Projeções de inflação encostam no teto da meta e diminuem risco de estouro pelo 3º ano seguido

Expectativas de BC, governo e mercado estão convergindo em direção ao limite superior do alvo (4,75%)

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Brasília

O risco de estouro da meta de inflação vem recuando desde o início do ano, quando era dado como quase certo que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) ficaria acima do limite a ser perseguido pelo Banco Central em 2023 pela terceira vez consecutiva.

A melhora da percepção do cenário à frente tem levado as projeções do BC, do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do mercado financeiro convergirem em direção ao teto do alvo deste ano, de 4,75%.

O centro da meta de inflação fixada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) para 2023 é de 3,25% —com 1,5 ponto percentual de intervalo de tolerância para cima e para baixo.

Feira livre em Perdizes, em São Paulo - Danilo Verpa - 9.ago.2022/Folhapress

Segundo o boletim Focus divulgado pelo BC nesta segunda-feira (14), as expectativas dos analistas para a inflação estão hoje em 4,84% no acumulado até dezembro. No início de maio, em meio às críticas do governo Lula (PT) ao alto patamar de juros e às incertezas relacionadas à meta de inflação e à política fiscal, a mediana das previsões se encontrava acima de 6%.

Em julho, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) –índice oficial de inflação do país– passou a acumular alta de 3,99% em 12 meses, após elevação de 0,12% no mês. Mas a trajetória da inflação ainda passará por altos e baixos até o fim do ano.

Embora o número de julho tenha vindo acima das projeções de boa parte dos analistas do mercado financeiro, o resultado "não deixa de ser razoável" na visão do economista Heron do Carmo, professor da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária, da Universidade de São Paulo).

O especialista ressalta que o último dado disponível mostra que os preços do setor de serviços –principal ponto de alerta do BC por ter um comportamento mais resiliente– vêm desacelerando com o reequilíbrio entre oferta e demanda após os choques da pandemia.

No mês passado, houve queda no ritmo de alta nos preços dos serviços com características turísticas, como passagens aéreas. Alimentação e energia elétrica ajudaram também a conter uma elevação maior do índice.

Carmo, que antes temia um possível impacto de fortes geadas na produtividade do setor agrícola, vê agora riscos menores. Por ora, o El Niño, fenômeno climático conhecido por afetar a distribuição de chuvas no território, não o preocupa tanto. Segundo ele, os efeitos poderão ser sentidos sobretudo no ano que vem, quando será preciso ficar mais atento.

Como as deflações registradas no segundo semestre do ano passado, puxadas pela redução artificial de tributos sobre combustíveis no período eleitoral, sairão da base de cálculo do IPCA no acumulado até dezembro, o economista projeta que a inflação chegue a um número próximo de 5,3% em setembro para depois recuar até o fim do ano.

"A situação está com possibilidade de controle, se não houver derrapagem na política fiscal ou algum problema internacional que tenha impacto significativo sobre insumos, como combustíveis, é mais provável que a inflação fique dentro do intervalo da meta neste ano", disse.

Apesar de ver a evolução do preço internacional do petróleo como um risco potencial para a inflação em 2023, ele pondera que a Petrobras poderá administrar eventuais efeitos, diluindo os impactos no tempo, com sua nova política de preços de combustíveis em vigor.

"[Atingir a meta] será até um prêmio ao BC pelo esforço de manutenção da política monetária e ele não precisará escrever aquela cartinha para justificar a inflação fora da meta", acrescentou.

Quando a inflação anual fica fora do intervalo de tolerância, como ocorreu em 2021 e 2022, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, precisa escrever uma carta endereçada ao ministro da Fazenda explicando as razões para o descumprimento do objetivo.

No relatório trimestral de inflação, divulgado em junho, o BC reduziu a probabilidade de a inflação ficar acima do limite superior em 2023 para 61%, ante 83% no relatório divulgado em março. O cenário considerava que a inflação terminaria o ano em 5%, depois de avançar gradualmente até atingir 5,38% em setembro.

"O cenário de referência até setembro contempla variações baixas nos preços de alimentos, em linha com a sazonalidade favorável e com a evolução benigna dos preços de produtos agropecuários no atacado", disse o BC no documento.

"Entre os administrados, os preços da gasolina deverão ser pressionados por mais uma etapa da reoneração dos impostos federais no início de julho. Essa elevação tende a ser compensada parcialmente pela dissipação das altas observadas no trimestre anterior nos preços de produtos farmacêuticos, jogos de azar e tarifas de água e esgoto", continuou.

A projeção da autoridade monetária, entretanto, foi revisada para baixo na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), em 2 de agosto, para 4,9%.

No encontro, o colegiado do BC argumentou que a melhora parcial das expectativas do mercado financeiro contribuiu para a redução de suas projeções de referência. No entanto, ponderou que variáveis que afetam a estimativa do hiato do produto [grau de ociosidade da economia] compensaram esse movimento, fazendo com que o recuo fosse pequeno.

Na última sexta-feira (11), Campos Neto recebeu o último dado divulgado pelo IBGE de maneira positiva, dizendo ver a inflação voltando para a meta.

"A gente se preocupa um pouco com essa inflação de serviços principalmente. O núcleo está bem acima da meta, 6,5%. O número de hoje nessa parte de serviços foi até um pouquinho melhor", afirmou em evento em Curitiba.

O governo Lula também passou a ver como "plausível" pressupor que a inflação ficará dentro do intervalo do alvo ainda este ano depois que sua projeção passou a se situar em patamar próximo ao limite superior da banda, em 4,85%. Em maio, a expectativa era de 5,58%.

Segundo boletim divulgado em julho pela SPE (Secretaria de Política Econômica) do Ministério da Fazenda, o recuo passa pelas surpresas positivas com o IPCA de abril e maio, o reajuste para planos de saúde levemente inferior ao projetado, a redução nos preços da gasolina, diesel e gás de botijão nas refinarias, além de revisões nas tarifas de energia elétrica residencial e ônibus urbano.

Há expectativa da equipe econômica de que a desaceleração na inflação de bens industriais e de alimentação no domicílio continue nos próximos meses, refletindo, entre outros fatores, os efeitos defasados da apreciação do real frente ao dólar.

Também é esperado que prossiga o processo de desaceleração da inflação de serviços, mas em ritmo mais lento a partir de agosto.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, ressalta que tanto o índice cheio de inflação quanto os núcleos –parâmetro que tira os itens mais voláteis– mostram tendência de queda à frente.

"[Houve] aumento expressivo das chances de o IPCA terminar esse ano dentro do limite superior da banda superior da meta de inflação. Essa perspectiva não estava no horizonte até alguns meses atrás", disse ele na apresentação do relatório.

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