Descrição de chapéu Financial Times LGBTQIA+

Conheça a pessoa mais sênior do Goldman Sachs que se assume como transgênero

A revelação de Maeve DuVally em 2019 foi um divisor de águas para Wall Street

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Joshua Franklin
Nova York | Financial Times

De boicote a cerveja a vitrines de lojas vandalizadas por mostrarem trajes de banho especiais para "esconder o volume", talvez seja um momento desafiador para as empresas americanas avaliarem as questões transgênero. Maeve DuVally acha que elas têm de encontrar uma maneira.

DuVally, 62, era diretora administrativa da equipe de comunicação corporativa do Goldman Sachs quando, em 2019, tornou-se a pessoa mais velha na história da empresa a se assumir como transgênero. Sua revelação em um artigo do New York Times foi um divisor de águas para Wall Street, ligando a questão a uma instituição como o Goldman, num setor que tem lutado para superar sua cultura dominada pelos homens.

O livro de memórias de DuVally, "Maeve Rising: Coming Out Trans in Corporate America" [A ascensão de Maeve: revelando-se trans na América corporativa], foi publicado esta semana. Ela espera que sua experiência de conciliar sua transição com o trabalho e a vida familiar possa servir de roteiro para outras pessoas trans, bem como para empresas que tentam ajudá-las em seu caminho.

Em uma entrevista no escritório do Financial Times em Nova York, DuVally me disse: "Decidi, nesta fase da minha vida, que queria fazer algo que desse mais em retorno à comunidade LGBTQ+".

Imagem mostra mulher sorrindo. Ela veste um blazer preto e uma camisa listrada.
Maeve DuVally na sede do Goldman Sachs, em Nova York - Gabriella Angotti-Jones - 17.ago.23/The New York Times

O clima corporativo é indiscutivelmente ainda mais complexo hoje do que quando DuVally se revelou, em 2019. Para a marca Bud Light da cervejaria Anheuser-Busch InBev, uma colaboração aparentemente inócua neste ano com uma personalidade transgênero do TikTok e atriz foi o catalisador para um boicote dos conservadores.

Ron DeSantis, o pré-candidato presidencial republicano e governador da Flórida, disse recentemente para clientes num bar em uma parada da campanha que "lhes daria qualquer coisa, menos Bud Light. Não posso fazer isso".

Vândalos atacaram a loja americana Target em reação a vídeos publicados nas redes sociais, alegando falsamente que a empresa estava vendendo roupas de banho de tamanho infantil projetadas para ajudar pessoas transgênero a esconder os órgãos genitais.

DuVally classificou como "desprezíveis" os políticos que deslegitimam pessoas transexuais para defender teses políticas, e disse que isso apenas aumenta a necessidade de as empresas fornecerem um ambiente seguro para seus funcionários.

"Precisamos que a América corporativa ofereça seu apoio", disse ela.

Com duas décadas de atuação em comunicações corporativas, DuVally entende melhor do que a maioria das pessoas as tensões entre querer passar mensagens corporativas bem-intencionadas e o risco de uma reação publicitária negativa.

"Não é necessariamente ruim que essa tensão aconteça. Mas o que quero dizer agora, tendo visto tudo isso no Goldman, [é] que existem diferentes maneiras como as empresas podem mostrar que apoiam uma população sub-representada", disse DuVally.

Ela indica o executivo-chefe do Goldman, David Solomon, que participou de uma foto em grupo no ano passado para marcar o dia internacional da visibilidade transgênero, como um pequeno exemplo dos gestos que as empresas podem fazer para tornar seus locais de trabalho mais tolerantes.

"O fato de David ter tirado um tempo do seu dia para descer e participar disso envia uma mensagem, tanto interna quanto externamente, de que a administração do Goldman Sachs apoia sua população trans", disse DuVally.

Lloyd Blankfein, ex-CEO do Goldman e ex-chefe de DuVally, tornou-se um dos primeiros defensores do casamento gay na América corporativa, movimento que, segundo ele disse mais tarde, custou alguns negócios ao banco.

Blankfein endossou o livro de DuVally, escrevendo que ele destaca como as dificuldades para os colegas podem ser muito mais fáceis "se eles sentirem que têm apoio para aparecer no trabalho como eles realmente são".

Maeve nasceu em Cork, na Irlanda, e cresceu principalmente em Providence (Rhode Island) e Rehoboth (Massachusetts). Ela trabalhou como jornalista financeira em Tóquio, Washington e Nova York, antes de se mudar para comunicações corporativas, primeiro na Merrill Lynch em 2002 e depois no Goldman em 2004, onde se tornou diretora administrativa. DuVally deixou o Goldman em 2022 —ela se demitiu em bons termos e ainda trabalha na empresa como consultora.

"A Ascensão de Maeve" é um olhar franco sobre sua vida, abrangendo uma infância difícil, décadas de alcoolismo que descarrilaram dois casamentos e a tortuosa jornada de se assumir para seus três filhos e seus chefes no Goldman.

Ela descreve seus primeiros dias, quando começou a se identificar como mulher, mas antes de se revelar no trabalho. Para manter o segredo, ela trocava secretamente seu terno por roupas femininas no final do dia e saía furtivamente do prédio.

"Toda a minha rotina de mudanças ao sair do trabalho foi empolgante no início, mas no final eu realmente não tive escolha a não ser deixar o emprego porque estava me causando dor", disse DuVally. "Realmente doía ficar reprimindo meu eu feminino, que se tornou bastante desenvolvido naquele momento."

Por sua própria experiência no Goldman, DuVally disse que a empresa fez um "bom trabalho" apoiando sua transição.

"Provavelmente daria uma história melhor se eu dissesse que não. Mas a realidade é que acho que sim. Há coisas que eles poderiam ter feito melhor? Provavelmente. Mas por que focar nisso quando a maioria das coisas que eles fizeram foi boa?", disse ela.

Seu seguro de saúde através do Goldman cobriu cirurgias caras, tratamentos hormonais e sessões de terapia. DuVally disse que a melhor coisa que o banco fez foi atribuir a ela um gerente de relacionamento dedicado para ajudá-la com qualquer coisa que surgisse. Um funcionário atencioso até trocou retroativamente todas as referências ao nome registrado na infância nas comunicações internas do banco para "Maeve".

"Cada transição é diferente", disse ela. "Portanto, cada vez que o Goldman passa pela transição de alguém e o ajuda com isso, eles adquirem um estoque de conhecimento mais profundo e serão mais capazes de ajudar a próxima pessoa."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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