 2019, a agrônoma Deziany da Silva Ferreira, 28, usou as quimeras desenvolvidas por Nassar, seu coorientador à época, entre as variedades de mandioca analisadas pelo projeto. Ao final da experiência, ela verificou que as quimeras tinham boa resistência aos nematóides, vermes microscópicos que causam danos às raízes das plantas, e também era capaz de transferir resistência de uma variedade a outra em um curto período de tempo.

Segundo Ferreira, a pesquisa foi bancada pela Funagib, fundação criada por Nassar para promover e subsidiar, com recursos próprios, pesquisas sobre a mandioca.

"Foi um trabalho muito interessante. É muito importante, principalmente para a África, que utiliza muito a mandioca como manufatura", diz ela.

A fundação foi criada por Nassar depois de ele ter sido condecorado, em 2014, com o Kuwait International Prize of Environment por suas pesquisas em torno do melhoramento da mandioca. O cientista recebeu US$ 100 mil (cerca de R$ 250 mil, à época).

Há quase 50 anos no Brasil, Nassar veio ao país em 1974 para estudar a cultura da mandioca na região. Coletou e catalogou variedades silvestres e ajudou, ainda no século passado, a desenvolver um híbrido resistente ao mosaico africano, uma praga que assolou as plantações do tubérculo em países da África e causou fome na região.

Fora do meio acadêmico, o melhoramento genético da mandioca faz parte das pesquisas do IAC (Instituto Agronômico), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, desde a década de 1930, segundo José Carlos Feltran, pesquisador da instituição.

Ele afirma que o desenvolvimento de uma nova variedade melhorada pode levar mais de 12 anos e custar de US$ 1 milhão a US$ 2 milhões (cerca de R$ 4,8 milhões a R$ 9,7 milhões). "São considerados a equipe envolvida, a estrutura física, que inclui prédios, laboratórios, fazendas, veículos etc., e o salário das pessoas nesse tempo. Quem financia isso é o poder público", diz.

Diferentemente da técnica utilizada pelo professor Nagib, o melhoramento da mandioca no IAC cruza as variedades. Feltran explica que, a partir disso, é feita uma seleção a cada plantio com as plantas resultantes daquela fecundação até encontrar uma nova variedade com as características desejadas.

Até hoje, foram 24 novas variedades liberadas para agricultores pelo IAC, segundo Feltran, algumas para mesa (consumo humano) e outras para a indústria.

"A mandioca, para a indústria, tem como ponto principal a produção de farinha e amido. Ela tem alta produtividade, resistência a bacteriose, alto teor de matéria seca nas raízes, o que resulta em alto rendimento de farinha e fécula na indústria, e elevado teor de ácido cianídrico, que forma o cianeto, presente na raiz. Essas variedades não servem para consumo humano", explica.

A última variedade de mandioca catalogada pelo IAC, em 2021, tem de 680 a 800 unidades internacionais de vitamina A por cem gramas de raiz, de acordo com Feltran –mais que o triplo observado em outra variedade anterior.

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