Por que a Suíça, logo ela, está importando tanto queijo?

País importou mais do produto que exportou neste ano, uma preocupação para agricultores e tradicionalistas

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Claire Moses
The New York Times

Os suíços têm orgulho de seu queijo, e a maioria dos que consomem são variedades locais, como Gruyère, Emmental e outros queijos duros de leite de vacas felizes que são famosos no mundo todo. Os suíços também comem muito queijo: mais de 22 kg por pessoa por ano, em comparação com cerca de 18 kg por pessoa nos Estados Unidos.

"O queijo faz parte da nossa identidade", disse Daniel Koller, diretor da Swissmilk, a associação de laticínios da Suíça. É por isso que um dos colegas de Koller, o presidente da associação, criou uma tempestade este mês quando disse a um jornal suíço que o país estava a caminho de importar mais queijo do que exporta este ano, o que ele chamou de "absurdo –econômica, social e ecologicamente".

De fato, a balança comercial do queijo suíço vem encolhendo há décadas, especialmente desde que o mercado foi liberalizado em 2007, o que permitiu ao país negociar com a União Europeia sem tarifas ou cotas em qualquer direção. A Suíça exporta hoje cerca de 40% do queijo que produz, segundo estimativas da indústria.

Depósito de Gruyère em Bulle, na Suíça; país tem importado mais queijos que exportado - Fabrice Coffrini - 29.ago.2011/AFP

Mas em cada um dos primeiros cinco meses deste ano o país importou mais queijo por peso do que vendeu no exterior, segundo dados da alfândega. Em parte, isso ocorre porque os suíços desenvolveram o apreço por queijos estrangeiros, com as variedades locais respondendo por 64% do consumo no ano passado, abaixo de 77% em 2007, de acordo com a Swissmilk.

O número de produtores de leite na Suíça caiu nas últimas décadas –mais da metade nos últimos 25 anos, disse Koller. Além disso, as operações agrícolas na Suíça são pequenas: o tamanho médio de um rebanho é de cerca de 27 vacas, disse Koller, e fazendas leiteiras com mais de cem vacas são raras.

Embora um influxo de queijo estrangeiro possa desafiar as noções de identidade nacional suíça, os economistas dizem que não há necessidade de pânico. Os produtores suíços tornaram-se mais especializados nos últimos anos, e os queijos que exportam tendem a ser as variedades de maior valor, como o Gruyère. As importações são mais baratas –e mais suaves– e vêm principalmente da França. (O que é chamado de "queijo suíço" nos Estados Unidos é uma reprodução americana de queijos duros suíços, conhecidos –é claro– por seus característicos buracos.)

Nem todo o queijo importado para a Suíça também é consumido lá. Grande parte do queijo e da coalhada levados para o país é refinada na Suíça e depois exportada.

"A diferença comercial no queijo em si não é uma grande preocupação", disse Martin Mosler, economista do IWP, instituto de política econômica da Universidade de Lucerna. "Somos melhores do que a maior parte do mundo em produtos de alta qualidade", disse ele. A Suíça continua tendo um superávit comercial saudável em queijo por valor financeiro: em média, as exportações de queijo suíço chegam a cerca de 10 francos suíços (R$ 50,45) por quilo, em comparação com cerca de 6 francos suíços por quilo pagos pelas importações.

A inflação também desempenhou um papel importante no comércio de queijo suíço. Embora 2021 tenha sido um ano recorde para as exportações suíças, o ano passado registrou uma queda porque o maior mercado da Suíça, a Alemanha, foi duramente atingido pela inflação, apertando o orçamento dos compradores. O forte franco suíço também tornou o queijo mais caro na Alemanha.

"Esses consumidores são muito sensíveis ao preço", disse Mosler.

Por outro lado, o franco forte tornou as importações mais baratas, e o aumento das importações pode ser bom para os consumidores locais, disse Mosler. As pessoas querem mais opções por preços mais baixos e "isso é ótimo para a própria Suíça", disse ele.

Mas os agricultores suíços que produzem queijos mais baratos podem ser afetados pela mudança na balança comercial.

Os preços do leite na Suíça aumentaram nos últimos anos, inclusive do leite usado no queijo, de acordo com Robert Finger, professor da universidade ETH Zurich. Ainda não está "muito ruim", mas ele reconhece que o número de fazendas continua caindo na Suíça, como no resto da Europa. Isso não está fortemente relacionado ao aumento das importações, disse Finger, mas foi impulsionado principalmente por outros desenvolvimentos econômicos e sociais.

Os Estados Unidos tiveram tendência semelhante, com uma perda de cerca de metade de seus produtores de leite entre 1997 e 2017, em parte causada pela consolidação do sistema alimentar, o desaparecimento de muitas pequenas fazendas familiares e os preços mais baixos do leite em todo o mundo, disse Hannah Tremblay, gerente de políticas e defesa da Farm Aid, organização agrícola sem fins lucrativos.

Koller, diretor da Swissmilk, disse que é importante continuar produzindo queijo suíço para os consumidores suíços. Um dos objetivos de sua organização é incentivar as pessoas a comprar produtos locais que cumpram os altos padrões ambientais e de qualidade da Suíça.

Mas, gostos à parte, acrescentou ele, a qualidade e os padrões nos países da União Europeia geralmente não diferem muito dos suíços. "Não faz sentido apenas fechar as fronteiras para o queijo", disse Mosler.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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