Criptoativo é desafio no combate ao crime mesmo após lei de 2022

Livro aborda diversos aspectos que ainda precisam ser regulados pelo Banco Central

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São Paulo

Mesmo após passar a valer no Brasil uma lei específica para as criptomoedas, especialistas apontam uma série de desafios que ainda precisam ser enfrentados pelo país nesse setor, a começar pelo combate a crimes cometidos com ativos digitais, como bitcoin e ethereum.

Aprovada pelo Congresso no fim de novembro e sancionada em seguida por Jair Bolsonaro (PL), a lei dos criptoativos (número 14.478/22) entrou em vigor no dia 20 de junho deste ano, mas seus efeitos práticos foram quase inexistentes.

Isso porque a maior parte das regras para esse mercado ainda serão estabelecidas pelo Banco Central, definido como órgão responsável por regular os ativos digitais. Uma tarefa que, segundo o advogado Pierpaolo Cruz Bottini, está longe de ser simples.

   O economista Gabriel Galípolo e o advogado Pierpaolo Cruz Bottini
O economista Gabriel Galípolo e o advogado Pierpaolo Cruz Bottini - Iara Morselli/Divulgação

"A dificuldade, também discutida na União Europeia e nos Estados Unidos, é não engessar esse mercado, que é dinâmico e inovador, mas, ao mesmo tempo, regular o contato do mundo virtual de criptoativos com o mundo real, para evitar lavagem de dinheiro e todas as fraudes que podem ocorrer", afirma.

Professor de direito penal da USP, Bottini coordena desde o ano passado um grupo de pesquisa que acaba de publicar o livro "Criptoativos e Lavagem de Dinheiro", com evento de lançamento marcado para esta quinta-feira (17).

"É a faculdade tentando cumprir o papel dela, ao tratar de um tema atual, que ainda está sendo regulamentado", diz Bottini, que coordenou a edição do livro ao lado de Felipe Longobardi Campana e Marina Brecht, ambos estudantes de direito na pós-graduação da USP.

Fruto dos encontros conduzidos pelo grupo de estudos, a obra reúne artigos de diversos autores sobre o cenário internacional, o panorama regulatório nacional e os aspectos relacionados à repressão de crimes envolvendo criptoativos.

A ideia do grupo é manter proximidade com órgãos como Banco Central, Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e CVM (Comissão de Valores Mobiliários) para discutir os inúmeros aspectos que precisam de cuidado na regulamentação.

Por exemplo, o economista Gabriel Galípolo, atual diretor de Política Monetária do Banco Central, já participou de debates com o grupo de pesquisa.

Para Bottini, as reuniões sugerem otimismo: "Eu imagino, pelas conversas que o próprio grupo teve, que essa regulação do Banco Central vai seguir os parâmetros internacionais e vai permitir uma melhor prevenção à lavagem de dinheiro e à fraude nesse setor".

O advogado insiste no tema da lavagem de dinheiro por considerá-lo um dos principais pontos de atenção no universo das criptomoedas.

"Embora seja muito importante para o desenvolvimento das transações financeiras, o ativo digital é anônimo em muitas situações; ou seja, não se conhece o titular de um determinado ativo. Além disso, as transações internacionais são muito rápidas", afirma.

Sem criptoativos, uma pessoa enfrentará diversos obstáculos para movimentar grandes cifras pelo sistema bancário. Quem quiser uma alternativa anônima e menos regulada precisará carregar malas cheias de dinheiro, comprar obras de arte ou viajar com joias, por exemplo.

Do ponto de vista do criminoso, são opções muito mais arriscadas do que levar um pen drive ou enviar a chave de segurança de uma corretora que opera em outro país.

"O envio pelo sistema bancário tem controle maior do que uma transação via ativo digital. A ideia da regulação é fechar esse buraco e criar um sistema de controle compatível", diz Bottini.

Não surpreende que hackers, por exemplo, costumem exigir pagamentos em bitcoins ou outras moedas digitais para prestar serviços criminosos. De forma mais ampla, um relatório do instituto Chainanalysis indicou que, em 2019, quase US$ 2 bilhões com possível origem ilegal foram movimentados em bitcoins.

Como contrapartida, o Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional) recomenda que as corretoras de criptoativos conheçam seus clientes e comuniquem o Coaf sobre qualquer ato suspeito de lavagem de dinheiro, como os bancos já fazem.

Outro ponto importante pendente de regulamentação é a segregação patrimonial –dispositivo jurídico que impediria corretoras de usarem recursos dos investidores para suas próprias operações.

Foi a ausência desse mecanismo que levou Gisele Bündchen e Tom Brady a perder R$ 232 milhões com o colapso da FTX, uma plataforma de compra e venda de criptomoedas.

Criptoativos e Lavagem de Dinheiro - Um panorama nacional e internacional

  • Quando Lançamento no dia 17/8, às 18h
  • Onde Faculdade de Direito da USP
  • Preço R$ 99
  • Autoria Pierpaolo Cruz Bottini, Felipe Longobardi Campana e Marina Brecht (org.)
  • Editora Quartier Latin
  • Págs. 224
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